Ciclo Olavo Bilac
Desenvolver a noção desse juiz interior, que é assinalado não só pela credibilidade,
pela racionalidade e pela consistência, mas também pela seriedade e pela sinceridade: esse é o primeiro ponto. Você vai tentar exercer a filosofia tão sinceramente quanto Sócrates o fez. Sinceridade significa, no caso, simplesmente presença da sua consciência, ou seja, você não vai dizer coisas que saiam da periferia do seu ser, que no dia seguinte você vai esquecer, ou que você mesmo não vai levar a sério, porque se não nosso estudo vai virar apenas uma imitação da filosofia acadêmica contemporânea.
Quando não temos consciência das origens históricas dos nossos hábitos e julgamentos cotidianos, tornamo-nos escravos da sociedade presente, dando valor de coisa eterna, absoluta e imutável ao que é temporal, relativo e transitório. A principal finalidade da educação superior é libertar o ser humano dessa prisão, ensinando-o a pensar, julgar e sentir na escala da humanidade, primeiro, e na da eternidade, por fim.
Descobrir a substância experiencial (não 'experimental') dos conceitos filosóficos é praticamente tudo. Isso é o próprio método filosófico. E é um esforço imenso, não só de ordem intelectual como também de ordem moral e psicológica. Muitas vezes será preciso buscar as raízes dos conceitos filosóficos em experiências internas que você teve vinte ou trinta anos antes: é todo um trabalho anamnético, de autoconhecimento e autoanálise, e o que estraga a filosofia são justamente as pessoas que não sabem fazer isso. Porque quem não sabe fazer isso usa os conceitos filosóficos como fetiches, como se fossem coisas em si mesmas, entrando num verbalismo desenfreado onde elas nunca sabem do que estão falando e jamais admitem ser cobradas neste sentido.
Ora, a maior parte das pessoas que exerce qualquer profissão científica ou técnica a
exerce exatamente assim: nunca pararam para pensar o que é aquilo, por que aquilo é do jeito que é e se realmente a coisa é do jeito que dizem que é. Isso é o contrário da atitude filosófica. A atitude filosófica é a seriedade no conhecimento. Também não é 'análise crítica', ficar questionando e contestando tudo: isso é outra frescura, e aqui nós não podemos nos permitir frescuras, caprichos ou leviandades. Estamos aqui para fazer um negócio sério, porque é a nossa vida mesma que está em jogo.
A filosofia é uma meditação, uma análise crítica sobre o conjunto dos seus conhecimentos e de sua experiência, inclusive a religiosa. Nesse sentido, a filosofia se torna obrigatória para qualquer pessoa capaz de exercê-la. Se você consegue se colocar problemas de nível filosófico, então você tem a obrigação de desenvolver uma capacidade filosófica para poder raciocinar responsavelmente sobre os assuntos que lhe interessam. Não se trata de, como dizem, 'aprender a pensar'. A filosofia não é 'aprender a pensar', de maneira alguma. Todo mundo sabe pensar: é uma coisa espontânea, até um macaco ou um gato sabem pensar. [...] O objetivo de todo pensamento, como já demonstrou Aristóteles nos Tópicos, é provocar a intuição. O que é intuição? É conhecimento direto, percepção direta. Aristóteles diz que, na dialética, o confronto de várias idéias e hipóteses cria uma espécie de massa crítica, até que chega uma hora que, por intuição, você percebe as coisas como elas são. Este é o objetivo: aprender a saber, não a pensar.
Uma experiência expressada inadequadamente produzirá um milhão de opiniões erradas, porque se você vive uma experiência, mas a nomeia erroneamente, acontece um pequeno problema: nós não podemos pensar sobre coisas, mas apenas sobre idéias. Não podemos pensar a experiência diretamente: primeiro nós temos de convertê-la em uma expressão verbal — um conceito —, e então nós pensamos sobre o conceito. Na memória, por outro lado, é a experiência verdadeira
que você conserva, de modo que você tem, de um lado, a experiência tal como você a teve e, do outro, o conceito inadequado tal como você o formulou. Ao raciocinar sobre esse conceito, em pouco tempo você acaba apagando a experiência, e aí as suas conclusões já não valem absolutamente nada.
Hoje em dia as pessoas dizem: 'Eu tenho a minha idéia, mas eu respeito a sua'. Mas ora, se eu tenho a minha idéia é precisamente porque eu não respeito a sua. Se eu não acho que a minha idéia é melhor que a sua, por que eu digo então que esta é a minha idéia? Ter uma idéia é achar que ela é melhor que a do outro. Como é possível eu ter uma idéia se eu acho que ela vale tanto quanto a idéia contrária? Se eu acho que duas idéias valem a mesma coisa, ou é porque eu não acredito em nenhuma delas, ou é porque eu estou em dúvida. Isso significa que todo sujeito que diz que tem as suas idéias mas que respeita as idéias contrárias dos outros é um hipócrita. Sinceridade seria dizer que você respeita o direito que os outros têm de dizer a besteira que quiserem, mas que você acha que quem está certo é você e que os outros estão errados.
"Não tenho a menor dúvida de que, quando passar a atual fase de degradação intelectual e moral do país e for possível pensar numa reconstrução, essa obra, mais que qualquer outra, deve tornar-se o alicerce de uma nova cultura brasileira. A obra, em si, não precisa disso: ela sobreviverá muito bem quando a mera recordação da existência de algo chamado 'Brasil' tiver desaparecido. O que está em jogo não é o futuro de Mário Ferreira dos Santos: é o futuro de um país que a ele não deu nada, nem mesmo um reconhecimento da boca para fora, mas ao qual ele pode dar uma nova vida no espírito."
"Como é que se começa uma educação? É lendo toda a literatura imaginativa que você possa. Porque a percepção humana, geralmente, é muito acertada e dificilmente erra. Mas, quando você passa para a esfera da imaginação e memória, já não funciona tão bem quanto a percepção. E quando você pula um grau a mais, para o pensamento conceitual, a possibilidade de erro é enorme. Quanto mais você investir nos andares mais baixos, mais estará reduzindo a possibilidade de erro, ainda que ao preço de muitas vezes perceber coisas que não consegue verbalizar. […] Lembre-se de Leibniz, que dizia que o sujeito que tivesse visto mais figurinhas seria a pessoa mais inteligente, porque teria a imaginação mais vasta."
A renda básica moralmente está certa. Mas não adianta se não se especificar quem tem que dar esse dinheiro e de onde tem que sair. Se não é assim: você tem direito a esse dinheiro, mas ninguém tem a obrigação de te dar esse dinheiro.
Se você tem o direito, mas não tem a garantia, na prática, você não tem direito nenhum.
Eu fiquei anos estudando o marxismo-leninismo. Eu estudei mais este assunto do que eles todos. E entendo perfeitamente o coeficiente de verdade que há nisso. Agora, o diálogo pressupõe uma possibilidade de interpenetração das consciências. Eu posso entender o que essa gente está falando. Mas eles podem entender o que eu estou falando? Esse é o problema.
O intelectuais brasileiros de esquerda hoje? Nenhum. Tem um que tentou entender, que se chama Ricardo Musse. Ele leu dois livros meus, se bem que dois livros mais populares, não os mais pretensiosos intelectualmente e tentou entendê-los. Mas, em geral, vejo o pessoal respondendo a coisas que eu não disse nunca, coisas totalmente imaginárias.
TODOS os males do mundo político, sem exceção, vêm de grupos revolucionários iluminados que, a pretexto de resolvê-los, concentram cada vez mais poder nas suas mãos.
“Quando sabemos o que devemos fazer, e como devemos fazer, basta que, para estabelecer isso como um conselho, se mude a forma de expressão e se dê a volta à frase, dizendo, por exemplo, que importa não nos orgulharmos do que devemos à fortuna, à sorte, mas do que devemos a nós mesmos. Dito assim, tem a força de um conselho. Mas, expresso como um elogio, será: ele não se sente orgulhoso do que se deve à fortuna, mas apenas do que deve a si próprio. De sorte que, quando quiseres elogiar, olha para o conselho que se poderá dar, e, quando quiseres dar um conselho, olha para o que se pode elogiar.”
Não tenho NENHUM interesse por doutrinas filosóficas, políticas ou sociais. Só por análises da realidade. Não troco a obra inteira de Jean-Jacques Rousseau por duas páginas de Eric Voegelin.
A expressão 'não merece resposta' é das mais típicas. Autêntica mensagem cifrada, para compreendê-la é preciso decompor analiticamente suas várias camadas de significado em cada exemplo concreto. No caso presente ela significa:
(a) Não tem resposta, porca miséria. É verdade mesmo.
(b) Não podemos deixar sem resposta.
(c) Portanto responderemos que não vamos responder nada, de tal modo que a falta de resposta funcione como prova da nossa superioridade olímpica que não consente em responder a qualquer um.
Os três significados aparecem, mesclados e fundidos, na expressão 'Não merece resposta'. Por meio dela, o sentimento vil de humilhação e derrota ante fatos irrespondíveis se transfigura em jactância triunfalista, a qual, sendo totalmente deslocada da situação real, não poderia mesmo deixar de denunciar involuntariamente sua própria farsa, ao inflar-se em arremedo grotesco da autoridade divina.
O traço mais saliente da miséria cultural de um país é a proliferação endêmica de idéias esquisitas, surgidas de idiossincrasias pessoais ou preconceitos grupais e locais sem nenhuma raiz na História do pensamento, no 'grande diálogo', como o chamava Mortimer Adler.
Está tudo exatamente como há décadas venho anunciando que ia estar, e só me resta o consolo amargo de ter tido razão onde erro teria sido mil vezes preferível. O povo mostrou-se incapaz de controlar seus governantes, os governantes incapazes de controlar seus mais baixos instintos, a elite nominalmente pensante incapaz até mesmo de acompanhar o que está acontecendo, quanto mais de prever o que vai acontecer em seguida. O Brasil está dando um espetáculo de inconsciência, de insensibilidade, de sonsice irresponsável como jamais se viu no mundo. É um país que vive de mentiras autolisonjeiras enquanto naufraga em caos, sangue, dívidas e abominações de toda sorte.
A ÚNICA finalidade das universidades é preparar os alunos para ser autodidatas, para que possam dirigir os seus estudos sem precisar mais do guiamento de um professor de carne e osso. Se um sujeito já provou que pode, e se acadêmicos de vários países concordam que ele já o fez e fez muito bem, cobrar dele a passagem por uma universidade é como exigir que um galo volte ao ovo e se torne pinto.
Não vejo por que a pergunta pela identidade nacional deva se concentrar na busca de 'constantes'. Uma identidade nacional, como uma consciência pessoal, é sobretudo uma história, uma narrativa cujo sujeito não vem pronto, mas se forma e se deforma, se acha e se perde, se salva e se dana no curso dela mesma.
***
Nenhuma conclusão frutífera se obterá sobre a questão da 'identidade nacional' sem fazer primeiro uma 'história da consciência nacional', mapeando, na vasta bibliografia disponível, o horizonte de consciência dos nossos intelectuais e suas mutações ao longo das várias gerações. Tenho a visão clara do que pode ser essa história, mas jamais terei o tempo de escrevê-la, embora alguns artigos meus sejam capítulos inteiros dela. Uma coisa eu garanto: esse horizonte de consciência jamais foi tão estreito quanto é hoje.
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