Carolina Maria de Jesus

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Carolina Maria de Jesus (1914-1977) foi uma escritora, compositora e poetisa brasileira, considerada uma importante percursora entre as autoras negras do país. Periférica, viveu parte da sua vida na favela do Canindé, em São Paulo, período durante o qual escreveu seus diários, publicados na obra "Quarto de Despejo" (1960).

Quando eu era menina o meu sonho era ser homem para defender o Brasil, porque eu lia a história do Brasil e ficava sabendo que existia guerra, só lia os nomes masculinos como defensores da pátria então eu dizia para minha mãe:
– Porque a senhora não faz eu virar homem?
Ela dizia:
– Se você passar por debaixo do arco-íris você vira homem.
Quando o arco-íris surgia eu ia correndo na sua direção mas o arco-íris estava sempre distanciando. Igual os políticos distante de povo. Eu cansava e sentava, depois começa a chorar. Mas o povo não deve cansar, não deve chorar, deve lutar para melhorar o Brasil para nossos filhos não sofrer o que estamos sofrendo. Eu voltava e dizia para minha mãe:
– O arco-íris foge de mim.

Eu cato papel, mas não gosto. Então eu penso: Faz de conta que eu estou sonhando.

Temos só um jeito de nascer e muitos de morrer.

Tem pessoas que, aos sábados, vão dançar. Eu não danço. Acho bobagem ficar rodando pra aqui, pra ali. Eu já rodo tanto para arranjar dinheiro para comer.

A vida para uns são cheias de curvas que dá impressão que eles seguem para o calvário conduzindo uma cruz que se chama "custo de vida".

Já estava cansada de viver às margens da vida.

Eu escrevia peças e apresentava aos diretores de circos. Eles respondiam-me: – É pena você ser preta.

Fiz café para o João e o José Carlos, que hoje completa 10 anos. Eu apenas posso dar-lhes os parabéns, porque hoje nem sei se vamos comer.

Minha mãe dizia que as exigências na vida nos obrigam a não escolher os polos. Quem nasce no polo norte, se puder viver melhor no polo sul, então deve viajar para os locais onde a vida seja mais amena.

⁠A noite está tepida. O céu já está salpicado de estrelas. Eu que sou exotica gostaria de recortar um pedaço do céu para fazer um vestido.

⁠A vida é igual um livro. Só depois de ter lido é que sabemos o que encerra.

Carolina Maria de Jesus
Quarto de despejo. São Paulo: Ática, 2014.

⁠O Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que já passou fome. A fome também é professora. Quem passa fome aprende a pensar no próximo, e nas crianças.

Carolina Maria de Jesus
Quarto de despejo: diário de uma favelada. São Paulo: Ática, 2014.

⁠CAROLINA MARIA DE JESUS

Minha vó foi escravizada
Nasci com 7 irmão
E como fica alimentação?
Eu não tinha, não
Nasci, no meio da minha mãe sem nenhuma alfabetização
Mesmo assim escrevi
Aquela minha tal situação
Miséria, e o que vive
Bruxa, foi o que eu ouvir
Sem nenhuma explicação
Sei ler, e escrever
Então bruxa eu virei?
Mas não tem nada a ver,
Minha mãe é preta, e foi acusada
Nem preciso falar que quase foi condenada.
E claro que minha vida não acabou por aí, pois na favela vive
É esse não é meu fim, meu nome você vai ouvir por aí
Porque livros escrevi
E você vai lembrar de mim.

Inserida por HenryKeys

⁠Carolina Maria de Jesus

Sobrevivente heroína
da dura existência
da vida na favela,
Alma infinita e bela,
Quando a prenderam
e concluíram que lia
para fazer feitiçaria,
Não sabiam que ela
a própria magia da poesia.

Inserida por anna_flavia_schmitt

⁠Neste quarto de despejo é horrível de se morar
Coisas absurdas acontecem neste lugar
5h da manhã tenho que acordar
Para meus filhos alimentar.

Saio para dinheiro arrumar
E quando pelas ruas tenho que passar
Pessoas fecham as janelas e saem do lugar
Acham que isso vai me magoar?
Que nada! Faço é gostar
Pois, não preciso parar e as pessoas "cumprimentar".

Da onde que já se viu?
Um homem de 48 anos desafiar uma criança para brigar
Além de quando um favelado falece
Malandros tentam lhe enganar
Dizendo que o dinheiro é para o falecido sepultar
Que nada, eles usam a esmola para se embriagar.

Me denigrem por ser preta
Porém...
Adoro minha força, meu suor
Adoro minha cor, é quem eu sou.

Quem disse que sou inferior?
Bebo que nem vocês brancos
Adoeço que nem vocês brancos
Sinto fome que nem vocês brancos.

Pena de ser negra?
Pena tenho dessa sociedade!
Que só liga para notoriedade
Que esquecem o que é racional
E ainda pratica o darwinismo social.

Me julgam por ser favelada
Mas também não me ajudam a não ser
Com um governo corrupto
E uma inflação abrupta
Que não me deixa escolher
Entre ser ou não ser.

Corro por bicos, me mato por alimento
Vivo por sobrevivência, com resiliência
E, ainda sim, roubam-me com anuência
E com bastante frequência.

E incrível como as pessoas reclamam do que faço, e até do que não faço
Dizem-me que quero ser muita coisa
Porque não bebo pinga
Mando mentalmente
Eles irem cuidar de suas vidas

Sou sozinha, tenho 3 filhos
Tenho que educá-los
E ser exemplo
Para se tornarem alguém que contemplo.

Prefiro um livro do que álcool
Prefiro o conhecimento, do que o mundão
Sou assertiva e agnitiva
E tenho um bom coração.

De cabeça erguida
Seguiu sua vida
Venceu a escuridão
Com pé no chão
Atualmente aplaudida
E muito bem reconhecida
Por isso digo:
"Muito bem, Carolina!"

Inserida por derllanya3

A amizade do analfabeto é sincera. E o ódio também.

Quem inventou a fome são os que comem.

Que efeito surpreendente faz a comida no nosso organismo! Eu que antes de comer via o céu, as árvores, as aves, tudo amarelo, depois que comi, tudo normalizou-se aos meus olhos.

A comida no estômago é como o combustível nas máquinas. Passei a trabalhar mais depressa. O meu corpo deixou de pesar. Comecei a andar mais depressa. Eu tinha a impressão que eu deslizava no espaço. Comecei a sorrir como se estivesse presenciando um lindo espetáculo. E haverá espetáculo mais lindo do que ter o que comer? Parece que eu estava comendo pela primeira vez na minha vida.

O negro só é livre quando morre.