Victor Hugo
Não temais a derrota de hoje. Concentrai vossos corações e vossas mãos num único alvo: a vitória final!
Se no momento em que fôsse esmagar uma formiga, ela unisse suas duas miseráveis patinhas numa prece a mim dirigida, eu me mostraria bondoso com ela. Por que então não há de Deus mostrar-se bondoso comigo?... Suplico-lhe que vos dê a vida eterna... a vós...a mim...a todos.
Quasímodo sentia mover-se dentro de si uma alma feita à sua imagem. Essa desgraça em que vivia tornou-o mau. Era mau porque era selvagem, era selvagem porque era feio. Mas não nasceu malvado. Desde muito cedo sentira, por parte dos homens, o escárnio, o espezinhamento e a rejeição. Só encontrou ódio ao seu redor.
Visto que só a catedral lhe bastava, voltava o rosto para os homens que o desprezavam. Aquelas figuras de santos, bispos, reis e mesmo as esculturas de monstros não o assustavam. Era com elas, estátuas mudas, que Quasímodo se expandia e ficava horas a conversar.
Essas injúrias passavam despercebidas tanto pelo padre como pelo corcunda. Quasímodo era surdo demais e Cláudio pensador demais.
A noite veio. Ela achou-a tão bela, o luar tão doce, que fez um giro pela galeria que circundava a igreja. Sentiu com isso um grande alívio porque a terra lhe pareceu calma, vista lá de cima da catedral.
É que o amor é como árvore. Rebenta por si próprio, penetra profundamente em todo o nosso ser e continua muitas vezes, a verdejar sobre um coração em ruínas.
A catedral era tão familiar ao corcunda que este se encontrava em todas as partes. Em tudo se via o homem que amava. Ele era a alma do monumento.
Existia entre os personagens grotescos esculpidos na parede um de quem Quasímodo gostava mais e com quem às vezes conversava. Uma ocasião a cigana ouviu-o a dizer: - Oh! Porque não sou de pedra como você!
De tudo o que a catedral possuía, o que mais o tornava feliz eram os sinos. Acariciava-os, amava-os, falava-lhes e compreendia-os. Tinha ternura por todos eles, embora tivessem tirado sua audição.
Quando o viram semear dinheiro, disseram: "É um comerciante; Quando o viram ganhar dinheiro, disseram: "É um ambicioso"; Quando o viram recusar honrarias, disseram: "É um aventureiro"; Quando o viram recusar a sociedade, disseram: "É um bruto".