Kafka

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Somente tremor e palpitação foram sua resposta à afirmação de que talvez “possuísse”, mas não “era”.

Não se deve negar a ninguém o que lhe cabe, nem ao mundo sua vitória.

"Não posso levar o mundo nos ombros se mal suporto o peso do meu casaco de inverno."

(Esta frase pertence a uma carta que Kafka escreveu a Milena no fim da vida, expressando o desejo de recuperar seu passado judeu. Ele justificava assim sua incapacidade de levar a cabo um projeto que nunca concluiu.)

Nossa salvação é a morte, mas não esta.

Pode haver um conhecimento acerca do demoníaco, mas nenhuma fé nisso, pois não há nada mais demoníaco do que o que existe aqui.

Fomos expulsos do Paraíso, mas o Paraíso não foi destruído

Aquele que renuncia ao mundo também renuncia ao mundo dos homens.

O livro deve ser o machado que rompe o nosso mar congelado.

O verdadeiro inimigo lhe transmite uma coragem sem limites.

Uma gaiola foi em busca de um pássaro.
Uma gaiola está sempre à espera de um pássaro.

O conhecimento nós já temos. Mas qualquer um que o procure é suspeito de estar contra ele.

Encontramo-nos na situação dos viajantes de um trem que pára, por causa de um acidente e, no ponto em que a luz do início do túnel já não pode ser vista e a luz do fim do túnel é tão pequena e fraca que o olhar deve buscá-la continuamente, perdendo-a vez ou outra, até que chega um momento em que a luz do início e a do fim se convertem em algo incerto.

A mediação da serpente foi necessária: o mal pode seduzir o homem, mas não pode se transformar em homem.

O medo da união, do fluir para a outra parte.

Não deixam de ter razão os movimentos espirituais revolucionários que questionam a relevância do anterior, já que, de fato, ainda não aconteceu nada.

Certas pessoas são cheias de si porque se julgam virtuosas. No entanto, por serem aparentemente mais difíceis de abordar, as tentações que sofrem vêm sempre de fontes até então ignoradas por elas. A verdade, no entanto, é que um demônio mais poderoso conseguiu apossar-se delas quando os demônios menores que carregavam consigo correram a prostrar-se diante do mais forte.

O que é a riqueza? Para um, uma velha camisa já é a riqueza. Outra é pobre com dez milhões. A riqueza é uma coisa relativa e pouco satisfatória. No fundo não passa de uma situação particular. Ser rico significa depender de coisas que se possui e que se é obrigado a proteger da destruição, acumulando as posses e as novas dependências. A riqueza não passa da materialização da insegurança

Ai de mim!” exclamou o camundongo, “o mundo está ficando cada vez menor. De início era tão grande, que eu me apavorava. Vivia correndo para cá e para lá, e só me tranquilizava quando via, por fim, paredes bem distantes à esquerda e à direita. Mas o espaço entre essas paredes estreitou-se tão rapidamente que já me encontro na última câmara, e vejo ali no canto a ratoeira onde de certo esbarrarei.”
“Ora, basta-lhe escolher outro caminho”, disse o gato antes de engoli-lo.
( Contos, fábulas e aforismos )

Não se pode dizer que nos falte fé. O simples fato de viver constitui uma fonte de fé inesgotável.

A história dos homens é um instante entre dois passos de um caminhante.

Quando tudo parece terminado, surgem novas forças. Isto significa que você está vivo.

Os lugares onde se esconder são numerosos, mas só há uma saída, embora as possibilidades de escapar outra vez sejam tantas quantos os lugares onde se esconder.

O momento decisivo na evolução humana é algo perpétuo.

ÀS VEZES, O DESTINO É COMO uma tempestade de areia que o faz mudar de direção. Você pode tomar outro caminho, mas o fenômeno o atrapalha. Você volta a mudar de rumo, mas a intempérie o desvia novamente. Ela brinca por cima de você como uma agourenta dança com a morte pouco antes da aurora. Por quê? Porque a tempestade não é algo que sopra longe, algo que não tem nada a ver com você. Essa tempestade é você. É algo dentro de você. Assim, tudo o que se pode fazer é render-se a ela, andar a passos firmes em meio a ela, fechando os olhos e protegendo os ouvidos, e caminhar através dela, um passo de cada vez. Dentro da tempestade não brilha o sol nem a lua, não há direção nem sensação de tempo. Só há a fina e branca areia fazendo redemoinhos para o céu como ossos pulverizados. [...]

E, uma vez amainada a tempestade, você não se lembrará de como se livrou dela, de como conseguiu sobreviver. Na verdade, não terá certeza de que a tempestade realmente cessou. Mas uma coisa é certa: quando sair da tempestade, você já não será mais o mesmo que caminhou por dentro dela. Essa é a essência da tempestade.

"Estava sempre disposto a aceitar os acontecimentos com toda a calma, a admitir o pior apenas quando este surgia, a não se preocupar com o amanhã, mesmo quando as perspectivas fossem assustadoras. Mas ocorreu-lhe que esta não seria a melhor política a seguir"