José Saramago

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É desta massa que nós somos feitos: metade de indiferença, outra metade de maldade.

Nunca se pode saber de antemão de que são capazes as pessoas, é preciso esperar, dar tempo ao tempo, o tempo é que manda, o tempo é o parceiro que está a jogar do outro lado da mesa e tem na mão todas as cartas do baralho, a nós compete-nos inventar os encartes com a vida...

- Responsabilidade de quê?
- A responsabilidade de ter olhos quando os outros perderam.

Fizemos dos olhos uma espécie de espelhos virados para dentro, com o resultado, muitas vezes, de mostrarem eles sem reserva o que estávamos tratando de negar com a boca.

Ainda está por nascer o primeiro ser humano desprovido daquela segunda pele a que chamamos de egoísmo, bem mais dura que a outra, que por qualquer coisa sangra.

Se não disseres nada compreenderei melhor [...], há ocasiões em que as palavras não servem de nada.

O difícil não é viver com as pessoas, o difícil é compreendê-las.

Se eu estiver a ser sincero hoje, que importa que tenha de arrepender-me amanhã?

...é certo, se isso lhe serve de consolação, que se antes de cada acto nosso nos puséssemos a prever todas as consequências dele, a pensar nelas a sério, primeiro as imediatas, depois as prováveis, depois as possíveis, depois as imagináveis, não chegaríamos sequer a mover-nos de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar. Os bons e os maus resultados dos nossos ditos e obras vão-se distribuindo, supõe-se que de uma forma bastante uniforme e equilibrada, por todos os dias do futuro, incluindo aqueles, infindáveis, em que já cá não estaremos para poder comprová-los, para congratular-nos, ou pedir perdão, aliás, há quem diga que isso é que é a imortalidade que tanto se fala....

O silêncio ainda é o melhor aplauso.

O certo e o errado são apenas modos diferentes de entender nossa relação com os outros.

... mas quando quando a aflição aperta, quando o corpo se nos demanda de dor e angústia, então é que se vê o animalzinho que somos.

...as resposta não vem sempre que são precisas...

A lucidez é um luxo que nem todos se podem permitir.

As palavras proferidas pelo coração não tem língua que as articule, retém-nas um nó na garganta e só nos olhos é que se podem ler.

Aprender com a experiência dos outros é menos penoso do que aprender com a própria.

O costume de cair endurece o corpo, ter chegado ao chão, só por si, já é um alívio.

José Saramago
Ensaio sobre a cegueira. Lisboa: Editorial Caminho. 1995

Não sou pessimista. O mundo é que é péssimo.

Nada é para sempre, dizemos, mas há momentos que parecem ficar suspensos, pairando sobre o fluir inexorável do tempo.

... e serenamente desejou estar cega também, atravessar a pele visível das coisas e passar para o lado de dentro delas, para a sua fulgurante e irremediável cegueira.

José Saramago
Ensaio sobre a cegueira

Pareceu ao médico que ouvia chorar, um som quase inaudível, como só pode ser o de umas lágrimas que vão deslizando lentamente até às comissuras da boca e aí se somem para recomeçarem o ciclo eterno das inexplicáveis dores e alegrias humanas.

José Saramago
Ensaio sobre a cegueira

... acaso os lábios tocariam levemente a pele antes de encontrarem a água, e, sendo a sede muita, sofregamente iriam recolher no côncavo as últimas gotas, acordando assim, quem sabe, uma outra secura.

José Saramago
Ensaio sobre a cegueira

... perdoem-me a preleção moralística, é que vocês não sabem, não o podem saber, o que é ter olhos num mundo de cegos, não sou rainha, não, sou simplesmente a que nasceu para ver o horror, vocês setem-no, eu sinto-o e vejo-o, e agora ponto final na dissertação, vamos comer.

José Saramago
Ensaio sobre a cegueira

Pensar, pensar
Acho que na sociedade actual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de reflexão, que pode não ter um objectivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objectivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, não vamos a parte nenhuma.

O problema não é um Deus que não existe, mas a religião que O proclama!