J. G. de Araújo Jorge

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No fundo , não acredito que nos despedimos.
Apenas nos afastamos um do outro
por algum tempo,
para darmos ao destino a alegria de nos reencontrar.

Em vão tento vingar em outras o amor perdido.
Só consigo ir multiplicando tua falta.

A gente sabe que é amor,quando de repente encontra razões para perdoar o que nunca se perdoou ,quando os mais duros pensamentos são palavras de ternura...
fora da boca
-e a gente sente,sente
mas não pensa...

Que o diga meu coração , que deseja ofender-te e transforma em poesia a minha mágoa imensa.

Eu podia morrer todos os dias que não te vejo.

Depois que te foste
sou como um cais vazio.

Faltam bandeiras , faltam apitos , faltam amarras,
Falta o navio.

Não fomos nós que nos despedimos.
Foi a vida que agora se interpôs,
como ontem nos uniu.

Que fazer? nas suas mãos ja estava escrito o nosso destino.

Livres nos encontramos , e algo acima de nós nos fez um do outro e nos escravizou...

Agora, livres novamente
somos dois pássaros que já não sabem voar fora da gaiola...

Tão grande este amor, entretanto frágil ...
um tênue sopro de vento o derrubou, e
eis-nos infelizes...

tão depressa cresceu, que não teve tempo sequer de criar raízez.

Sempre que te encontro é pra sempre.
Sempre que me afasto é pra nunca.

e já que nunca mais te encontro ...
é pra sempre.

Dou a impressão, como toda gente,
de que estou me dirigindo pra algum lugar

entretanto,
onde quer que eu me encontre,
meu destino é você.

Ah! o sofrimento de que coisas é capaz ...
tu me feriste tanto, e tanto, e tanto,
que agora se voltasses, te admirarias de ver
como o meu coração não te conhece mais.

E porque eu te via até de olhos fechados , meus olhos abertos não percebiam o que fazias de mim...

Se quisesses voltar, não te receberia...
E por estranho que pareça, não te receberia
porque te quero ainda...

Sim, teu amor
era fútil...
- Que importa se me iludia?

Sem ele, entretanto, sou um inútil
cada vez mais,
noite e dia...

Fique eu só, um só momento,
e logo me esgueiro como um assaltante
ou um proibido amante
para encontrar-te no pensamento...

Eu sei bem por que sofro e o que eu almejo,
minto afirmando que não sei porquê,
- falta uma boca para o meu desejo,
falta um corpo que eu quero e que não vejo,
Falta, por que não confessar?... Você!

" Último Pedido "


Vida, que tanto me deste
e que eu, desajeitado ou louco,
por tédio, por orgulho ou por cansaço
quebrei, gastei, perdi...

Bem sei que não tenho direito
a nada esperar de ti,

- entretanto, ouve-me ainda, como se ouvisses
o último pedido de um condenado,
sem te importares se te maldigo:

- arranja-me um outro amor, maior que aquele,
e pior que aquele até, bem pior que aquele!

Seja este o meu castigo!

Tanta coisa me deste, e eu nada te pedi.
(Qual de nós foi mais criança?)
Poderias, pois, levar tudo, como fizeste...
Que direito teria eu para esperar que deixasses
alguma coisa, além da lembrança?

30- SEM CORAÇÃO
Que eu não tenho coração
não és tu, sou eu que digo...
como hei de ter coração
se tu o levas contigo?

A verdade é que eu nada enxergava

até que encontrei teus olhos...

Ah! meu amor se me deixares agora :

ficarei cego...

Por que depois

se lastimar?



É preferível amar

e arrepender-se,



que se arrepender

te não amar.

Bem sei que estou pagando caro,em sofrimento,

a alegria que colhi.



Mas valeu.



Felizes os que ainda tem a lembrança do sol

quando chega a invernia.



E porque o conheceram,

e o sabem além das nuvens,

ainda sonham e esperam por um novo dia.

Ás vezes ,quando me encontro no espelho,

é que vejo em meus olhos tua ausência,

e percebo o quanto a tua falta

me faz mal...


Lembras-te? não nos contentávamos em nos saber juntos.


Queríamos que alguém comprovasse

e como que nos convencesse

de que era tudo real.

E o espelho era a nossa única testemunha

afinal.

Capricho da memória:
de tantos momentos em que te vejo
e em que no meu pensamento
tua imagem se insinua,

havia de fixar-te, naquele íntimo instante
em que mais te desejo:
inteiramente nua!

A qualquer de nós é dado
ser baiano, bem ou mal,
pois a Bahia é um estado
de espírito, nacional !

Só por milagre eu poria
numa quadrinha somente
a beleza da Bahia
sua terra e sua gente.

Tem tal encanto a Bahia,
tais magias ela tem,
que quem a conhece um dia
fica baiano também.

Bahia de hoje, como ontem,
santeira e crente até o fim:
- do Senhor dos Navegantes
do Senhor do Bonfim.

Bahia dos tabuleiros
das baianas, das babás,
das velhas Sés, dos mosteiros,
dos telhados coloniais.

Bahia de mil petiscos:
caruru e mungunzá,
caju, cachaça, mariscos,
acarajé, vatapá.

Dos quitutes e quindins,
das festas e foguetões,
dos santos e querubins
levados nas procissões.

Bahia sempre gostosa,
mais doce que velho vinho,
que ainda resiste, famosa,
no Largo do Pelourinho.

Bahia de D. João
do Visconde de Cairu:
- moleques de pé no chão
escravos de peito nu.
Do Brasil engatinhando,
subindo pelas ladeiras,
dos sobradões modorrando
sobre a algazarra das feiras.

Das cadeiras de arruar,
das carruagens, dos nobres,
dos ouros em cada altar,
das pratarias, dos cobres.

Bahia da liberdade,
de Castro Alves, seu condor,
onde a palavra saudade
é negra! - tem outra cor!

Bahia da inteligência,
de suas glórias ciosa:
da cultura, da eloqüência,
Bahia de Ruy Barbosa.

Bahia da independência,
contra a opressão e o esbulho,
da revolta da violência,
Bahia do 2 de julho !

Com o leite branco das pretas
tornaste a pátria viril,
e hoje flui das tuas tetas
o "ouro negro" do Brasil.

Bahia, velha Bahia...
Bahia nova também:
patrimônio de poesia
que a pátria guarda tão bem.

Bahia dos meus amores,
de trovadores aos mil,
de violeiros, cantadores:
"romanceiro" do Brasil!

A trova ja nasce feita,
e rima até com poesia
se a Bahia é a Musa eleita,
se a inspiração é a Bahia!



Bahia dos doces ventos
que sopram velas no mar,
dos coqueirais sonolentos
de curvas palmas pelo ar

Qualquer coisa da Bahia
todo brasileiro tem,
se até o Brasil, certo dia,
nasceu baiano também!

"A Bahia é a boa terra",
repito nos versos meus.
e a voz do povo não erra
- sua voz é a voz de Deus!

Ladeiras, praias, coqueiros,
igrejas, lendas, poesia,
- Cais do Mercado: saveiros . . .
- Natal da Pátria: Bahia!