Fabrício Hundou

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AFRICALGIA

eu tinha na carteira os cinquenta centavos que ela me pediu
e eu não dei
menti espontaneamente
disse "não"
nem costumo guardar moeda na carteira
um "não" congênito - este, como se estivesse ali sempre guardado
porra! logo aqueles cinquenta centavos eu neguei à nega
preta como eu
não somos do mesmo Ilê
panafricanismo que eu forço a fórceps(?)
esse tanto de "não" que muito me disseram
seria agora a fartura pra eu distribuir entre os meus
white face xô de mim
y mesmo assim ela começou a dançar pagodão baiano
um swing que jorrava na rua
e ela dançava mesmo sem minha moeda
que não vale a arte
a liberdade
nem vai pagar
meu
poema perdido
(ou perdão)

Inserida por FabricioHundou

CANDIEIRO

entra espada
sai espada
corta o pão
cortando a raiva
sopra sopra
abra abra abra
abra abra os caminhos

mastigue pra viver
mastigue pra viver

tua luz-contorno
vagalume
candieiro
nenhum nenhum dinheiro
paga o custo do teu amar

tua luz-contorno
vagalume
candieiro
nenhum nenhum dinheiro
paga o custo do teu amar

cheiro tua alfazema
butique de todo o mar

bem faz falta
mais um tanto de desejo
cuide das tuas asas
pássaro d'água:
nome de
plexo
solar

Inserida por FabricioHundou

VOA QUEM PODE CA(IR)

apesar das razões do teu ímpio
tenha fé
nade mais

perdoe o escafandro
respire se gritar
sol deduz teu sorriso
morne a lágrima
faça um chá

cafuné lhe faz tão bem

golpeie o dedo / chupe o sangue
havendo outra dor: enfrente e estanque

a quarar bandeira branca
Òsàlá paz em abundância
vivamos + unidos
voa quem pode
ca(ir)
sambar

⁠EM SI QUEM

porquê descabe à mensuração
quilograma ou légua
equivale à nada comparado
A nada comprado
dado
mangueado
financiado honestamente no cartão de mérito
princípio do movimento
unidade pertencente:
amor
perde-se em si quem não amar o próprio amor
perde-se em si quem não ama o próprio amor
perde-se em si quem não ama o amor
sei
nadar

Inserida por FabricioHundou

⁠se você tem vontade
de escrever sobre o assunto
y quer imagem pra criar um texto
uma crônica
uma poesia

(seja lá qual for o gênero literário)

você pode
contar um pouco da sua vontade
dá uma moral
parado no tempo
até as coisas voltarem
quando puder

(sei lá)
(não sei)

seria a forma mais simples
fazer alguma busca
cotidiano...fotos na janela
quando sou pego de surpresa

fico assim:

aca
nha
do

Inserida por FabricioHundou

⁠AUTO CARINHO

zelam-me como quem
não sabe tocar violão
fazer feijão ou assobiar
usando quatro dedos à boca
em suprassumos de cuidado
tranquilizam-se porquê
observam que observo
os tapetes enrugados / desemborco chinelos /
enxugo panelas / selo bem as tampas
se tenho desleixo
então, tenho desleixos inofensivos
mágoas hibernadas
graus de competência pra lidar com infinitos
beijam-me porquê antecede à apneia qualquer medo
nunca ensaiam as formas impessoais
pra perguntar aonde vou com essa carapuça servida
acho que eles têm astúcia quando me prometem futuros
pleiteiam em mim a passibilidade da loucura
estrambelham-se com essa minha arrogância y
liberdade
sinto que cresço hígido
em atitudes
de auto carinho

Inserida por FabricioHundou

UÁÁÁÁ

d⁠o dedo "mindinho" do pé
batido no pé do sofá
aquela dor de faltar o ar
aquele choro silencioso que grita 'uáááá'
mesmo assim o ouro tá mais embaixo
as bauxitas, ametistas, bulgaris e gemas de rubi
ainda assim estão mais fundas /
não se esconderam por vontade própria
não nascem nas vesículas e rins por acaso
a ressequidão do tubo orotráqueo
pálpebras dos olhos c/ lodo na água
y
pedras no caminho
pedras presas no sapato
saltos quânticos
andar na vida de
salto
alto

Inserida por FabricioHundou

⁠R(ASPA)

aos primeiros pêlos renascidos
apenas a "oportunidade irrecusável"
de outra poda
repetidamente o tempo provisório
corpo-cronômetro
pubianos, faciais, superficiais
mas não teria a palavra 'depilação'
nenhum teor poético/romântico/filosófico no contexto de renascimento/superação
y é
por isso a importância de trazer a fênix como a metáfora da pulsão vida / morte
por isso o título de "guerreirx" é empurrado aos corpos matáveis
nem erva daninha chora ao ser tirada do próprio dharma-kharma
das proximidades com as dores
quero a diplomacia
aparada
macia

Inserida por FabricioHundou

⁠estremecimentos distais
as unhas se mantêm
é uma fome tolerante à sua vez
cachos de miçangas fazendo o caminho da Guia
o pescoço é guidão em direção
ao triunfo
ao novo

Inserida por FabricioHundou

⁠HÁ PEDAÇO DE MIM

na ilha da grandeza
no terreno da miudeza
onde meu olho acopla há desembarque imediato; meus olhos desrespeitam apenas os velocímetros
em tudo quero fazer breve escola
estudo religiosamente a beleza, poesia
y o tempo

Inserida por FabricioHundou

⁠S A L V E A D O R

o sal em iodo
temper'a carne negra-fosca
pele crioula exala sabor
arde - não mais 1 grito de dor
em dendê, faz cor e coral pro fogo
que flamba o domingo febril
suor descendo em queda pela testa
tempestade em corpos de água c/ Anil
Bahia,
quem foi, volta
em ti: tudo orna
na Baía de Todxs xs Santxs
sob a Pemba tudo se transforma
y nesta cidade (todo mundo é dEla)
sombra de vento é guiança
pupilas de mães/pais
filhxs órfãos são minhas estrelas - ou herança
sotaque é hino nacional
bandeira só de Oxalá
o farol acende o teu riso
salvaguarde minha esperança
O Ilê há de tocar mais uma
vez

Inserida por FabricioHundou

OCOS

sentado equidistante
vi no chão
dois pequenos buracos
furados equivocadamente
podiam ser, hoje, parafusos
fincados - ali estariam

por ora,
ali, apenas buracos

trazem dimensão y lastro
pr'eu ficar instigado
seria 'o Equívoco' uma modalidade estética de errar?
seriam os buracos a representação da espera de alguém que vai se importar?

dois pequenos buracos
que certamente caberiam os tantos parafusos de chave Phillips que saem dos meus cenhos y ouvidos
fossos oculares ocultos:
até o chão pode me olhar

mesmo qu'eu não mais
declame aos buracos
o vazio desses espaços fizeram-me
pular

Inserida por FabricioHundou

C(ASA)

o repique da libélula
tamborilando o cácere
desse teto-imenso-céu
do meu quarto, sala e cozinha
um pé direito alto
um passo de cada vez
as roupas já usadas ontem
se espraiam nas encostas de cuatro cadeiras vazias
y a mesa é a mesma
cheia: orna fartura quando você está

um bule no escorredor
volta sempre pro mesmo lugar esperado
um fogão ainda apagado
um coração sempre tão aceso
eu sou a casa
você a asa

desabrocham as flores de íris
qu'eu pensei serem tulipas
desabrocham as dores de saudade que eu pensei
serem infinitas

pero passa nas distais das'mnhas falanges o brim do jeans que esquecestes em meu balde
meu oceano familiar ao teu tráfego
meu dorso fértil eriçado ao teu beijo-occiptal

dessa rede
fiz teus braços
quis um traço
treco y trapo
não vai ser o mal do
abismo / espaço
que teu amor
vai me
afastar