Versos de Interesse para uma Mulher

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Aceitarás o amor como eu o encaro ?...

Aceitarás o amor como eu o encaro ?...
...Azul bem leve, um nimbo, suavemente
Guarda-te a imagem, como um anteparo
Contra estes móveis de banal presente.

Tudo o que há de melhor e de mais raro
Vive em teu corpo nu de adolescente,
A perna assim jogada e o braço, o claro
Olhar preso no meu, perdidamente.

Não exijas mais nada. Não desejo
Também mais nada, só te olhar, enquanto
A realidade é simples, e isto apenas.

Que grandeza... a evasão total do pejo
Que nasce das imperfeições. O encanto
Que nasce das adorações serenas.

Mário de Andrade
ANDRADE, M. Poesias completas: Volume 2, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2014

PORQUE MENTIAS?

Por que mentias leviana e bela?
Se minha face pálida sentias
Queimada pela febre, e se minha vida
Tu vias desmaiar, por que mentias?

Acordei da ilusão, a sós morrendo
Sinto na mocidade as agonias.
Por tua causa desespero e morro...
Leviana sem dó, por que mentias?

Sabe Deus se te amei! sabem as noites
Essa dor que alentei, que tu nutrias!
Sabe esse pobre coração que treme
Que a esperança perdeu por que mentias!

Vê minha palidez - a febre lenta
Esse fogo das pálpebras sombrias...
Pousa a mão no meu peito! Eu morro! Eu morro!
Leviana sem dó, por que mentias?

Sou mais a palavra ao ponto de entulho.
Amo arrastar algumas no caco de vidro,
envergá-las pro chão, corrompê-las, -
até que padeçam de mim e me sujem de branco.

Manoel de Barros
BARROS, M. Poesia Completa. São Paulo: Leya, 2011.

...Porque a vida é fugaz,
tão veloz, tão passageira.
A gente sofre demais,
por bobagens, por besteira.
Tudo um dia se desfaz
mesmo que queira ou não queira.

Importa é viver em paz
pois quando olhamos pra trás
lá se foi a vida inteira.

Jenário de Fátima

Nota: Poema publicado em Novembro de 2014, na página de Facebook do autor.

NOTA SOCIAL

O poeta chega na estação.
O poeta desembarca.
O poeta toma um auto.
O poeta vai para o hotel.
E enquanto ele faz isso
como qualquer homem da terra,
uma ovação o persegue
feito vaia.
Bandeirolas
abrem alas.
Bandas de música. Foguetes.
Discursos. Povo de chapéu de palha.
Máquinas fotográficas assestadas.
Automóveis imóveis.
Bravos...
O poeta está melancólico.

Numa árvore do passeio público
(melhoramento da atual administração)
árvore gorda, prisioneira
de anúncios coloridos,
árvore banal, árvore que ninguém vê
canta uma cigarra.
Canta uma cigarra que ninguém ouve
um hino que ninguém aplaude.
Canta, no sol danado.

O poeta entra no elevador
o poeta sobe
o poeta fecha-se no quarto.
O poeta está melancólico.

Tomou-me vossa vista soberana
Aonde tinha as armas mais à mão,
Por mostrar que quem busca defensão
Contra esses belos olhos, que se engana.

Por ficar da vitória mais ufana,
Deixou-me armar primeiro da razão;
Cuidei de me salvar, mas foi em vão,
Que contra o Céu não vale defensa humana.

Mas porém, se vos tinha prometido
O vosso alto destino esta vitória,
Ser-vos tudo bem pouco está sabido.

Que posto que estivesse apercebido,
Não levais de vencer-me grande glória;
Maior a levo eu de ser vencido.

Afundo um pouco o rio com meus sapatos.
Desperto um som de raízes com isso
A altura do som é quase azul.

Manoel de Barros
BARROS, M. Poesia Completa. São Paulo: Leya, 2011.

E assim é tudo nela; de contraste em contraste, mudando a cada instante, sua
existência tem a constância da volubilidade. Na vaga flutuação dessa alma, como no
seio da onda, se desenha o mundo que a cerca; a sombra apaga a luz; uma forma
devanece a outra; ela é a imagem de tudo, menos de si própria.

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...

Vinicius de Moraes
Antologia poética

Nota: Trecho de "Soneto do amigo"

...Mais

Não quero ser o último a comer-te

Não quero ser o último a comer-te.
Se em tempo não ousei, agora é tarde.
Nem sopra a flama antiga nem beber-te
aplacaria sede que não arde

em minha boca seca de querer-te,
de desejar-te tanto e sem alarde,
fome que não sofria padecer-te
assim pasto de tantos, e eu covarde

a esperar que limpasses toda a gala
que por teu corpo e alma ainda resvala,
e chegasses, intata, renascida,

para travar comigo a luta extrema
que fizesse de toda a nossa vida
um chamejante, universal poema.

Eterna Presença

Este feliz desejo de abraçar-te,
Pois que tão longe tu de mim estás,
Faz com que te imagine em toda a parte
Visão, trazendo-me ventura e paz.

Vejo-te em sonho, sonho de beijar-te;
Vejo-te sombra, vou correndo atrás;
Vejo-te nua, oh branco lírio de arte,
Corando-me a existência de rapaz...

E com ver-te e sonhar-te, esta lembrança
Geratriz, esta mágica saudade,
Dá-me a ilusão de que chegaste enfim;

Sinto alegrias de quem pede e alcança
E a enganadora força de, em verdade,
Ter-te, longe de mim, juntinho a mim.

Mário de Andrade
ANDRADE, M. Poesias completas: Volume 2, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2014

A castidade com que abria as coxas
e reluzia a sua flora brava
Na mansuetude das ovelhas mochas,
e tão estreita, como se alargava.

Ah, coito, coito, morte de tão vida,
sepultura na grama, sem dizeres
Em minha ardente substância esvaída,
eu não era ninguém e era mil seres
em mim ressuscitados

Era Adão,
primeiro gesto nu ante a primeira
negritude de corpo feminino

Roupa e tempo jaziam pelo chão
E nem restava mais o mundo,
à beira dessa moita orvalhada,
nem destino.

Mas eu, em cuja alma se refletem
As forças todas do universo,
Em cuja reflexão emotiva e sacudida
Minuto a minuto, emoção a emoção,
Coisas antagônicas e absurdas se sucedem —
Eu o foco inútil de todas as realidades,
Eu o fantasma nascido de todas as sensações,
Eu o abstrato, eu o projetado no écran,
Eu a mulher legítima e triste do Conjunto
Eu sofro ser eu através disto tudo como ter sede sem ser de água.

E sou meu próprio frio que me fecho
longe do amor desabitado e líquido,
amor em que me amaram, me feriram
sete vezes por dia em sete dias
de sete vidas de ouro,
amor, fonte de eterno frio

Perdi o bonde e a esperança
Volto pálido para casa

Tem dia que põe virgula, tem dia que põe reticências,
tem dia que põe ponto final e tem dia que
tem a necessidade de virar a página,
o tempo todo nós fazemos a experiência de
escrever a vida que somos nós, e o mais bonito:
Nós temos o direito de escolher como vamos
pontuar esse texto, porque Deus trabalha o
tempo todo no nosso coração assim,
para que a gente aprenda a escrever,
para que não venha ninguém escrever por nós
e mesmo que alguém passe pela nossa vida,
que apenas deixe detalhes no seu texto porque
o autor é você, e o mais bonito é que tudo está sendo inspirado por Ele.

Vício da fala

Para dizerem milho dizem mio
Para melhor dizem mió
Para pior pió
Para telha dizem teia
Para telhado dizem teiado
E vão fazendo telhados.

Oswald de Andrade
ANDRADE, O. Poesias reunidas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1971

Prometeis, e não cumpris?
Pois sem cumprir, tudo é nada.
Não sois bem aconselhada;
que quem promete, se mente,
o que perde não o sente.

Você é mais que um corpo para ser usado,
você é um coração para ser amado!
Se valorize, sempre!

Felismente existe o álcool na vida.
Uns tomar éter, outros, cocaína.
Eu tomo alegria!
Minha ternura dentuca é dissimulada.
Tenho todos os motivos menos um de ser triste.
Estou farto do lirismo comedido.
Como deve ser bom gostar de uma feia!
Pura ou degradada até a última baixeza
eu quero a estrela da manha.
... os corpos se entendem, mas as almas nao.
- Bendita a morte, que é o fim de todos os milagres.