Poemas curtos de Clarice Lispector

Escrever é o mesmo processo do ato de sonhar: vão-se formando imagens, cores, atos, e sobretudo uma atmosfera de sonho que parece uma cor e não uma palavra.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. (...) Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros.

Clarice Lispector
Gotlib, Nádia B. Clarice: uma vida que se conta. São Paulo: Ática, 1995.

Nota: Último bilhete escrito no hospital da Lagoa, no Rio de Janeiro, em 7 de dezembro de 1977.

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Eu tenho tanto medo de ser eu.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Ela forçou de dentro de mim a sua exigência.

Clarice Lispector
A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Bom, agora eu morri. Mas vamos ver se eu renasço de novo. Por enquanto eu estou morta. Estou falando do meu túmulo.

Clarice Lispector

Nota: Trecho de entrevista concedida ao repórter Júlio Lerner, na TV Cultura, em 1977.

Incompetente para a vida. Faltava-lhe o jeito de se ajeitar. Só vagamente tomava conhecimento da espécie de ausência que tinha de si em si mesma. Se fosse criatura que se exprimisse diria: o mundo é fora de mim, eu sou fora de mim.

Clarice Lispector
A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Ninguém estará perdido se der amor e às vezes receber amor em troca.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica As três experiências.

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(...) ele se arriscou à penosa acrobacia de voar desajeitado. Boquiaberto, olhou em torno porque certos gestos se tornam aterrorizantes na solidão, com um valor final neles mesmos. Quando um homem cai sozinho num campo não sabe a quem dar a sua queda.

Clarice Lispector
A maçã no escuro. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

⁠Ela era antes uma mulher que procurava um modo, uma forma. E agora tinha o que na verdade era tão mais perfeito: era a grande liberdade de não ter modos nem formas.

Clarice Lispector
Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Que minha solidão me sirva de companhia, que eu tenha a coragem de me enfrentar.

Clarice Lispector

Nota: Adaptação de trecho do livro "Um sopro de vida".

Escrevo com o corpo. E o que escrevo é uma névoa úmida.

Clarice Lispector
A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Muito elogio é como botar água demais na flor. Ela apodrece.

Clarice Lispector
Gotlib, Nádia B. Clarice: uma vida que se conta. São Paulo: Ática, 1995.

Nota: Trecho de entrevista com Ziraldo, em 1974.

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E, se você me achar esquisita, respeite também. Até eu fui obrigada a me respeitar.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Ao Linotipista.

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Mas sentimentos são água de um instante. Em breve – como a mesma água já é outra quando o sol a deixa muito leve, e já outra quando se enerva tentando morder uma pedra, e outra ainda no pé que mergulha.

Clarice Lispector
A legião estrangeira. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho do conto A legião estrangeira.

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Meu Deus, me dê a coragem de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites, todos vazios de Tua presença. (...) Faça com que a solidão não me destrua. Faça com que minha solidão me sirva de companhia. Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar. Faça com que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Nota: Trecho adaptado de Link

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Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Saudade.

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Cuidado com suas preocupações, dizem que dá ferida no estômago.

Clarice Lispector
A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

O dia corre lá fora à toa e há abismos de silêncio em mim.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Mas não havia nela miséria humana. É que tinha em si mesma uma certa flor fresca. Pois, por estranho que pareça, ela acreditava. Era apenas fina matéria orgânica. Existia. Só isto. E eu? De mim só se sabe que respiro.

Clarice Lispector
A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

E falo bem baixo para que os ouvidos sejam obrigados a ficar atentos e a me ouvir.

Clarice Lispector
Água viva. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 1998.