Sertão
Vida de mato.
Tem rio por entre a mata
tem galope no alazão
a colheita é sempre grata
com as delícias no fogão
não quero ouro nem prata
basta essa vida pacata
que tenho no meu sertão.
O sertanejo.
Se for luxo e riqueza,
num tem, não senhor.
A minha nobreza
é ser trabalhador,
que vem da grandeza
de alguém de valor.
Sem luxo.
É pela enxada que puxo
respeito e consideração
eu não preciso de luxo
de carro nem de mansão
basta a terra que repuxo
ter a comida no bucho
e muita paz no coração.
Meu roçado.
Desde a minha partida
não tiro leite de gado
não vejo a terra sofrida
não planto no meu roçado
se a chuva for permitida
o sonho da minha vida
É ter de volta o passado.
Galho seco.
A coisa está séria
não tem um atalho
sem água a matéria
resseca no galho
tem muita miséria
pra pouco trabalho.
Natureza.
Na cidade tem escassez
fartura aqui nunca faltou
você pensa no fim do mês
eu no que a gente plantou
fica com o que o homem fez
que eu prefiro o que Deus criou.
O preço da vida.
A beleza aqui encanta
onde fiz meu endereço
se a comida não é tanta
ser feliz não tem preço
da semente que se planta
sempre brota um recomeço.
Minha vida!
Aqui tem boa comida
tem o perfume da flor
a cabeça anda erguida
e o cidadão tem valor
essa é a simples vida
que me foi concedida
pela graça do Senhor.
Lá fora ascende
Lua de agosto,
Que em quase setembro,
Cheia reluz em tempo quente
E de todo conto e história
Que em noites de prosa surgem
A lembrança do seu rosto
Se torna a única memória
Por você deixo que lutem
Deixo de ter título
Deixo até de ser Rei
Se ao teu lado eu for mais que amigo.
Em noite de agosto,
Quase setembro
Deixa eu ser teu exemplo
De amor sem desgosto
E com gosto serei
Terra solta.
Onde a água não irriga
é triste a situação
o governante nem liga
se falta chuva no sertão
se não brota uma espiga
a dor que vai pra barriga
também fere o coração.
O sítio.
Eita saudade certeira
de fazer fogo de lenha
de subir numa estribeira
correr pasto pela brenha
ir buscar a vaca leiteira
e tomar leite na ordenha.
Esperança.
É assim a nossa vida
como viver numa balança
num dia a seca é contida
no outro a seca avança
mas o que falta de comida
está sobrando de esperança.
Ir e vir.
O nordestino vai embora
com medo da solidão
da seca que lhe devora
que maltrata a plantação
expulsa... bota pra fora
mas ele não vê a hora
de voltar para o sertão.
No sítio!
Viver aqui é bom demais
sem sujeira nem entulho
bem pertinho dos animais
é coisa que eu me orgulho
quase tudo aqui se faz
e a vida segue em paz
sem fuxico e sem barulho.
Cadê a chuva?
São Pedro meu companheiro
não esqueça o nosso lugar
o vento só vem rasteiro
numa quentura de lascar
abra logo esse chuveiro
que o pobre desse vaqueiro
só come se alguém plantar.
Que terno! - disse ele do poema que leu, e logo complementou: é um verdadeiro presente que se dá a quem se gosta...
E o diálogo seguiu em forma de prosa em meus pensamentos, afinal, sempre gostara de escrever:
- Seu moço, posso saber porque "tai" rindo tanto feito "tabacudo"?
- "É mode quê" eu voltei pra ca!
- "Mai comé" que tu fica feliz em voltar pra essa terra infeliz? Aqui "num" tem nada de bom.
- Eu sentia falta do gosto da água e do cheiro de barro. "Oia" pra isso: o pasto cresceu. Tem até flor, aí eu catei uma e dei pra Tôinha.
- E é por causa disso que tu tá tá sorrindo? Tu é doido! Lá na "capitá" tu tem tudo...
- Menino, meu tudo é Tôinha. "Num" adiantava muito não. "Mai" sorte que percebi isso logo e ela ainda me queria. "Num" pude trazer nada de lá... Mas essa flor, sim, essa flor ela gostou. Disse até que vai colocar num vaso. Foi lá na feira comprar.
- Tu é doido! Tu é doido João.
- Eu sou doido de amor! Só se for...
Tôinha colocou a flor no vaso e no cabelo também. Se arrumou, passou perfume que João gosta e o chamou para comer.
- Eu trouxe esse CD de "capiba" da "fêra" pra tu. Ainda gosta?
- Não precisava minha, flor!
Não restou nada do cuscuz com galinha e pão que Tôinha fez. Foi tudo tão inesperado. Mal sabia ela que depois de dois anos e sete meses iria rever João. Nunca, nenhuma vez, se falaram depois que brigaram.
Amor verdadeiro não morre, se materializa numa rosa do sertão, num pedaço de pão, num perfume lembrado, num CD que foi comprado. O amor está num sorriso estampado de quem volta feliz para casa, na certeza de encontrar sua amada.
Agradecimento!
Agradeço a Jesus
o ovo e o cuscuz
e a família no lar...
a casinha sem luxo
a comida no bucho
e um chão pra plantar.
A terra seca
O vento que não sopra
os pássaros que não cantam
o sol que estremece as árvores;
Secas.
Maria na janela.
o sol queimando o vento
o vento que não sopra
o sol queimando Maria na janela
o bem-te-vi que não canta
Soalheira e silencio
Ar morto e viscoso
o céu sem nuvens
janela sem Maria
Um fim de janeiro, nos confins do sertão.
POR MAIS BRISA
Nasica há muitos verões.
O calor era escaldante!
Minha mãe pariu-me, na terra, sem nenhuma sombra.
Cresci como se tivesse um casco e não uma pele!
No sertão, em plena quentura, sobrevivi!
Mas o meu coração não é de pedra!
Nesta vida, só tenho em pedido: por mais brisa!
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