Poesias para a Pessoa Amada

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⁠Alforria das Palavras

Depois da ordem das coisas,
as pedras só podiam rolar,
tão certas quanto o vento,
que não indaga os caminhos.

Não havia mais o inverso.
De tudo, só as palavras
escapavam à sujeição.
Flutuavam livres,
no deslimite das coisas,
nas bordas do impossível.

Iam e vinham,
urgentes em se espalhar,
como quem entende os despropósitos da vida
sem jamais se perder.

As pedras sabiam o seu lugar,
mas a palavra, alforriada,
não se aquietava,
não se atava ao chão.

As pedras,
escravas de seu destino,
rolavam para cumprir o que lhes foi dado.
Enquanto as palavras existiam,
suspensas entre o céu e a terra,
preenchendo os vãos do não dito.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Ano novo.

O tempo
empilha dias como quem constrói algo.
No calendário, há um rumor divino,
intervalo entre o que fomos
e o que fingimos ser. Fim.

O ano velho, cansado e curvado,
esconde no bolso sua última promessa,
deixa sobre a mesa o peso dos sonhos,
riscados por mãos que tremem.

Meia noite.
No salto do instante que vira página,
nos descobrimos novos,
ainda que usados. Recomeços.
No limite do voo,
não há destino:
apenas um céu que ainda não sabemos ler.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Pareidolia

Nas nuvens, um coelho,
feito de vento e migalha de céu.
A natureza inventa vida onde há silêncio,
e a mente, danada, faz enxergar.

Eu vejo contornos que nem existem,
ou talvez existam, porque os inventei.
Minha sina é dar nome às coisas que ainda não sei o que são
e bordar sentidos no que vi.

Um galho seco me acenou — ou talvez fosse um braço.
Ao lado, a bananeira, com dentes amarelos, sorriu.
As coisas criam sentidos quando alguém as olha sem pressa.

Dia desses, vi teu rosto numa poça d’água,
um rosto de luz, desses que não têm peso.
A poça ria de mim com suas bordas de lama,
igualzinho tu faria se me visse fantasiar.
E eu, feito criança, ri de volta.

Seria loucura, ou só o mundo brincando de ser?
Tudo acaba virando o que o olhar quer.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Asa de um lado só

Só tenho uma asa.
Um lado mudo de pássaro.
O céu me namora,
mas eu sou do chão.

Se tivesse duas,
voava em linhas tortas,
fazia rasantes no azul
e inventava nuvens novas.

Com uma só,
fico brincando com o vento,
sonhando ser passinho,
pés no chão e cabeça nos ares.

Quem sabe um dia,
no finalzinho da lida,
a asa murcha cresça
e eu, enfim, conheça o céu.

Minha asa pulsa,
como se já soubesse do infinito.
Uma asa é quase nada,
ou tudo — depende do corpo que sonha.

Inserida por Epifaniasurbanas

Milagre de chão

Meu milagre não desce do alto,
não brilha em vitral.
Não vem do céu, mas de poças.

Rasteja.
Bebe do lodo dos dias passados,
canta no barro onde a dor se aloja.

Devagareia.
Aprendeu com o peso da espera
a carregar o lar nas costas.

Meu milagre é andar sobre as mágoas,
ser lesma que, mesmo lenta,
assina nas folhas um rastro de ida.⁠

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Não se relacionem nem apoiem aqueles que querem o seu mal. Ideias racistas, xenofóbicas e misóginas não são apenas opiniões divergentes — são promessas à espera de oportunidade.

Como pode um nordestino apoiar alguém que o despreza abertamente? Como pode uma pessoa LGBTQIAPN+ dar voz a quem nega sua existência? Como pode uma mulher defender quem insiste em reduzi-la à inferioridade?

A adesão a discursos que negam a dignidade de um grupo pode vir da desinformação, da manipulação emocional, de promessas individuais ou da ilusão de que "não é bem assim". Mas é exatamente assim. Palavras constroem narrativas, narrativas moldam políticas, e políticas definem vidas.

Não se enganem: o ódio normalizado hoje se torna a violência legitimada amanhã. Nenhuma promessa econômica justifica a negação de direitos fundamentais. Nenhuma tradição pode servir de desculpa para a opressão. O caminho para a barbárie começa com a aceitação da intolerância como mera opinião. E, contra isso, não há espaço para neutralidade.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Manifesto analógico

Caminho ao contrário da pressa digital.
Meus pés fazem questão de tropeçar.
Gosto de esbarrar nos nomes,
perder o rosto e achá-lo na lembrança.
Lembrar os números e discar.
Deixar a voz ferver no ouvido sem acelerar o áudio.

Não quero que um robô faça o que minhas
mãos ainda tremem para fazer.
Escrever torto, borrar o caderno, errar sem a
opção de apagar.
Minha mente é ilógica, se perde no meio da
frase porque está ocupada sentindo.

Fora do trabalho, me divorciei do virtual.
Não confio o que amo às nuvens —
nuvens não sabem ficar.
Mudam de forma, trocam de nome,
desaparecem sem se despedir.

Voltei a imprimir memórias,
fazer backup na gaveta,
guardar fotos para que o tempo não as engula.
Escrever cartas com minha letra,
imprimir no texto minha personalidade.

Não tenho pressa de chegar a lugar algum.
Dificilmente chegarei ao dobro dos anos de hoje.
O destino já não me interessa tanto quanto o caminho.
Quero o que importa perto.
Quero ter rabiscos nas margens dos livros,
esperando o reencontro com minha versão mais ingênua.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Tudo me serve de esteio,
cama, sofá, chão, chuveiro.
Joelhos transformam-se em apoio
e os cabelos eu faço de arreio.
Tatei-o tuas ancas e seios
enquanto revira-se em espasmos
alheios.
Desvendo teu pubescente abrigo ao
passo em que alojo-me em teus meios.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Teus Detalhes

A lúnula dança em seus dedos,
uma lua mínima que esconde
o controle das próprias marés,
branca de silêncio e segredos,
como se as mãos fossem ninhos,
guardando sonhos que dormem
nas linhas de sua palma.

Em seu coração, quatro cavidades ressoam;
os átrios recolhem memórias,
enquanto os ventrículos sopram sonhos.
A aorta, em silêncio, germina,
levando o amor e o sangue às extremidades.
E, nesse compasso oculto,
cada batida floresce.

Nos seus olhos,
a luz se desenha sob as escleras,
em lemniscatas, um caminho sem princípio ou fim,
um infinito que repousa entre o tempo,
que envolve sem pesar,
um laço suave de ternura
que flui entre a glabela e a pele.

É tão leve, tão profunda,
como flor que se abre na espera,
desabrocha em silêncio e cresce no cuidado.
Sua beleza é quieta,
uma prece que o coração faz
sem saber que está rezando.

Inserida por Epifaniasurbanas

Versos tecidos no silêncio

Quantas horas leva alguém para se tornar expert em um assunto?
Foram milhares as horas que dediquei ao meu silêncio.
Hoje, é a língua na qual possuo maior fluência.

Aprendi a escutar o tempo,
a respirar o compasso de cada segundo.
Ao respeitar sua dança, percebi:
o silêncio não é ausência,
mas uma fonte infinita de compreensão.

No silêncio, as palavras ganham novos contornos,
como se cada sílaba fosse esculpida pela quietude.
A ausência de som cria melodias invisíveis,
e os sentimentos nascem, livres,
sem a limitação da fala.
Uma sinfonia espacial.

Descobri que, quando a boca cala,
outros sentidos florescem.
Os olhos traduzem o que os lábios calam,
o olfato beija o tato,
e os ouvidos, ah, eles leem o murmúrio do mundo.

Na quietude, encontrei a língua do sentir.
Foi assim que fiz poesias com meus sentidos.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Professores, alunos e ostras

Professores são provocadores.
Suas ideias, pequenos grãos.
Um grão faz a ostra sofrer,
e a pérola é a resposta a esse sofrimento.

Os professores lançam grãos no silêncio da gente.
Grãos pequenos, insignificâncias...
Mas as ostras se inquietam com as miudezas,
o saber também incomoda.

Do desconforto do conhecimento,
ostras e mentes fabricam claridades.
Não é só o mar que faz pérolas,
a paciência do ensinar também.

As ideias dos mestres,
esses grãos de perguntas,
é o que fazem brotar no miúdo do nosso pensar
um clarão de entendimento.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Da Ideia à Criação

Antes da lâmpada brilhar,
houve a sombra da ideia,
um pensamento que se insinuava
como quem espreita o destino
sem revelar suas intenções.

O homem, em suas limitações,
só cria porque contempla
o que ainda não existe.
Do verbo ao cosmos,
do planar ao conceito de vôo,
tudo vibra na necessidade
de criar o novo, de moldar o nada.

Pensar é plantar mundos,
colher inovações
que o futuro não supõe.
É fazer do impossível o alicerce
e do impensável
o corpo da criação.

A primeira ideia foi o verbo,
e, desde então,
cada invenção é como uma prece
que nasce nos cantos da alma,
esperando o instante
em que essa ideia se faça matéria.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Fontana do Trevi

Caem as moedas como migalhas de brilho,
partem das mãos com o desejo de se tornarem sonhos,
e o fundo as acolhe como silêncios,
esperando que o tempo lhes devolva voz.

A fonte, imensa em sua mudez,
de costas, recebe pedidos que não ousam gritar.
Em Trevi, o desejo pactua entre águas,
como se um murmúrio pudesse concretizar o devaneio.

Cada moeda que afunda carrega um preço,
um desejo que custa a esperança.
É um pacto entre a moeda e o homem: ele joga, e a fonte o dissolve em segredo,
restituindo-lhe um pouco de vazio,
como se o vazio fosse tudo que temos.

O que desejamos, na verdade, não é sermos atendidos — mas sim que o mistério siga impenetrável,
e, no reflexo da fonte, o que buscamos ver
é apenas o eco de nós mesmos,
profundo e mudo.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Panapaná

Essas borboletas têm mania
de carregar o verão nas asas.
Se vestem de vento e claridade,
vão aonde a cor inventa o ar.

Gosto delas porque sabem
se miudarem no céu — só ou em bando —
como se o céu fosse coisa de brincar.
Coleciono-as em álbuns soltos.

Ali, no meio do sol,
são mais tintas que matéria,
mais riso do que bicho:
elas são coisa e não são.

Dizem que vivem pouco
— mas pouco pra quê?
Pousam na eternidade das manhãs,
ficam suspensas no que não dura,
deixando rastros de voo
que só o invisível sabe ver.

E eu as celebro com meu olhar ralo,
que aprende, com elas,
a gastar a vida
no que não sobra.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Vi, vendo e aprendi.

Deus — eu acho — inventou o mundo pra ser riso,
mas a gente, caçador de nadas,
faz da vida um troço
cheio de importância.

Pássaros aproveitam mais as tardes que os homens,
voam fora das asas.
Olhar um passarinho seria suficiente,
mas teimamos em perguntar o por que de tanto voo.
No voar sem pressa,
nos ensinam a atrasar o fim do dia.

Vi, vendo e aprendi o homem complica,
feito formiga carregando folha grande.
Parece que a vida não basta em si.
Não tem segredo em ser, disso eu sei.

É só a alegria besta de estar na terra,
feito pedra que gosta de água
ou planta que conversa com o vento.
Só se é adulto quando se cresce criança.

A gente inventa propósito tentando esconder o óbvio:
que viver é um exagero de simples,
uma risada larga,
um susto bom de não entender tudo.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠A gente precisa pouco
De dinheiro pra gastar
Porque o que passa disto
É somente pra esnobar.

Santo Antônio do Salto da Onça RN
Terra dos Cordelistas
30/10/2024

Inserida por gelsonpessoa

⁠Quanto mais alto eu falo
A voz tende a sucumbir
Acho que desce no ralo
E eu não consigo me ouvir.

Santo Antônio do Salto da Onça RN
Terra dos Cordelistas
30/10/2024

Inserida por gelsonpessoa

⁠Você me é preciosa
Nem diamante é assim
Vejo quanto és valiosa
Quando estás perto de mim.

Santo Antônio do Salto da Onça RN
Terra dos Cordelistas
30/10/2024

Inserida por gelsonpessoa

⁠Dois de novembro

No silêncio íntimo que invade o Dia de Finados, a saudade se debruça. Ela não tem pressa, é senhora do seu próprio compasso. É o dia em que a ausência brinca de ser presença, quando os que partiram voltam, não em carne, mas em sopro, como se sempre estivessem apenas a um afago de distância.

Os túmulos não mentem. São declarações sem palavras de que o que foi vivido realmente existiu, confessando com a solidez do mármore que a vida é frágil e que o tempo é um rascunho rabiscado à pressa. Cada nome entalhado ascende, não como uma mera inscrição, mas como um feitiço sussurrado entre as frestas do esquecimento.

Nem toda ausência é tratada pelo tempo. O tempo não se compromete com permanências. Passa por nós sem desculpas, sem aviso, sem oferecer alívio. Quando alguém que amamos morre, morre também uma versão nossa. Deixamos de existir daquele jeito. É como ter sua casa assaltada por uma ausência. Por isso, não se deve apressar a dor de ninguém. No luto, não se questiona o amor por quem partiu. No luto, deixamos de nos amar, e voltar ao amor próprio demora. Deixe a pessoa doer.

O luto não passa; somos nós que passamos por ele. É um caminho de fragilidades. Não há como sair de uma dor caminhando. Precisamos engatinhar até voltar a firmar os pés novamente. E demora até que essa dor vire saudade. Demora até que essa saudade vire gratidão. A dor é solitária, e você tem todo o direito ao seu luto, mesmo depois da licença do outro acabar. Cada um tem seu tempo de digestão.

No murmúrio de uma prece, na chama vacilante de uma vela, reside a certeza de que, do outro lado do mistério, alguém sorri — os eternos hóspedes da eternidade. Hoje, flores são depositadas por mãos trêmulas de emoção. Mas não é o frescor das pétalas que importa, e sim o gesto. É flor de ir embora. É uma homenagem ao laço que nem a morte é capaz de desfazer.

Inserida por Epifaniasurbanas

Três de novembro


No mês em que a primavera se despede,
e o sol, mais manso, faz-se presente,
floresciam dias de ouro e espera,
prenúncio de encontros, docemente.

Foi na estação de brisa e lume,
quando as folhas murmuram segredos,
que nos achamos sem alarde,
em cores tênues, sem medos.

Caminhavas já em meus sonhos,
estrada traçada em silêncio,
onde o murmúrio do vento sussurra
o amor que arde em denso, intenso.

O mundo, em sua dança vasta,
girou em círculos de espera,
até que em ti se fez acalanto,
porto certo, luz sincera.

Achei-te na dobra do tempo,
onde o aleatório se curva à sina.
Outros conheci por ócio e acaso;
a ti, encontrei porque eras divina.

Outros, passos soltos, vento;
tu, raiz, urgência, beijo,
entre ecos e risos, enfim,
vi que ao teu lado me pertenço.

Inserida por Epifaniasurbanas

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