Poema de Amor Clarice Lispector
Queria ver se o cinzento de suas palavras conseguia embaçar meus vinte e dois anos e a clara tarde de verão.
Se eu tivesse que dar um título à minha vida seria: à procura da própria coisa.
A vastidão parecia acalmá-la, o silêncio regulava sua respiração. Ela adormecia dentro de si.
Eu mal entrei em mim e assustada já quero sair. Eu descubro que estou além da voracidade. Sou um ímpeto partido no meio.
Porque é cruel demais saber que a vida é única e que não temos como garantia senão a fé em trevas – porque é cruel demais, então respondo com a pureza de uma alegria indomável. Recuso-me a ficar triste.
Quando se trata de apaziguar os outros, transformo-me subitamente numa grande fonte de serenidade. E eu mesma bebo dessa fonte.
Eu não sou senão um estado potencial, sentindo que há em mim água fresca, mas sem descobrir onde é a sua fonte.
Eu queria fazer uma história cheia de todos os instantes, mas isso sufocava o próprio personagem. Acho mesmo que meu mal é querer ter todos os instantes.
Resolvi não falar hoje em saudade, nem dar a entender “saudade” por carinhos... Senão me derramaria demais e perderia o equilíbrio que é tão necessário pelo menos para se dormir de noite.
Tudo o que eu tenho é a nostalgia que vem de uma vida errada, de um temperamento excessivamente sensível, de talvez uma vocação errada ou forçada etc.
Meus problemas são os de uma pessoa de alma doente e não podem ser compreendidos por pessoas, graças a Deus, sãs.
Às três horas da tarde sou a mulher mais exigente do mundo. Fico às vezes reduzida ao essencial, quer dizer, só meu coração bate.
Pensei que só não deixava de escrever porque trabalhar é a minha verdadeira moralidade.
O problema para quem escreve é antes de tudo um problema literário – mas pergunto-lhe agora: é ainda um problema literário a falta de pés no chão ou é anterior a ele?
Depois que uma pessoa perder o respeito de si mesma e o respeito de suas próprias necessidades – depois disso fica-se um pouco um trapo.
Há certos momentos em que o primeiro dever a realizar é em relação a si mesmo.
Fora as vezes que vi por televisão, só assisti a um jogo de futebol na vida, quero dizer, de corpo presente. Sinto que isso é tão errado como se eu fosse uma brasileira errada.
O futebol tem uma beleza própria de movimentos que não precisa de comparações.
Eu não queria só ter um passado: queria sempre estar tendo um presente, e alguma partezinha de futuro.
Se seu time é Botafogo, não posso perdoar que você trocasse, mesmo por brincadeira, uma vitória dele nem por um meu romance inteiro sobre futebol.
