Poema de Amor Clarice Lispector
Mas, em contrapartida, a vantagem de ser bobo é ter boa-fé, não desconfiar, e portanto estar tranquilo.
Eu venho de uma longa saudade. Eu, a quem elogiam e adoram. Mas ninguém quer nada comigo. Meu fôlego de sete gatos amedronta os que poderiam vir. Com exceção de uns poucos, todos têm medo de mim como se eu mordesse.
Naquele carnaval, pois, pela primeira vez na vida eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.
Era malcriada demais, revoltada demais, embora depois caísse em si e pedisse desculpas.
Sou uma só. (...) Sou um ser. E deixo que você seja. Isso lhe assusta? Creio que sim. Mas vale a pena. Mesmo que doa. Dói só no começo
Não acusar-me. Buscar a base do egoísmo: tudo o que não sou não pode me interessar, há impossibilidade de ser além do que se é – no entanto eu me ultrapasso mesmo sem o delírio, sou mais do que eu quase normalmente –; tenho um corpo e tudo o que eu fizer é continuação de meu começo; se a civilização dos Maias não me interessa é porque nada tenho dentro de mim que se possa unir aos seus baixos-relevos; aceito tudo o que vem de mim porque não tenho conhecimento das causas e é possível que esteja pisando no vital sem saber; é essa a minha maior humildade, adivinhava ela.
Terei que correr o sagrado risco do acaso. E substituirei o destino pela probabilidade.
Outro sinal de se estar em caminho certo é o de não ficar aflita por não entender; a atitude deve ser: não se perde por esperar, não se perde por não entender.
Então comecei uma listinha de sentimentos dos quais não sei o nome. Se recebo um presente dado com carinho por pessoa de quem não gosto – como se chama o que sinto? A saudade que se tem de pessoa de quem a gente não gosta mais, essa mágoa e esse rancor – como se chama? Estar ocupada – e de repente parar por ter sido tomada por uma súbita desocupação desanuviadora e beata, como se uma luz de milagre tivesse entrado na sala: como se chama o que se sentiu?
Só poderia haver um encontro de seus mistérios se um se entregasse ao outro: a entrega de dois mundos incognoscíveis feita com a confiança com que se entregariam duas compreensões.
É determinismo, sim. Mas seguindo o próprio determinismo é que se é livre. Prisão seria seguir um destino que não fosse o próprio. Há uma grande liberdade em se ter um destino. Este é o nosso livre-arbítrio.
O tempo não existe. O que chamamos de tempo é o movimento de evolução das coisas, mas o tempo em si não existe. Ou existe imutável e nele nos transladamos.
Por caminhos tortos, viera a cair num destino de mulher, com a surpresa de nele caber como se o tivesse inventado.
Não, não quero mais gostar de ninguém porque dói. Não suporto mais nenhuma morte de ninguém que me é caro.
Meu mundo é feito de pessoas que são as minhas - e eu não posso perdê-las sem me perder.
Saber desistir. Abandonar ou não abandonar – esta é muitas vezes a questão para um jogador. A arte de abandonar não é ensinada a ninguém. E está longe de ser rara a situação angustiosa em que devo decidir se há algum sentido em prosseguir jogando.
Criar sim, mentir não. Criar não é imaginação, é correr o grande risco de se ter a realidade.
Estou aqui de vez em quando muito delicada, me interessam principalmente flores e passarinhos.
Não me posso resumir porque não se pode somar uma cadeira e duas maçãs. Eu sou uma cadeira e duas maçãs. E não me somo.
Eu também não sei não pensar. Acontece sem esforço. Só é difícil quando procuro obter essa escuridão silenciosa. Quando estou distraído, caio na sombra e no oco e no doce macio nada-de-mim.
Escrevo muito simples e muito nu. Por isso fere. Sou uma paisagem cinzenta e azul. Elevo-me na fonte seca e na luz fria.
Somente uma coisa me faria bem agora. Seria adormecer com a cabeça no seu colo, você me dizendo bobagenzinhas gostosas pra eu esquecer a ruindade do mundo.
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