Mini Textos de Ana Maria Braga
Por Semear -
Aqui estou!
Tombado e inútil
ao relento dos meus dias ...
Perdido e vazio
sobre as águas da vida
às margens de um rio
que o destino me deu!
Estou seco! Sem nada!
Não tenho sequer
o abraço de um silencio
ou o beijo d'uma esperança ...
Eu sou esse Porto por achar,
essa vida por viver,
essa terra por semear!
Convento da Orada -
Em plena planície Alentejana
há um edifício antigo que se ergue.
A paz que da fachada ele emana
não deixa indiferente quem lá segue.
Há nele um aroma místico de paz
que atravessa a nossa caminhada,
nas várzeas da solitária Monsaraz
alevantasse o Convento da Orada.
Intimo, extenso, pesado mas profundo ...
No seu silencio escutam-se as vozes
de mil frades perdidos pelo mundo.
E passa o tempo, a vaidade, a solidão,
só não passam os olhos tristes e ferozes
de D. Nuno, junto à cruz, em oração.
Ninguém me diga nada -
Hoje venho aqui falar da minha mágoa ...
Da ânsia que me esventra e consome ...
Ninguém me diga nada!
Ninguém a queira entender, porque nem eu,
tampouco, lhe dei nome ...
Esta amargura de onde vem?! Não sei! ...
Mágoa, vazio, solidão ...
Talvez uma euforia a que me dei ...
Dor e agonia de um pobre coração - sem chão!
Porque habita ela em mim se a desconheço?!...
Talvez seja o principio de um amor, ou talvez,
novamente, a revolta de ter nascido!
A tristeza de me ver perdido,
num corpo que passa,
num mundo que em nada, por nada,
me abraça! ...
Pode ser tudo e pode se nada!
Por isso afirmo mas não juro! ...
Viver assim é tudo da vida quanto sei .
E se nada mais me é dado saber,
resigno e não insisto.
E não me questionem!!!
Deixem-me fazer o meu papel de louco ...
Não fui nada! Não sou nada! Nunca serei nada!
Porem, muito me agrada ser, nesta angústia de
ser tão pouco ...
Olhos de Silêncio -
Nos meus olhos de silencio
há dois ecos de saudade
dois martírios consagrados
pelo peso da idade ...
Nos meus dedos levo a culpa
dos amores que não toquei
e se a culpa me matasse,
estava morto, eu bem sei ...
E porque fomos mal-amados,
nunca fomos bons amores,
só Poetas ilibados ...
Mas "ser Poeta é ser mais alto!"
É ser dono das minhas dores
quando aos versos nunca falto!
Vejo no teu rosto -
Hoje vejo no teu rosto
tanto tempo que passou
tanta vida que viveste
tanta esperança que secou!
Hoje vejo nos teus olhos
tanta raiva do passado
tantas culpas que carregas
e convivem lado a lado!
E quanta Morte; quanta Vida
nos habitam sem piedade
nesta loucura sentida!
Mas como o sonho é maior,
a solidão e a saudade
dão lugar ao nosso amor!
Pedido -
Dá-me um pouco de amor
que o silencio já não basta
leva tudo, leva a dor
por onde a vida me arrasta.
Dá-me um pouco de Lua
que a noite não é minha
a culpa não é tua
perdi a Alma que tinha.
Dá-me um pouco de vida
porque a morte vai chegar
levará, de mim, perdida,
a luz do meu olhar.
Dá-me um pouco de paz
ó Senhor da Cruz de pau
pois de mim o que será
se o meu caminho for mau!
Dá-me um pouco de esperança
p'ra vencer a solidão
que me tira a confiança
e me afunda o coração.
Ó Senhor dos meus cansaços
ó Senhor do meu Destino
toma sempre nos teus braços
cada passo do caminho.
O Amor é ...
O amor é como a água
que corre sem parar
num caudal de solidão
no pulsar de um coração
para as águas do mar.
O amor é como a vida
que se dá de par em par
que por vezes é paixão
outras tantas ilusão
de nossos olhos a chorar.
O amor é como a rua
onde passa quem passar
onde chega quem partiu
d'onde parte quem sentiu
tanta dor no seu olhar.
O amor é como as rosas
nas margens do cansaço
umas vezes entre flores
outras tantas entre dores
no leito ou no regaço.
O amor é como a morte
vem de longe num rumor
à procura d'um Poeta
que fala, que confessa
tanta coisa sem pudor.
Afinal o que é o Amor?! ...
É uma coisa inacabada
que alegra e magoa
que nos deixa ir à toa
à deriva pela estrada.
Inter - Mundos -
Inter-Mundos vivem corpos
peregrinos da esperança
alguns vivem como mortos
outros ganham confiança.
Outros tantos não se lembram
que o silencio é o caminho
e talvez até se esqueçam
de encontrar outro destino.
Na verdade não me lembro
quando a vida me deu vida
do destino me dar tempo
de encontrar a Fé perdida.
E porque a morte chega tarde
quando os gritos são profundos
tanta gente com saudade
que vive triste Inter-Mundos.
Ditados -
Quando a vida está cansada
dá-lhe espaço p'ra te ver
que ela mostra nova estrada
p'ra que a possas entender.
E deixa que ela escute
o teu grito de saudade
não há bem que sempre dure
nem mal que nunca acabe.
E porque a vida não se aninha
nem se dá a quem não espera
por morrer uma andorinha
não acaba a Primavera.
E há sempre uma quimera
que nos tira a confiança
quem espera desespera
quem espera sempre alcança.
Tantas bocas que antevêem
mentindo a toda a gente
mas olhos que não vêem
coração que não sente.
Na verdade a compaixão
é água mole em pedra dura
mas com Amor no coração
tanto bate até que fura.
Sobre a vida derramadas
tantas culpas que sentimos
mas as águas passadas
já não movem os moinhos.
E quem só vive em solidão
é seco e não tem trilhos
mas quem se dá ao coração
tem nos filhos os cadilhos.
Quem toma o que não é dele
é um cego sem saber
mas pior cego é aquele
que não vê e não quer ver.
Gente que nasce do frio -
Há gente que nasce do frio
como a bruma ensanguentada,
triste, só, dilacerada
sobre as águas do Rio.
Gente que nasce do nada
como as ondas do mar
como o vento ao tocar
numa casa abandonada.
Gente que nasce a chorar
como as aves dos Céus
como os olhos de Deus
cansados de esperar.
Gente que nasce perdida
como alguém que ao morrer
não consegue esconder
quanto dói a despedida.
Quando se vive e não sentiu
que a dor nos dá força,
o destino baloiça
e mata gente de frio.
Portas do Mundo -
Porque se fecham para mim
todas as portas do Mundo?!
Por que trago estas dores sem fim
e, na voz, um grito profundo ...
E porque me dão amarguras
todos os olhos que encontro?!
Por que as palavras impuras,
habitam tristes, meu canto ...
Porque serei um condenado
desde a hora em que nasci,
triste e perdido, na dor do Passado?!
Por que visto um silencio maior ...
Por que não importa o que perdi ...
Só importa encontrar o Amor ...
Ai -
Ai esta insatisfação que me habita
ai esta angustia que me come
ai esta amargura que se agita,
no meu peito, sem nome!
Ai esta loucura que eu visto
cheia de escárnio e solidão,
ai este não-sei-se-resisto
à dor que me esventra sem razão!
Ai esta mentira que eu vivo,
ai este pecado que eu sou,
um pobre coitado, vencido ...
Que vive a vida escondido,
perdido e calado, despido,
pois a esperança na vida, voou!
Um Pouco de mim -
Minha vida nunca foi um mar de rosas
onde o rio dos meus cansaços pudesse desaguar,
mas sim, um vendaval de ondas furiosas,
onde, no mar alto, só vi sonhos naufragar!
E nunca estive à mesa onde se come,
nunca fui capaz de ter ou dar amor,
nunca fui à cama onde se dorme,
nem senti o balsamo de uma flor!
Que inferno colossal o destino me entregou!
Pobre vagabundo com roupas de jasmim
que alicerça nos poemas a revolta que o gerou ...
E levo aos ombros o peso desse desdém ...
Nos versos d'Alguém, há sempre um pouco de mim,
pois o que sou e não sou, tantos foram também!
Fui -
Fui de cansaço em cansaço
de solidão em solidão
nem a esperança de um abraço
só vazio no coração.
Fui de poema em poema
de loucura em loucura
na verdade que o tema
sempre foi amargura.
Fui de boca em boca
procurando um coração
e só a loucura mais louca
levei triste na mão.
Fui alguém que ninguém viu
uma Alma ressentida
fui um preso que fugiu
das amarras da vida.
Deixem Passar -
Deixem sofrer quem d'amargura vai vestido,
quem de sonhos vai despido, deixem passar,
deixem falar quem na vida está vencido,
sem mãe nem pai, como um barco a naufragar!
Deixem cantar quem ao Fado deu a voz,
quem tem olhos cor de medo, sem nada,
no silêncio d'um destino, acompanhado e só,
vivendo a vida numa casa abandonada!
Deixem passar quem à mágoa deu o nome,
quem plantou no coração a rosa brava,
que cresce na demência que o consome!
Deixem ouvir o grito das entranhas
que ressoa de uma alma em vão cansada
e deixem-no passar por entre as madrugadas!
Este Livro -
Este Livro que vos deixo
é de mágoas e saudade
o que há em mim de sem vontade
que tantas vezes está por baixo!
Já não é nenhum segredo
vejam bem que triste sorte
nem me lembro que há a Morte
nem da vida tenho medo!
E às vezes ponho e minto
nestes versos que me dão
o que vivo mas não sinto ...
Pois os versos nunca são
mais que a hora que os pressinto
um travo amargo a solidão ...
Antes de Nascer -
Foi tudo um sonho desfeito
que passou na minha vida
e erguendo as mãos ao peito
adormecido no leito
nem uma esperança em mim havia!
E vivi tanta mentira
sobre a luz de um triste corpo
pois a vida tudo tira
e nunca mais ninguém me vira
esperando alguém naquele Porto!
Aconteceu sem esperarmos
aconteceu sem acontecer
tudo parou ao pararmos
passou tudo sem passarmos
morremos antes de nascer!
Auto do desencontro -
Quando o meu amor chegar,
se chegar e eu já tiver morrido,
esse alguém há-de amar
como se eu nunca tivesse existido!
Que talvez nem por mim sofra!
E como poderá sofrer se chegar
e eu já tiver partido?!
Destinado a encontrar tudo vazio ...
... de mim ... sem mim ...
Absorto! Alguém sem rosto, cujo corpo,
é morto!
Na verdade alegro-me por sentir que a
minha morte não traz pena!
Se eu morresse agora e soubesse
que chegavas amanhã,
partia sem demora,
só por saber que chegarias
e que meus versos se cumpriam!
Hoje morreria ...
Tu chegavas depois de hoje ...
Depois de amanhã nada acontecia ...
Tudo estático, igual, como sempre,
como dantes.
Ah, ah, ah, ah, ah, ah, ah ...
Deixem-me rir desta sequência ...
Ela foi a minha vida ... nua e crua ...
Para mim sempre se fez gente ...
Sempre se fez rua ...
Alguém bate à minha porta ...
Que faço?!
Acabo os versos?! Abro a porta?!
Ou adormeço simplesmente?!
Se acabar os versos quem bate à porta
pode partir ...
Se abro a porta quem sabe o que será?!
O tal Amor? A Morte? ...
Se for amor, não acabo os versos e a´
minh'Alma não se cumpre!
Se for a Morte, os versos serão cumpridos
mas p'ra sempre inacabados ...
Que faço?! Que faço?!
Alguém abriu a porta ...
Vou voltar-me para trás.
Se for o vento terminarei os versos
e o meu ser estará completo.
Se não os acabar sabereis que encontrei
o tal amor
ou
a Morte,
a Morte,
a Morte ...
Deambulatório -
Às vezes a Vida parece ingrata
porque nada acontece
e em tudo se esbarra
na inutilidade de existir ...
E o vento grita de noite,
a cada esquina, a cada canto,
e a noite, calada, vagueia,
negra, vazia, intacta, nua ...
E a mágoa é como um vicio,
doença terminal que nos destrói,
e há sombras, muitas, tantas
que procuram, chorando, por mim ...
E a rua?! Por quem espera aquela rua
do principio até ao fim?!...
Nela ... nada acontece ...
Olá, Adeus -
Foi tão bom encontrar-te
e tão triste esse momento,
foste embora mal chegaste
olá, adeus ao mesmo tempo!
Ao chegares, mal te vi,
já dizias, vou partir,
nem sei bem o que senti
não te podia impedir!
E o meu coração parou
e tudo parou também
alguém partiu e não voltou
daquelas bandas de além!
E de nós dois o que ficou?
Só a dor desse tormento!
O meu coração parou
parou tudo ao mesmo tempo!
✨ Às vezes, tudo que precisamos é de uma frase certa, no momento certo.
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