Luto Morte
DESCOBRIR A VIDA NA MORTE
Eu já faleci, há uns anitos...
Fizeram-me todas as encomendações
E recomendações conforme a fé familiar...
Segui, por fases, todos os trâmites legais
E funcionais, entre os quais:
Como era grande pecador,
Passei primeiro pelo crivo
Doloroso da peneira das penas do Inferno,
Que me chamuscava os sovacos da primavera ao inverno.
Passaram-me depois a outra repartição:
Esta, bem mais animadora,
Graças minhas a Nossa Senhora!
Eram os tempos do Purgatório,
Onde me fizeram purgar tudo e o acessório.
Mas, senhores, puseram-me tão magrinho!
Chegada a hora de melhor sorte,
Fizeram-me chegar de elevador ao piso seguinte,
Numa manhã luminosa e serena,
Ao Céu, aos Pés de Nosso Senhor da Boa Morte!
Olhou contristado para mim e falou:
Que purga! Que magrinho e tão tristinho!
Aí, eu fiz uma cara de anjinho e Ele continuou:
Rapaz! Vais ter direito a banho de sais e mais...
Vão dar-te calção de praia, óculos de sol e t-shirt.
Depois, vais mas é divertir-te!...
Respondi, com decisão:
Não, Meu Senhor!
Se estou no Céu, quero primeiro ver a minha mãe, meu pai, irmãzinha e tantos mais!
Não é que Nosso Senhor, começou a arrotar
E a deitar pelos olhos luzes fatais!?...
Sentei-me no chão e comecei a chorar, a chorar...cada vez mais!
Senti uma mão no ombro, tão leve e serena, como uma pena...
Era o Nosso Senhor a dizer: Vamos lá, rapaz, vamos à nossa vigília.
Não demora muito e verás a tua família. E eu sosseguei!...
(Carlos De Castro, in Há Um Livro Por Escrever, em 09-05-2023)
TRÂNSITO NA PASSADEIRA DA MORTE
Ensinaram-me a andar,
Atento e devagar,
Para não ser atropelado
Nem atropelar
Quem se cruze no fado
Comigo,
Mesmo em único sentido
Na vida.
Senhor, com tanta brida,
Nem se respeitam sinais
Nem prioridades,
Tantos mortais senhores de nada
Que querem fazer da estrada
A coutada dos seus ruins ideais!
Têm cara de demónio
O único prazer património
Que querem auferir na vida,
É matar gente já sofrida.
Ontem, pela manhãzinha,
O sol raiava pela fresquinha
E eu meti pés ao caminho
Para aspirar a vida de mansinho.
Alguém em potente máquina de matar
Quem na frente deles se atravessar,
Me ia levando inutilmente pelo ar,
Como já morto e inerte passarinho.
Salvou-me alguém lá dos céus,
Que mesmo sem ouvir os brados meus,
Deu-me a força de me atirar à valeta
Em voo rasante, como em tempos,
De tantos outros contratempos,
Eu, como uma leve borboleta,
Pousava e saltava sem parar
Sempre que me queriam matar.
(Carlos De Castro, in Há Um Livro Por Escrever, em 01-07-2023)
A vida, quando se cansa de si própria, apenas tem para oferecer a morte, numa espécie de divertimento ridículo.
Como é linda, a morte!
Por controverso que seja, o pensamento procede.
A morte ressuscita virtudes;
A morte faz amigos;
Ela coloca fim aos desafetos;
Aos mortos fazemos os elogios que jamais fizemos aos vivos.
Linda é, apesar de extrair lágrimas, ela faz refletir como não se faz na vida, na saúde.
A morte é arrogante, robusta, a fé mais grande do homem não corrompe a sua natureza! Ela assusta e envenena os vivos com seu perfume.
A única certeza é a morte?
O único que salva é o amor?
Contar até 3 ,10 ou 1000, sempre acalma a ansiedade?
A dor sempre será o fim?
A vida é única e exclusivamente pessoal, então escolha viver!!!
Bem-aventurados são aqueles que, em vida, são percebidos e não dependem da morte para serem amados. Desventurados são aqueles que vivem como se já estivessem mortos e, por isso, ao morrerem, não causam desconforto algum aos que ficam.
