Liberdade Borboleta Fernando Pessoa
Nada é horrível, nada é maravilhoso. O seu olho daqui é que transforma tudo. O seu jeito de enxergar é que faz a diferença.
Você tem que parar de sentir falta, de quem não sente de você. Porque tem pessoas que não valem à pena.
Guarde sua capacidade de rir descontroladamente de tudo. Eu, às vezes, só às vezes, também consigo. Ultimamente, quase não. Porque também me acontece – como pode estar acontecendo a você que quem sabe me lê agora - de achar que tudo isso talvez não tenha a menor graça.
Melhor interromper o processo em meio: quando se conhece o fim, quando se sabe que doerá muito mais — por que ir em frente?
Os dias se interrompiam quando ele ia embora. Recomeçavam apenas no mesmo segundo em que tornava a chegar. Não sei quanto tempo durou. Só comecei a contar os dias a partir daquele dia em que ele não veio mais.
Que vontade, que vontade enorme de dizer outra vez meu amor, depois de tanto tempo e tanto medo. Que vontade escapista e burra de encontrar noutro olhar que não o meu próprio - tão cansado, tão causado - qualquer coisa vasta e abstrata quanto, digamos assim, um caminho.
Porque ver é permitido, mas sentir já é perigoso. Sentir aos poucos vai exigindo uma série de coisas outras, até o momento em que não se pode mais prescindir do que foi simples constatação.
A vida nos prepara cada cilada, já cantava Elis (choro sempre quando a ouço), e continua: e é inútil se tentar fugir da longa estrada, lembra?
Hoje tenho grande urgência de viver.(...) Todos trabalharam loucamente. Não há tempo para perder com gente chata, coisas chatas...
Contarás nos dedos os dias que faltam para que termine o ano. 'Não são muitos', pensarás com alívio.
Comecei a enumerar nos dedos quem poderia sentir a minha falta: sobraram dedos. Todos estes que estou olhando agora!...
Não-palavras e não-ações, porque o silêncio e a imobilidade foram dois dos jeitos menos dolorosos que encontrei, naquele tempo, para ocupar meus dias.
Tem coisas da gente que não são defeito nem erro: são só jeito da gente ser. O negócio é acostumar com isso e não sofrer. Aliás, o melhor jeito, em relação a qualquer coisa, é sofrer o mínimo possível. Aquilo que os americanos chamam de relax and enjoy – mais ou menos "relaxe e curta".
Mas passa... Está vendo essa dor que agora samba no seu peito de salto agulha? Você ainda vai olhá-la no fundo dos olhos e rir da cara dela.