Ja me Disseram q eu sou uma Mulher Incomum

Cerca de 540073 frases e pensamentos: Ja me Disseram q eu sou uma Mulher Incomum

Que importa o sentido? O sentido sou eu.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Facilidade repentina.

...Mais

Eu sou antipática mesmo, o mundo tá cheio de gente brega e limitada e é um direito meu não querer olhar na cara delas, não tô fazendo mal a ninguém, só tô fazendo bem a mim. Minha terapeuta fala que eu preciso descobrir as outras Tatis: a Tati amiga, a Tati simpática, a Tati meiga, a Tati que respira, a Tati que pensa, a Tati que não caga em tudo porque deixou a imbecil da Tati de cinco anos tomar as rédeas da situação.

Não me pergunte quem eu sou. Nem eu sei direito.

Eu luminoso não sou. Nem sei que haja
Um poço mais remoto, e habitado
De cegas criaturas, de histórias e assombros.
Se, no fundo poço, que é o mundo
Secreto e intratável das águas interiores,
Uma roda de céu ondulando se alarga,
Digamos que é o mar: como o rápido canto
Ou apenas o eco, desenha no vazio irrespirável
O movimento de asas. O musgo é um silêncio,
E as cobras-d´água dobram rugas no céu,
Enquanto, devagar, as aves se recolhem.

Eu faço o que faço, sou o que sou e de nada importa o que se falou!

Sou a pessoa mais legal que eu conheço.

Eu te ajudo, te sustento. Sou teu escudo. Sou o teu Deus.

Eu não evoluo, sou. Eu não procuro, descubro.

Se eu sou tão fechado às vezes, não me leve a mal: é que todas as vezes engasgo quando quero dizer o quanto eu sou grato a você!

Eu sou o tipo dos sem tipos.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Mas ao menos nesse agora, eu quero ser como eu sou e como nunca fui e nunca seria se continuasse.

Tudo o que sou agora

Eu estou atrás da porta, o corpo revirado, amassado, pequeno, todo dobrado. Sou uma carta gigante, chata, cheia de erros, longa demais, muito complicada. “Chega”, alguém, com preguiça de ler sobre o amor ou sem coração para se emocionar com uma carta, disse. E eu virei bolinha de papel.
Eu sou uma bolha de detergente, cansei de exterminar os restos e limpar as sujeiras e saí para voar um pouco. Só não fui avisada de minha fragilidade e estourei, para sempre nada, nem cheiro, nem cor, nem transparência, nada. Tudo foi lavado, desinfetado, seco e guardado, a vida continuou e a minha pequena vontade de arrumar a casa nem sequer é mais lembrada.
Virei a sua remela, aquela que limpei na sua meia brega e cheia de vontade de se rebelar contra o mundo manipulador. Eu sou aquela sujeira que acorda pendurada nos seus olhos, quer atrapalhar a sua visão, mas você ignora e sai de casa tão despreparado para o dia. Eu fico lá, pequena, tosca, amarelada, suja, berrando para ser vista no canto da sua alma, e você não me lava e nem me absorve, você me expele mas não me limpa, você continua acordando com sono e dormindo acordado. Eu continuo no triste papel de remela dependurada e exposta. Eu espero você sonhar comigo para que eu amanheça nos seus olhos, só é uma pena que, pela manhã, seguro em seu espelho, você não sinta nenhum incômodo.
Eu sou uma luzinha minúscula no meio da multidão, uma luzinha que pertence ao show mas não tem o que celebrar. Eu sou um pontinho enorme de tristeza e desespero no meio das pessoas enlouquecidas cantando “I can’t live, with or without you”. Eu sou uma pequena voz em meio a tantas pessoas que sofrem. Deus, eu sei, eu sei, são tantos e maiores os sofrimentos mas, por favor, não deixe de me dar força, me dar força para que pelo menos, ainda que pequena e com vontade de queimar, eu continue ao menos acendendo o meu fogo e fazendo parte da expectativa.
Eu sou um fio de esperança, um fio de alegria, um fio de amor. Eu sou todos os fios que dormiram acalmados pelas suas mãos naquele dia da despedida, se você soubesse que sempre foi só daquele carinho que eu tanto precisava, ele não precisaria ter sido o último.
Eu sou aquele homem estranho em frente ao museu em Firenze, eu vou continuar fazendo louva-deuses de folhas e enchendo peitos puros de amor eterno e esperanças, para sempre eu vou ser tão estranho, surpreendente e interessante quanto o amor.
Mas eu também sou a sacola barata de roupas sem personalidade que agora guarda tudo o que quase foi, tudo o que poderia ter sido e mais o nosso louva-deus de folhas amareladas, cansadas e quase virando pó, quase virando nada e se espalhando pelo mundo que é enorme demais para parar quando sofremos. Eu sou o nosso louva-deus e estou quase virando nada.
Mais do que tudo, sou a garotinha assustada, cinco ou seis anos, ajoelhada no chão do banheiro pedindo que os pais parassem de brigar, assustada com o amor, assustada com a vida, assustada com a porta trancada e a solidão. Essa mesma garotinha mal resolvida que vaga dentro de mim, como um espírito que não aceita evoluir, é a garotinha que quis se curar do medo do amor com um amor tão grande, tão grande, tão grande, que não existe. E ficou sem nenhum.

Minha vida não é essa hora abrupta
Em que me vês precipitado.
Sou uma árvore ante meu cenário;
Não sou senão uma de minhas bocas:
Essa, dentre tantas, que será a primeira a fechar-se.

Sou o intervalo entre as duas notas
Que a muito custo se afinam,
Porque a da morte quer ser mais alta…

Mas ambas, vibrando na obscura pausa,
Reconciliaram-se.
E é lindo o cântico.

\\\\
As folhas caem como se do alto
caíssem, murchas, dos jardins do céu;
caem com gestos de quem renuncia.

E a terra, só, na noite de cobalto,
cai de entre os astros na amplidão vazia.

Caimos todos nós. Cai esta mão.
Olha em redor: cair é a lei geral.

E a terna mão de Alguém colhe, afinal,
todas as coisas que caindo vão.

O Inseto
Das tuas ancas aos teus pés
quero fazer uma longa viagem.

Sou mais pequeno que um inseto.

Percorro estas colinas,
são da cor da aveia,
têm trilhos estreitos
que só eu conheço,
centímetros queimados,
pálidas perspectivas.

Há aqui um monte.
Nunca dele sairei.
Oh que musgo gigante!
E uma cratera, uma rosa
de fogo umedecido!

Pelas tuas pernas desço
tecendo uma espiral
ou adormecendo na viagem
e alcanço os teus joelhos
duma dureza redonda
como os ásperos cumes
dum claro continente.

Para teus pés resvalo
para as oito aberturas
dos teus dedos agudos,
lentos, peninsulares,
e deles para o vazio
do lençol branco
caio, procurando cego
e faminto teu contorno
de vaso escaldante!

Sou uma pessoa incerta! Nunca tenho certeza de nada. A propósito, preciso checar essa informação, só um instante.

Sou uma eterna apaixonada. Romântica, sonhadora e tola. Mando flores, escrevo cartas, digo que gosto. Tenho medo, às vezes me bate um receio, mas acelero, não puxo o freio de mão. É claro que me protejo. Se vejo que estou embarcando numa viagem catastrófica… pulo fora mesmo! Pulo dentro ou fora. Pulo dentro se acredito, boto fé e sinto reciprocidade. E saio correndo quando percebo que a coisa não é bem assim, que o que realmente existe é uma sombra, uma interrogação. A gente sempre espera ver tudo com clareza, só que em matéria de sentimentos… nem tudo é transparente. Quando eu era mais jovem ia sem medo, sem vergonha na cara e com coragem. Mas o tempo passa, a gente aprende, fica com alguns calos e certas marcas. E percebe que o principal é o nosso bem-estar. É duvidoso? Eu tento, mas não insisto mais. Sou uma eterna apaixonada. A diferença entre o antes e o hoje é que antes eu me apaixonava por tudo e hoje me apaixono todos os dias primeiro por mim. O outro vem depois. E tem que valer muito a pena. Se valer, parabéns, me entrego de olhos fechados, coração nas nuvens e muito amor no peito, pra dar, vender e emprestar.

Acho que todo mundo se completa com alguém. Lógico que sim, sou uma romântica incurável. Qualquer pessoa é mais feliz quando encontra a metade da laranja. É melhor ter com quem dividir um passeio, uma novela, uma cama, uma história.

sou impaciente
anuncio todos os meus atos
uma semana antes.

Martha Medeiros
MEDEIROS, M. Poesia Reunida. Porto Alegre: L&PM, 1999.

Sou cheio de muito amor e é isso o que certamente me dá uma grandeza.

Clarice Lispector
Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Não estou à altura de imaginar uma pessoa inteira porque não sou uma pessoa inteira.

Clarice Lispector
A paixão segundo G. H. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.