MINHA CASA Quando percebi... Minha casa... Marcela Albuquerque

MINHA CASA

Quando percebi...
Minha casa estava fria,
As baratas tomavam conta de tudo
Mesmo quando tudo parecia limpo.
Os cômodos pareciam maiores, mais vagos, mais escuros.
A água do pote onde nadavam estrelinhas de vela apodreceu.
Então, o musgo tomou conta das estrelinhas.
O piso branco gelado registrava apenas as marcas dos meus passos.
A mudez do telefone mostrava a inutilidade do bina.

Quando percebi...
O pássaro parecia empalhado,
A cadelinha me causava impaciência,
As plantas haviam secado.
Os anjos queriam fugir das molduras
Como as fotografias que fugiram dos porta-retratos.
Os doces permaneciam nos potes,
Mas pareciam menos atrativos, menos coloridos, menos doces.
O relógio havia parado.

Quando percebi...
Minha casa estava morrendo
E eu não sabia o que fazer
Porque não sabia que casas também morrem.
Apática, apenas me limitei a buscar a causa mortis.
Talvez já soubesse...
Minha cama também sabia: sua ausência.
Um feto morto no útero
Pode matar a mãe.