Comentário sobre Na Esteira das Horas... Gabriel Luz

Comentário sobre Na Esteira das Horas do poeta-reflexivo William Contraponto


Hoje me deparei com um poema postado pelo poeta William Contraponto que, mais do que descrever a passagem do tempo, parece colocá-lo diante de nós como uma engrenagem inevitável — dessas que não se deixam admirar de perto sem que, ao mesmo tempo, nos puxem para dentro de seu próprio movimento. Na Esteira das Horas trabalha com uma consciência dilatada: percebemos a profundidade da mensagem justamente porque ele insiste, em seu refrão, que não percebemos nada enquanto corremos.


O poema articula uma lucidez tardia. As estrofes avançam como dias sucessivos, e os retornos rítmicos funcionam como um lembrete involuntário de que a vida repete seus ciclos com uma precisão quase mecânica. O tempo, aqui, não é metáfora suave — é impulso inevitável, força sem rosto, presença que pesa e avisa. Há um cuidado em mostrá-lo não como entidade sagrada, mas como fenômeno bruto, indiferente ao nosso desejo de controle.


Quando Contraponto afirma que “o futuro não negocia”, ele toca na raiz de uma angústia comum, mas raramente nomeada com tanta simplicidade. Tentamos frear o passo com agendas, hábitos, discursos e ilusões, mas o mundo não firma pactos com quem deseja permanecer. Ainda assim, o poeta oferece um ponto de escolha real — não na origem da vida, mas na maneira como nos deixamos devorar por ela. É uma liberdade modesta, mas profundamente humana.


O impacto maior do poema surge na última estrofe. Ali, a tensão entre passividade e decisão se revela com clareza: não escolhemos nascer, mas escolhemos o modo como enfrentamos o tempo que nos escolheu. É esse tipo de reflexão, discreta e contundente, que caracteriza a poética de William Contraponto: uma escrita que não consola, mas provoca; que não promete fuga, mas lucidez. E lucidez, no universo dele, é sempre uma forma de resistência.


Neno M. Marques