Galeria da Mediunidade Extra (XCVII)... MARCELO CAETANO MONTEIRO

Galeria da Mediunidade Extra (XCVII)

Reverendo G. Vale Owen – O Pastor que Escutou o Céu

No silencioso coração da Inglaterra vitoriana, quando a fé se via desafiada pela ciência e o materialismo tentava impor-se como dogma, um sacerdote anglicano começaria a viver a mais profunda das revoluções interiores. George Vale Owen nasceu em Birmingham, a 26 de junho de 1869, e desde cedo trilhou o caminho do ministério religioso. Estudou no The Queen’s College, em Oxford, e no Birmingham & Midland Institute, distinguindo-se pela erudição e pela sinceridade de propósito.

Aos 24 anos, ordenou-se sacerdote em Liverpool, iniciando sua missão pastoral em Seaford, mais tarde em Fairfields e St. Mathews, e também nos subúrbios de Liverpool e nas cercanias de Oxford. Era um homem de fé lúcida, profundamente cristão, cuja devoção encontrava expressão no serviço silencioso e na palavra pastoral.

Mas o destino, que guia as almas para além das fronteiras do dogma, o aguardava com uma experiência transformadora. Em 1909, a morte de sua mãe abriu-lhe uma porta inesperada. O luto o conduziu à meditação e, em 1913, surgiram as primeiras comunicações mediúnicas vindas do além — mensagens repletas de ternura e sabedoria, que ele reconheceu como provenientes de sua própria mãe.

O homem de púlpito tornava-se, então, um médium consciente. As provas espirituais que recebeu dissolveram-lhe as antigas resistências, levando-o à conversão ao Espiritismo. A partir de então, o reverendo passou a receber comunicações de elevado teor filosófico e moral.

Um Espírito identificado como “Astriel” ditou-lhe as primeiras páginas da série que se tornaria célebre sob o título Life Beyond the Veil (A Vida Além do Véu). Dela nasceram os volumes Os Baixos Campos do Céu e Os Altos Campos do Céu, seguidos de O Ministério do Céu, recebidos sob a inspiração de outro Espírito, “Leader”, que mais tarde assumiria o nome simbólico de “Ariel”. Essas comunicações culminaram em Os Batalhões do Céu e Os Planos Exteriores do Céu, obras que descrevem, com beleza e ordem espiritual, as faixas vibratórias da existência após a morte.

O tom dessas mensagens é de elevação e serenidade, como se a linguagem humana se tornasse transparente diante da grandeza do que descreviam. “Não se trata de imaginação, mas de revelação amorosa dos planos da Vida Maior”, afirmou certa vez Owen, defendendo com humildade a autenticidade de suas experiências.

As suas obras, reunidas sob o título geral Life Beyond the Veil, contaram com o prefácio admirativo de Sir Arthur Conan Doyle, que escreveu:

> “Com que segurança se afirma que Deus fechou as fontes da inspiração há dois mil anos. Não será infinitamente mais razoável crer que o Deus vivente continua a derramar novas luzes sobre os homens?”



Também Lord Northcliffe, ao entrevistá-lo para o Weekly Dispatch, reconheceu-lhe a grandeza moral:

> “Vi-me diante de um homem de convicção inabalável e sinceridade radiante. Quando lhe ofereci vultosa soma para publicar suas obras, ele recusou, pedindo apenas o suficiente para a modesta edição de seus livros.”



A coragem espiritual de Owen teve, contudo, um preço amargo: perdeu a sua paróquia e a segurança material. Privado do sustento clerical, dedicou-se inteiramente à divulgação das verdades espirituais. Aos 53 anos, partiu para os Estados Unidos, onde proferiu palestras e conquistou plateias impressionadas com sua serenidade e fé. Regressando à Inglaterra, proferiu mais de 150 conferências, sempre sob intensa vibração espiritual.

Conan Doyle, sensibilizado pela penúria em que o amigo vivia, organizou uma campanha beneficente chamada The Vale Owen Fund. O médium, entretanto, não fez uso dos recursos arrecadados, preferindo manter-se fiel à simplicidade evangélica que lhe sustentava a alma.

A saúde debilitou-se nos últimos anos, mas nem a doença lhe silenciou o espírito missionário. Em 9 de março de 1931, George Vale Owen encerrou a sua jornada terrestre, deixando à Humanidade o testemunho de um clérigo que ousou ouvir o Céu — e o registrou com a serenidade dos que sabem que a vida não termina no túmulo, mas apenas muda de morada.

Assim, o reverendo que começou servindo a Deus pelo altar, terminou servindo-o pela mediunidade, mostrando que a revelação divina não cessa apenas se renova nas almas que aprendem a escutar o infinito.