Meu Cavalo Barbicacho Eu sei que muitos... RENATO JAGUARÃO

Meu Cavalo Barbicacho


Eu sei que muitos não entendem
Mas aqui hei de contá-lo
O que faz o gaúcho
Gostar tanto do cavalo

Essas cosa vem de guri
Criado nas camperiada
Arrastando alpargata
Bombachita arremangada

Vem também do ensinamento
Da Mãe e do velho pai
Das cosa da fronteira
Da Argentina, Uruguai

Mas pra mais claro entender
Me busco longe a memória
Pra contar de um cavalo
Que fez parte da minha história


Eu ainda muito cedo
Meu pai ainda em vida
Tinha ofício de peão
Eu acompanhava na lida

Nasceu um dia na estância
Que criamo feito guacho
A mãe parindo morreu
Pus o nome de barbicacho

Onde eu ia me seguia
No rancho, mangueira galpão
E com ele eu me entendia
Ele entendia meu coração

Ja um pouco crecido
Me deixava eu montar
Ia com ele pra escola
Me esperava até eu soltar


E quando voltava pras casa
Nós vinnha cantando facero
Dos amigo que eu tinha
Ele era o primeiro

O tempo foi passando
E nos crescendo na idade
E quanto mais passava o tempo
Mais crecia a amizade

Acabei domando de baixo
Mas tinha que enfrena
Pedi pro peão da estância
Cuida ele pra não judia

Nem bocal precisou
Aceitou o freio solito
Eu fui lidando com ele
Dando função despacito

Meu pai ficou muito enfermo
Se fumo la pra cidade
E meu cavalo ficou
Com ele minha saudade

Depois na faculdade
Fizeram eu estudar
E lembrava do meu cavalo
Que jurava um dia buscar

Voltei ainda umas vezes
Meu amigo visitar
Tinham largado pra várzea
Só de longe pude olhar

Naquele ano meu pai
Que já vinha adoentado
Nao aguentou o tirão
E sei foi pro outro lado

E junto com meus estudo
Eu tive que trabalhar
Pra ajudar nas despesas
E minha mãe sustentar

E o grande dia chegou
Pra vida não ser mais dura
Um doutor veterinário
Era minha formatura

Agora ja formado
Com a profissão eu consigo
Podia cumprir a promessa
De buscar meu velho a amigo

Já tinha tudo ajustado
Até cocheira construi
Só faltava ir buscar
Meu amigo de guri

Levantei naquele dia
Radiante em felicidade
E disse pra minha mãe
Vamos buscar ele pra cidade.

Chegamo na velha estância
Onde meu pai fora peão
E vi minha mãe chorando
De tanta recordação

Pedi licença na entrada
Pra falar com o capataz
De pronto nos recebeu
Podem entrar no más

Depois de um dedo de proza
Falei da minha razão
De voltar na velha estância
Entrar naquele galpão

Eu vim buscar meu cavalo
Meu amigo nunca esqueçi
E hoje ele vai comigo
Conforme eu prometi

O capataz me olhou
Mirando meio de baixo
Eu de pronto! peça um peão...
Pra trazer o barbicacho

E num instante silente
Me pedindo pra eu sentar
Me perdoe, a fraqueza
Mas não podes mais levar

E sem meio entender
Retruquei inconformado
O cavalo é da minha posse
A mim me foi regalado

Com meu pai ainda em vida
Aqui criei ele guacho
Todos sabem da história
Minha e do barbicacho

E já com os olhos aguado
No meu ombro a mão estendeu
Lamento mas a verdade
O teu cavalo morreu

Mas como, de que maneira?
A mim ninguem avisou
Sabiam que eu voltaria
E nem tanto tempo passou

E o capataz rude homem
Me deu a grande lição
O tempo pra alguns e largo
Pra outros se conta na mão

A saudade, adoece
Quando se tem a distância
O tempo lá da cidade
Não é o mesmo da estância


As vezes do fundo do campo
Ele vinha e relinchava
Depois voltava a passo
E mais um tempo esperava

Até que um dia um peão
Notou que não vinha mais
E foi recorrer o campo
Aos cinco meses atrás

Encontrou ele já triste
Jogado junto ao alambrado
Morreu no outro dia
Na várzea foi enterrado

Num pé de curunilha
Deixamos a marcação
Podes ir até lá
Fazer uma oração

Quem sabe ele aguarda
De ti uma despedida
E te espere mais um pouco
No outro lado da vida



Meu coração se partiu
Sem querer acreditar
Deixei meu maior amigo
Morrer de me esperar

Naquela várzea sem fim
Me ajoelhei no campo largo
Pedi perdão ao amigo
Que até hoje saudade trago


E assim fica explicado
Nessa payada pra contá-lo
Quem é gaúcho entende
A amizade um cavalo.


Renato Jaguarão.