Sobrevivor Resignado Minhas dores,... André Zanata

Sobrevivor Resignado


Minhas dores, outrora, eram donas de mim,
Tempestades noturnas de um fim sem princípio,
Eram versos truncados, amargos, a rimar
Com o silêncio fundo que o peito pode adotar.


Mas a vida, tecelã de destinos sutis,
Com seus fios de prata, cospe e descospe cicatrizes,
E ensinou a esta alma, tão cheia de ardores,
A sábia, quieta arte da resignação das dores.


Não as arranquei com força, nem as joguei ao mar,
— pois o mar um dia as devolveria à areia fria do meu pensar.
Deixei que se finissem, como deixa a árvore a folha:
num lento morrer dourado, que já não pede dó.


Foram-se como a neblina que o sol da manhã consome,
Como notas distantes de uma canção que não se nome.
Já não são ferida aberta, nem punhal, nem espinho,
São apenas lembranças de um antigo caminho.


Hoje, olho para trás e vejo o que ficou:
não a sombra da falta, mas a luz do que curou.
E na paz resignada que a saudade não corrói,
Sou mais forte pelo que deixei de ser, e por aquilo que não sou.


E assim sigo, leve, embora marcado pela sorte,
Com as dores resignadas à sua própria morte.
Elas não ditam mais o rumo, não definem mais o amor,
São apenas o passado… e eu, o sobrevivor.