O Último Grito do Velho Mundo... Evan do carmo

O Último Grito do Velho Mundo
(ensaio lírico-profético)
O mundo não acabou de súbito.
Ele se gastou.
Como um círio queimando por dentro.
Como a esperança que vira cinza
sem ninguém perceber.
Não foi a bomba,
não foi o vírus.
Foi o ego.
Foi a pressa.
Foi a mentira repetida até virar fé.
As nações marcharam para o abismo
de olhos bem abertos.
Brindaram com vinho podre
à vitória de um rei sem rosto,
de um deus sem alma,
de um futuro sem ternura.
O homem construiu muralhas,
mas esqueceu a casa.
Construiu máquinas,
mas esqueceu os filhos.
Construiu impérios,
mas esqueceu a si mesmo.
O céu chorou.
Mas ninguém levantou os olhos.
Estavam ocupados demais
com as telas.
Com as senhas.
Com os ídolos de carne e marketing.
Veio o colapso.
Mas não foi tragédia —
foi revelação.
A Terra cuspiu os venenos.
O mar devolveu os corpos.
As árvores negaram seus frutos.
E mesmo assim,
houve quem risse.
Houve quem vendesse ingresso
para assistir ao fim.
O último grito não foi de dor.
Foi de desespero.
Foi de quem percebeu tarde demais
que já não sabia amar.
Que já não sabia parar.
Mas —
no ventre da escuridão,
um resto de luz ainda tremia.
Era uma criança.
Era uma canção.
Era uma palavra esquecida
na boca dos justos.
Aqueles que não negaram o coração,
aqueles que enterraram os seus mortos com lágrimas,
aqueles que ouviram a dor do outro
como quem ouve a própria mãe.
Esses não morreram.
Dormiram.
E o paraíso,
em segredo,
começou a sonhar com eles.