⁠Essa merda de sentir... Sentir o que... Li Azevedo

⁠Essa merda de sentir...

Sentir o que os meus olhos veem e o que não veem

O que minhas mãos tocam ou não

O que meu olfato fareja com ou sem máscaras

O que meus ouvidos ouvem e até o que nunca disseram

O que a mim compete

O que a mim não deveria interessar

O que a mim compelem

O que a mim nem chega.

Essa merda de sentir...

Sentir a solidão das massas, a morte de um desconhecido entre milhares, a milhares de quilômetros de mim

Sentir a indecência de quem não se importa sequer com o possível perigo aos teus

Sentir medo pelo próprio País

Sentir medo para além de todas as fronteiras, imagináveis ou não

Que merda é essa de só sentir a impotência de sentir, sentir, sentir?

Que porra é essa de sentir tudo ao extremo assim?

Que porra é essa de ter fugido da insensibilidade para depois ser outra vez a esponja de não só o que me fazia insensível, como se um castigo fosse?

Se bem que justiça seja feita, pra quem já não andava a sentir quase nada, talvez essa tenha sido a forma como a vida encontrou para dizer-me mais uma vez que o controle nunca esteve em minhas mãos.

Mas estás a pegar pesado demais, vida!

Ah se estás!

Estás a matar rápido demais, corona vírus, inclusive a esperança!

Estás, estás...