Raiz Uma semente feia, pútrida,... Remisson Aniceto

Raiz

Uma semente feia, pútrida, corroída, perdida, era levada pelo vento.
Quis o destino que ela caísse em um belo jardim, que assim era porque nele crescia
e reinava vigorosamente a mais linda de todas as flores.
E a sorte sorriu para aquela semente, quando a mais bela de todas as flores,
não se sabe por qual razão —compaixão, talvez — vendo-a fria, fétida e moribunda,
a cobrisse com suas pétalas, grudando-a no seu caule, envolvendo-a
carinhosamente em suas verdes folhas e seus ramos.
Por dezenas de anos a flor dedicou-se àquela semente, dividiu com ela a sua seiva,
protegendo-a, tentando restaurá-la e devolver-lhe a vida.
A mais bela de todas as flores entregou-de de tal forma àquela semente
que esqueceu-se completamente de si. Doou-lhe seu perfume, seu calor,
sua beleza, sua alegria, sua juventude. Mas a semente, conquanto anos a fio
se mostrasse flor sadia por fora, escondia suas raízes sob a terra.
Não sabia o que era gratidão e não soube retribuir tanta dedicação.
Jogada semimorta e por engano do vento naquele jardim, incapaz de aceitar ajuda,
permaneceu podre por dezenas de anos, contaminando
a mais bela flor e todas as outras flores ao seu redor.