Crônicas de Uma Guarita. Jamais... Ione Morais

Crônicas de Uma Guarita.
Jamais escreveria isso se não tivesse uma certa habilidade com as palavras. . O escritor é por natureza criativa, um observador nato e consegue transformar um simples gesto em uma narrativa interessante . O escritor consegue fazer um ode à vida ou à morte, onde quer que ela se encontre. Ser escritor é poder brincar com o cotidiano sem no entanto, ser julgado por isso.
Remeto-me ao título para começar a contar o que vivi hoje. A guarita ou ponto de ônibus, nos parece um tanto quanto desconfortável, mas também pode ser palco de breves acontecimentos pra lá de inusitados. E onde está a graça da vida se não fosse esses pequenos acontecimentos, e de certa forma ate inocentes, dependendo da mente que o abstrai.
Bom, hoje sentei-me no banco da guarita para esperar o ônibus que me traria de volta para casa. Confesso que estava um pouco descontente, pois o dia não tinha sido de tudo maravilhoso. Lembrei-me da barrinha de cereal que eu trazia na bolsa e pus-me a comê-la, quando um ônibus para à minha frente. Um senhor, acredito que, deveria ter uns setenta anos mais ou menos, me observava fixamente. Tentei disfarçar, mas meus olhos sempre cruzavam com os dele.
Segundo Laura Moss, do Portal Mother Nature Network, o nosso cérebro está programado para registrar “pistas” presentes no ambiente e nos alertar caso alguém esteja olhando para nós. Isso faz parte do nosso instinto de sobrevivência e, conforme explicou, muitos mamíferos contam com um sistema parecido, que os avisa quando outro animal — um potencial predador — está por perto e à espreita.
Predador ou não, ele acenou para mim e soprou-me um "big sexy kiss", antes de partir. O meu instinto de sobrevivência naquele instante era desvencilhar-me de mim mesma. E numa gargalhada só, pude perceber que os traços delineantes da vida são mais puros do que se supõe.