Existem momentos na jornada nos quais... Bruna Viana

Existem momentos na jornada nos quais não há o que possa ser feito. Há momentos em que você precisa se render para o fluxo, porque por mais que haja um eu controlador em pânico, completamente desesperado dentro de você, ele não pode fazer mais absolutamente nada. Esse momento chega exatamente quando você é iluminado pela sagrada compreensão, a ponto de perceber a estupidez que é forçar para que as coisas aconteçam de um jeito diferente do que a vida está querendo te oferecer; quando você percebe a estupidez que é tentar ir contra o fluxo da vida. Esse momento não é tão simples, porque implica em profundo relaxamento e em uma profunda confiança, de que está tudo absolutamente certo em você se entregar para o fluxo.

O que normalmente te impede de fazer essa entrega são as vozes desses ‘eus’ que você mencionou: o “eu injustiçado” e o “eu submisso” que alternadamente ocupam o trono da consciência. Esses são aspectos do “eu controlador”. Abaixo desses ’eus’ existe um medo do desconhecido, e é muito comum também que haja ódio na forma de pactos de vingança. Tudo isso é permeado por crenças que fazem com que você fique preso em uma posição, em um ponto de vista a respeito de como as coisas devem ser. Uma dessas crenças é justamente a ideia de que você está sendo injustiçado.

Esse “eu injustiçado” lhe conta uma história de que você está sendo injustiçado, e aí você quer fazer justiça com as próprias mãos. Isso tudo nasce do seu isolamento, você separado do todo e, consequentemente, não podendo perceber a guiança divina, que, às vezes, se vale da injustiça humana para realizar a justiça máxima. Aos olhos humanos não é permitido ver claramente todo o setting do jogo, mas até onde você consegue ver, já é possível identificar alguns ‘eus’ em você que estão comprometidos com a guerra e a competição para, com isso, agregar valor a uma ideia de eu; para ter reconhecimento, acreditando que assim você está ocupando o seu lugar. Mas, desse lugar onde você se encontra isolado, separado e competindo, dificilmente você consegue realmente saber qual é o seu lugar no mundo. Eu estou lhe convidando a renunciar a esse eu competidor, a renunciar a esse “eu fazedor”, porque esse fazer está a serviço dessa competição, esse fazer só te aprisiona cada vez mais nas teias do mau karma.

Existe um karma que te liberta e um que te aprisiona. O karma que te aprisiona, é esse fazer de caráter egoísta: você faz para si mesmo, com a intenção de provar alguma coisa para alguém. E isso é absolutamente natural, até um determinado estágio da evolução da consciência. Você tem que ter um ego para poder abrir mão dele, mas chega o momento em que você amadurece o suficiente, a ponto de compreender esse jogo, e a ponto de perceber que existe um karma que te liberta.

Essa ação é uma “não ação”, porque o fazer desinteressado é uma “não ação”. Compreenda o paradoxo. Às vezes, para facilitar o entendimento desse tópico, eu chamo esse fazer compulsivo de “reação”. E o fazer que acontece quando você é canal do amor, para a realização de algo, eu chamo de “ação”. A ação é o amor em movimento, pois é desprovida de interesses pessoais.

Em algum momento isso chega para você. Em algum momento a renúncia da guerra te visita. Até porque, é uma grande ilusão você acreditar que pode fazer justiça com suas próprias mãos. Como você pode saber o que é certo e o que é errado? Você sabe o que Deus quer de você? O que ele tem para você? Quando começa a achar que você sabe muito; começa a ficar muito preso à ideia de que sabe o que Deus quer de você... Fique atento à possibilidade de você estar equivocado, porque a jornada em si é um mistério.

A jornada é construída a cada instante. Estamos sendo constantemente convidados a descobrir a sabedoria da incerteza. E nessa rendição para o fluxo, você só pode se valer da sincronicidade, que são as coincidências misteriosas que surgem em sua vida; dos sinais que chegam para você, e que, às vezes, vem até de uma forma que lhe parece injusta. Isso em todos os momentos da jornada. Injustiças sempre existiram neste mundo, e sempre existirão. O karma cuida disso. Mas, você precisa confiar que Deus está cuidando, e passar a cuidar somente daquilo que lhe cabe. Tudo aquilo que você não consegue compreender, você entrega. Deixe o rio te levar.

Então, o que eu tenho que fazer? Não se opor ao fluxo e renunciar a esse eu competidor. Porque se já compreendeu aonde ele te leva, facilmente você consegue visualizar os desdobramentos dessa disputa. E vale a pena? Vale a pena você se desgastar e desperdiçar o seu tempo para ocupar um lugar? E depois que você ocupar esse lugar, o que acontece? Se ele não lhe foi dado, você teve que lutar por ele, você vai se satisfazer?

A mesma coisa em um relacionamento afetivo: você força o outro a te amar, e o outro não quer te amar - mas você força tanto que acaba vindo alguma coisa em sua direção; e quando vem, você se desinteressa, porque não foi espontâneo, e o amor que te satisfaz é aquele amor que vem espontaneamente.

Assim, você precisa realmente confiar na justiça divina. Se você está sentindo de abrir mão desse trabalho; se está claro que, no mais profundo, você está abrindo mão da competição e da submissão, então você está no caminho do coração. Para onde você vai e o que vai fazer não é o mais importante. Nesse momento o mais importante é você renunciar a guerra e a competição; renunciar essa necessidade de ter que provar alguma coisa para o outro. E aí então, abrir-se para o Mistério.

Se Deus é o seu melhor amigo, com certeza ele vai te levar para um lugar melhor. Ele vai te ajudar a encontrar o próximo elo na cadeia da evolução. Existe um ditado no Brasil que diz que “há males que vêm para o bem”. Então, às vezes, para poder realmente abrir novas etapas de crescimento, de libertação, faz-se necessário precipitar mesmo um conflito, justamente para você enxergar essas partes de você que estão de alguma forma resistindo ao fluxo.

Sempre que, em uma determinada área da sua vida, você se percebe controlando, volte sua atenção para dentro para identificar o medo e o ódio; identificar esse desejo de fazer justiça com suas próprias mãos que, às vezes, se manifesta na necessidade de dirigir o carro, ou seja, você é quem precisa dirigir; você não pode viajar relaxado como um passageiro. Se é a natureza inferior agindo, você terá que assumir o volante, mas se é Deus quem está dirigindo o carro, ele está querendo te levar para uma direção diferente, para que você possa conhecer novas paisagens. Então, verifique esses eus que querem ir para outra direção, por medo, por necessidade de justiça, para competir ou para qualquer outra coisa.

Quando você está parado em um ponto controlando, existe a atuação de uma força, de um poder, chamado “obstinação”. A obstinação é o poder da vontade usado de forma distorcida; é o poder da vontade usado pelo medo e pelo ódio. Então, existe uma insistência em fazer valer aquilo que o ego determina: o “eu” e o “meu”. Mas o “eu” e o “meu” sempre vão ampliar os muros da separação. O “eu” e o “meu” estão sempre gerando desunião, para poder fortalecer cada vez mais essa ideia de eu. Isso é um círculo vicioso, então eu lhe convido a relaxar e a se entregar para a guiança do grande Mistério. Talvez você tenha uma bela surpresa.