Fernando Pessoa Desistir
Estou apenas enterrando as impurezas e toxinas da minha vida e deixando brotar uma bela e frutífera árvore. E que seja doce.
Só que chega um ponto que a gente cansa, que não quer mais saber de aventuras ou de procuras, entende?
Pensando bem, acho que o problema está em você que vê todo o meu sacrifício pra estar contigo e mesmo assim vive fugindo de mim.
Incrível como algumas coisas deixam marcas, e até parece que foram marcadas à ferro, porque você ainda as sente.
Acho que quem está de fora não pode condenar, condenar simplesmente é desprezível — é preciso compreender.
Os homens precisam da ilusão do amor da mesma forma como precisam da ilusão de Deus. Da ilusão do amor para não afundarem no poço horrível da solidão absoluta; da ilusão de Deus para não se perderem no caos da desordem sem nexo.
O que quero dizer é justamente o que estou dizendo. Não estou com pena de mim. Está tudo bem. Tenho tomado banho, cortado as unhas, escovado os dentes, bebido leite. Meu coração continua batendo - taquicárdico, como sempre. Dá licença, Bob Dylan: it’s all right man, I’m just bleeding. Tá limpo. Sem ironias. Sem engano. Amanhã, depois, acontece de novo, não fecho nada, não fechamos nada, continuamos vivos e atrás da felicidade, a próxima vez vai ser ainda quem sabe mais celestial que desta, mais infernal também, pode ser, deixa pintar.
Então, o que devo fazer é esperar. Sem desespero, sem melodrama, sem niilismo - esperar. Mas até quando, meu Deus, até quando?
