Coleção pessoal de PensadorRS

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Quando ela entrou no rock bar

Quando ela entrou no rock bar
Eu estava olhando pela janela
Meia-noite e quinze de sábado
Acreditei numa vida mais bela

Todas as ações espalhafatosas
Ao menos refletiam a verdade
Cabeça no lugar não foi o forte
Mas confie: não faltou vontade

É fácil perceber interesse real
Ainda tenho alma e me dedico
Nada espero ganhar em troca
De afeições puras não abdico

Não importa o que pensarão
Jogados num mundo carente
Homens e mulheres imóveis
Gente sem coração de gente

Sim, eu faria tudo outra vez
Devoto das causas perdidas
Um cara estranho a olho nu
Entre as chegadas e partidas

Quando ela entrou no rock bar
Eu estava saltando de alegria
Sem tempo para ver o relógio
Apaixonado por uma melodia.

Ninguém é tão sofisticado que possa abrir mão de precisar suprir necessidades básicas.

Data marcada

Duas semanas na expectativa
Para na hora nada acontecer
Não diga que não foi avisado
Seu problema passa por crer

Só água gelada no chuveiro
Lá fora há chuva e decepção
Bem-vindo à árdua realidade
Mais uma fantasia foi em vão

Deve ser por isso que rasga
Tal como um canivete suíço
Dia a dia sem ter confiança
E sendo visto como omisso

Levante para cair novamente
Tenha fé, mas se arrependa
Faça planos e logo esqueça
Ateie fogo na pútrida agenda

Sem esperança no momento
Um horizonte de zero queixa
Precisa haver algum controle
Só que a ambição não deixa.

Quem possui grandeza a conserva em um episódio de humilhação, assim como o mesquinho continua pequeno em um instante de glória.

Não tenho nada contra ninguém, porém com frequência o melhor momento do dia para mim é quando estou sozinho com um livro em mãos.

Ao contrário do que se habituou a pensar, ser criticado por uns é honroso e receber elogios de outros pode soar mal.

Semideuses

Me apresentem aos desafortunados
Alguém que tem metade dos dentes
Uma mulher que foi traída há pouco
Eu quero conhecer os descontentes

Nada contra a gente bem-resolvida
Mas vida monótona chega a minha
Faz tempo que tudo está em ordem
Preciso colher alguma erva daninha

Todo mundo é um enorme sucesso
Só convivo com homens confiantes
Todas as meninas parecem misses
Onde foram parar os seres errantes?

Amanhã o esgoto terá um bom odor
Não haverá mais sangue a derramar
Só restaurante com comida saudável
Mundo muito correto para se habitar

Não passo por nenhum ser humano
Partilho a calçada com semideuses
E somos incrivelmente semelhantes
Ainda germinam gêmeos siameses

Me olho no espelho e nada enxergo
Minha voz parece ecoar para dentro
Talvez eu esteja em outra dimensão
Porque tentei demais ficar no centro.

Sequer mencionar o nome de alguém: uma forma mais sutil de desprezo, mas não menos cruel.

Guru inventado

Todos precisam acreditar em algo
Salvação, capitalismo, celebridade
Peixe à venda por tempo reduzido
O prefeito se reelegendo na cidade

Faça uma prece, se conecte a Tudo
Confie em mim: você é importante
Me empreste a sua conta bancária
Prometo que será por um instante

Você veio ao planeta para triunfar
De acordo com o comercial da TV
Prepare a roupa e alguns sorrisos
Há muita gente querendo lhe ver

Não esqueça de esquecer o Nada
Filosofia nessas horas embaralha
Você é sedutor, é ótimo, é eterno
Sobra espaço para outro canalha

Sua foto já desponta na imprensa
Seu nome, na lista de convidados
Apenas seguindo o passo a passo
Você é o líder de costumes falsos.

Nenhum sentimento une de maneira tão autêntica as pessoas como a tristeza.

Para considerar o ser humano essencialmente bom, basta que você seja estupidamente ingênuo ou suficientemente burro.

Se a vida está repleta de ilusões que nos chegam através dos sentidos, ficarmos inebriados é pré-requisito para sermos considerados sãos.

Boas ações

Deixa eu fingir que me importo
Com a ação que subiu neste dia
Com as lamentações do padeiro
Deixa, é questão de ter simpatia

Vou levar a sério todo o diálogo
Só pra ver até onde pode chegar
Se der problema, a gente resolve
A vadiagem não autoriza a parar

Vou estar com um cara supimpa
Que se convenceu de que é o rei
Ele contará seus feitos incríveis
E eu, como se imagina, fingirei

Uma zombaria sutil e divertida
Na palhaçada que é ter vínculo
Suportando horas prolongadas
Com qualquer vivente ridículo

Sou protagonista de boas ações
Ajudo um desesperado por mês
Em nome do marketing pessoal
É hora de atender outro freguês.

Todas as grandes invenções foram geradas por indivíduos que estavam, de alguma forma, descontentes. Sorria com moderação.

Quase do lado de lá

Sua derrocada é brindada com espumante
Tem amigas que na verdade detestam ela
Uns chamam de má sorte, outros se calam
Quanta inveja atrai uma moça que é bela!

Antidepressivos são sua nova companhia
Flerta com a insanidade toda santa noite
Não sabe se viverá noventa dias ou anos
Um diabo imaginário a esfola com açoite

Muitos a veem como dama bem-sucedida
Possui carro importado, casa aqui e acolá
Esses compram o livro, contudo não leem
Senão saberiam como ela realmente está

O desespero tomou conta da cabeça dela
Tudo o que visualiza tem dor e escuridão
Sua voz agrega ao coro dos desgraçados
Procura no limbo alguém para dar a mão.

A certeza de que todos irão morrer pode conferir a almas atormentadas uma paz libertadora.

Profundamente comum

Levanto, porém não dormi
Meus pesadelos cochilam
Tomo um cafezinho preto
Imagens me sensibilizam

Ando só no ônibus lotado
Canto no silêncio tão alto
Inúmeras caras e roupas
À espera do próximo ato

Chego ao edifício, entro
Estou preso no elevador
Mais uma porta fechada
Ou a chance de ser ator

Cada um tem sua rotina
Ganhos, perdas normais
Seria o paraíso a Terra?
Céu eu creio que jamais

Ando, corro, paro e volto
Entretenimento vale tudo
Esqueço, então, de mim
Contemplando o absurdo

Até que ponto se é feliz?
Há quem vibre na sexta
Sorrio e choro neste dia
Sou homem, logo besta.

Socialismo e democracia não combinam e nunca coexistiram. Qualquer projeto a abordar ambos em conjunto é uma utopia.

Ao natural

Se desse pra te tirar da memória
Eu já teria te deletado do sistema
Só que eu lembro de quase tudo
E estou com um baita problema

Na areia da praia ou na calçada
A saudade leva o mesmo nome
Até no lado de lá deste planeta
Não há outra a quem eu chame

Política, economia e sociedade
Fico atento às novidades todas
Mas sem nenhuma notícia tua
De Dubai, as experiências boas

Sinto em segredo, sei esconder
Falar sobre tudo sem me expor
Evocando os teus olhos verdes
Crise fiscal só me causa torpor

Foi um prazer ter te conhecido
Na contramão da miopia geral
Uma observação atenta saberia
Que só por ti escrevo ao natural.

Admirei uma obra de arte hoje. Ela era loira, de estatura média, vestia preto e usava batom vermelho. Não está à venda.