Coleção pessoal de EvertonThoughts

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SENTIMENTO OSCILATÓRIO

O sentimento é oscilatório
deveras mutante
fúlgido que cega
por vezes dissonante
mas nunca peremptório

É onda que não traz brisa
da qual pouco se aproveita
Pérfido vai e vem
embaralha a mente estreita
e nela catalisa

É volúvel, mas não volátil
Sucumbe, posto que frágil
Exorta o que não presta
Não importa se molesta
E faz de nós
algozes de nós mesmos

MORTE VULGAR

se a morte quiser me achar
que seja numa mesa de bar
muito perto do mar
em noite de luar
comendo caviar
e bebendo até vomitar
pois nesse lugar,
morte vulgar,
eu nunca estarei

REFLEXO

eu sou aquilo que vivo
reflexo daquilo que sofro
e daquilo que sinto
mas não vivo o que sofro
nem vivo o que sinto

POEMA SAR(CÁUSTICO)

ah, essa vida
bandida confusa
matreira e atrevida
quase sempre obtusa

me joga num vaso
daqueles sem flores
e revela o descaso
imerso em odores

sem terra, nem chão
afundo em meu mundo
sugado no vão
do seguinte segundo

eis a descarga
que a vida me deu
tão triste e amarga
assim me fo…

BARULHO

no silêncio, e apenas nele
eu ouço um barulho
o ruído suave e contínuo
da vida que não silencia

MINHA VIDA

que a sua ausência
nunca me visite
e que passe longe
longe do meu mundo

que a sua presença
seja minha amiga
e assim nunca duvide
que você é minha vida

LUZ PROFUSA

o brilho se destaca
quando o restante
é luz difusa
errante
opaca
e naquele instante
a luz profusa
faz-se exuberante

FOLHA

ser tão alvo
ávido por ser acertado
pela caneta ou pelo teclado
escrito ou digitado
impregnado ou pixelado

a branca folha
quer o branco extinto
pela tinta que almeja
mas que não seja pelo todo
pois o todo não comunica

a clara folha
não quer o vazio sem tinta
quer a mácula distinta
a tinta indiscreta
a presença concreta
que tinge e não pinta
pois finge ser cor
ainda que não seja
onde esteja... e aonde for

VENTO

eu vi um violento vento
que no último lamento
mostrou o seu tormento
destruiu neste momento
madeira, ferro e cimento
antes forte, agora lento
já não é mais turbulento
dissipou-se o forte vento
foi, e passou a ser alento

ENFIM NÓS

neste pouco tempo
nesta pouca vida
agora a contemplo
agora me convida

aqui nos encontramos
meu obscuro pranto
neste escuro quarto
neste pobre canto

sobre o cobre leito
ela me descobre
e leva do meu peito
a vida de um pobre

GIRASSÓIS

neste mar de girassóis
eu corro e rodopio
por este todo amarelo
tanto giro e tanto rodo
que de tanto tonto
caio e letargio
desmaio em arrepio

NÁUFRAGO
(Poema a 44 mãos)

Itinerante, percorro o mundo.
Mundo mundo vasto mundo. (Carlos Drummond)
Absorvido, dou-me ao trabalho,
contam comigo, não falho. (Millôr Fernandes)
Em breve, vou partir. Mas, neste momento,
de tudo ao meu amor serei atento. (Vinícius de Moraes)
A próxima e longa jornada está para acontecer.
Uma ânsia de estar e de temer. (José Saramago)
O avião decola. No Pacífico, cai de repente.
Inteiro se desata à minha frente. (Carlos Drummond)
Único sobrevivente, chego à praia de claras areias.
Com suas poucas palmeiras, (Castro Alves)
percebo-me só, nesta falsa miragem.
Meu Deus, me dê a coragem. (Clarice Lispector)
Não sei o que faço, se fico,
se desmorono ou se edifico. (Cecília Meireles)
Tudo parece um sonho, em demasia.
Passou-me essa fantasia. (Machado de Assis)
Tenho, ainda, na vida que mareia,
perguntas que insistiam na areia. (Pablo Neruda)
Sem ninguém para aqui amar,
tomarei banhos de mar. (Manuel Bandeira)
Quando tento o fogo, vem o corte, a dor.
Eu sou apenas um pobre amador. (Tom Jobim)
Na ira e na dor, enlouqueço e tudo sai voando.
Almas estão no peito trespassando. (Luís de Camões)
Agora calmo, pego a bola e penso: que assim seja,
a mão que afaga é a mesma que apedreja. (Augusto dos Anjos)
Preciso de um amigo a meu lado.
Não me basta saber que sou amado. (Olavo Bilac)
Penso na minha vida, na minha história,
porque a minha pátria é a minha memória. (Guimarães Rosa)
Escrevo em Wilson o que quero transcrito,
ou aquilo que quer ser escrito? (Sandra Boveto)
Perceba, meu amigo resiliente,
é solitário andar por entre a gente! (Luís de Camões)
Entre tantas dores, traz um sofrido dente
a dor que deveras sente. (Fernando Pessoa)
O tempo passa, e aprendo com muita sobra:
sofrer vai ser a minha última obra. (Paulo Leminski)
O presente é aqui, agora ao meu lado.
Nunca o presente é passado. (Machado de Assis)
Sozinho por anos, vivi bem, vivi são.
Tudo é vaidade neste mundo vão. (Florbela Espanca)
Mas chega. Quero voltar à minha vida
numa fuga para o ponto de partida. (José Saramago)
Pego a frágil jangada e sigo sem norte.
Tudo vem, tudo vai, do mundo é a sorte. (Alphonsus de Guimaraens)
Nas águas, Wilson cai e se vai na incerteza.
Uma névoa de sentimentos de tristeza. (Fernando Pessoa)
E penso: essa bola foi amiga inestimável,
foi tua companheira inseparável. (Augusto dos Anjos)
Ainda que não viva, o que não quero, deixei a masmorra.
Não permita Deus que eu morra, (Gonçalves Dias)
sem que volte para casa.

PARA ALÉM

depois que nós morrermos
dizem pobres, ricos e enfermos
ainda viveremos
uma incrível eterna idade

para além da dor e da saudade
uma vida de longa amenidade
e se isso é a tal verdade
nunca nesta vida saberemos

MÃO

a mão que gentilmente afaga
é também aquela que esmaga
a que cura a triste chaga
a que o fraco embriaga
a que salva, se não naufraga
a que crava a afiada adaga
mas nunca aquela que apaga
pois, o que pela mão está feito
não há saga que desfaça, ou dê jeito

UMA AUTOANÁLISE PSEUDOPOÉTICA

é de se concluir, pseudopoeta
que és um ignorante convincente
és iniciante numa arte em ti inexistente
o sonho diletante é de ti assim distante
no importante divagar, és inteiro devagar
e, de tanta divagação, vago sempre estás
não dominas a arte que te abomina
quando esvai por entre toscos dedos
os segredos da alma feminina

FEBRE

A febre é insana
esquenta e apoquenta
necessária e mundana
na pela vermelha
a febre é amarela
não é a primeira
tampouco a segunda
terçã talvez seja
mas de tanto sofrer
enfim me dou conta
no fim destas contas
que a febre tifóide

ONE SMALL STEP FOR MAN

uma bota e a notável marca
marca fundo a humanidade
pr'além deste pequeno mundo
pra outra realidade
pisa em solo macio cinzento
e aprofunda o conhecimento
no silêncio de tal momento
nasce um grande sentimento

ao vento que não existe
deixa sulcos na história
mas a glória é questionada
e faz do grande um grande nada
ao descrente da vitória
a conquista é ilusória
e a chegada daquele homem
é como história de lobisomem

VERSOS DE FIDELIDADE

Atento, ao meu amor estarei presente
Agora e sempre, e assim, com todo zelo
Enquanto em face deste grande encanto
Que meu pensamento tanto se encante

(COM)FUSÃO DE POETAS

chutei uma pedra no meio do caminho
e senti a dor que deveras nunca senti
não sei se cato a pedra, fico e edifico
ou se vou-me embora pra Pasárgada
mas aceitarei a lama que me espera
pois minha solidão, amiga inseparável
será minha última quimera, a tal fera

CONCRETO

sinto na pele
o toque
frio
tenaz
concreto
meu corpo sucumbe
mas não o coração, que sem noção insiste
tampouco a mente, que brava mente resiste
na sensação de um tempo estagnado
não mais suporto esta pressão
que só aumenta e atormenta
tempo, por que não passa?
venha logo e me leve deste inferno
por que esta eternidade?
será esta sua última maldade?
ah, não mais importa
pois agora eu realizo
meu iminente e certo fim
neste eminente instante
que, de agora em diante, será eterno, constante
minha mente inebria-se
e se entrega ao coração
que pulsa lentamente
e mantém a mente tão lenta quanto vazia
solto meu último suspiro
e, assim, não mais respiro
esmagado, morro sozinho
sob o peso do concreto
quisera eu não houvesse peso
quisera eu fosse abstrato