Victor Motta

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Respostas

Por que buscar a lucidez
Fria e linear do raciocínio puro?
Haverá lucidez na brisa que sopra
E castiga meu corpo cansado?
E, por que foste, assim como a brisa,
Me fustigar, morna e terna,
A esperança de meus sonhos?
Por que ser lúcido se a lucidez
Está em tudo que nos cerca?
No vento,nas árvores, no sol
Que desce agora atrás da linha
Do horizonte que nos separa.
Quero ficar assim, embriagado
Na sensação de estar contigo,
Nos caminhos que nunca percorri.
Olhar com teus olhos e ver dentro
Dos meus as mesmas paisagens
Que jamais notei ou senti.
Percorrer com teus sentidos
Toda a certeza da felicidade.
Pela primeira vez me reconheço
Tranquilo, a olhar em frente
O caminho aberto para a vida.
Todos os fantasmas que criei
E me atormentavam nas sombras
Não mais habitam meus castelos.
Como te dizer tudo isso?
Como te conduzir pela mão
E por ti ser conduzido?
Como reacender das cinzas
Tudo o que deixei apagar?
Nessa busca, agora eu sei,
Que só em ti está minha resposta.

Dúvidas

Que valemos nós
Em termos do absoluto
Ou mesmo do relativo?
Que valemos nós
Para nós mesmos
E para os outros?
Que papéis representamos
Na vertigem de rostos,
Anônimos e frios,
Que se cruzam
Em paralelas
Pelas ruas
Das grandes cidades?
Como caminhar sozinhos
Em mil encontros?
Como encontrar
Sem nos conhecermos?
Por que multiplicar temores
Somando mágoas,
Sem dividir ternuras?
Qual a resultante
Das forças solitárias?
Onde estará o foco
Das lentes divergentes
Que não nos vêem?
Como medir o calor
Que se trocou em vão?
Quando se encherá de afeto
O coração que sangra?
Quando se cruzarão
Os caminhos opostos?
Dúvidas,
Dúvidas que me acompanham
Por longos anos de procura
Sem respostas!

A dor do poeta

O poeta é triste
por natureza,
mas na poesia
encontra o conforto
como o navio que
chega ao porto
levado ao sabor
da correnteza.
E se da vida
sente a tristeza
de um amor que
já está morto,
cultiva a flor
de um mais belo horto
onde a poesia reina
com beleza.
Encontra a vida
na bela forma
da rima fértil
do verso apaixonado
e, com a tristeza da vida
se conforma.
Não sente mais
o fel de seu passado
até que a vida
de novo o transforma
num homem só
amargurado…

Real maravilhoso!

Nossa vida flutuando em dois espaços,
um real – outro fantástico imaginário,
e nesse encontro do real maravilhoso
ficamos presos, partidos aos pedaços
estando em um, desejando o outro.
Vivemos então o momento majestoso,
onde tudo é possível na fantasia criada,
e no equilíbrio dessa realidade virtual,
encontramos a felicidade imaginada
para amenizar a solidão do ser
esmagado na realidade do viver
buscando no fantástico irreal
as ilusões passadas e perdidas.

Dia da Criança

Luzes nas ruas, risos, cores,
brilho das vitrines em festa.
Um carro, vestido novo, um trem.
Gente que passa e não presta
atenção nos que ficam à margem
do encanto das luzes,
no espanto do menino
que erra sozinho,
perdido na cidade.
Que fere, maltrata
e destrói com maldade
os sonhos de criança.
Que rouba no berço
o carinho da mãe,
que cedo levanta
e tanto trabalha,
escrava submissa
do asfalto,
alheio e sem dó
de seu filho, tão triste
e tão só.
Com sua vozinha, fraca
e cansada,
fica nas ruas perdido
a pedir por presente
apenas um dia só seu;
pois não sabe, afinal, distinguir,
como alguém, que com fome
cresceu,
nos anúncios das lojas
que gritam e proclamam
que ele também é criança
e esse dia é o seu.

Noite de um inverno

De repente, sinto que estou triste.
Triste pelo que sou,
Triste por tudo que não fui.
Mas, não me aborrece
Essa tristeza ,que vem
E que flui através
Do cinza-azulado da fumaça
Do cigarro, projetada no teto
Mal pintado de meu quarto.
O silêncio amigo que habita
Meu apartamento
Divide comigo o frio da noite,
Que também se vai.
Penso em voltar, penso em partir,
Em estar contigo,
Em dividir essa tristeza
A dois…
Que grita dentro de mim,
Dentro do quarto quieto,
Frio, de ar viciado
De teto mal pintado.
Vejo as marcas incertas
Do pincel,
Como a arranharem
Também dentro de mim
A saudade do que era
E a ansiedade do que será.
Fecho os olhos,
Molhados
E penso num poema que faria,
Se meus olhos molhados
Não estivessem cansados,
Fechados,
Tentando esquecer
Essa tristeza….

Ilusões

No silêncio da noite, sonho;
Cenas, fatos, pessoas, momentos.
Um passado distante, presente,
Ainda,
Me conduz em turbilhão;
Tristonho,
Recrio felicidades e histórias,
No inusitado da imaginação.
Busco em cantos de saudade
Trazer ao cotidiano
De agora
As alegrias vividas a dois .
O que era, perdeu-se,
Partidos cristais.
O que foi, são sensações,
Nada mais.
Os novos caminhos percorridos
Não serão os mesmos de outrora,
Jamais.
Resta-me então reviver,
No imaginário, as fortes emoções
Do passado, num canto qualquer,
Numa dobra escondida
Da memória.

Por quê?

De repente o vazio
Traz o som do nada,
E no silêncio que crio
Vem a ausência de tudo.
Parado, incrédulo, mudo
Não quero sentir a falta
Que cresce no corpo
E na alma, e maltrata
O coração vacilante
Com as incertezas
De amante,
De tristezas.
Por que ir adiante
Na ilusão fugaz
Do amor vivido?
O amargor que vem à boca
É a perda sentida,
E lívido
Busco compreender o partir
Sem adeus, sem porquê.

Dentro de mim

Águas azuis que inspiram
Sorrisos, brilhos, sensações.
Brisa morna, carícias, desejos;
Um mergulho, encontro, êxtase.
Corpos que se unem,
Lábios que se tocam,
Suaves, ternos, quentes, mansos.
Vibrações intensas, espasmos, gozos.
Mentes serenas, relaxadas, entregues.
São curas de mágoas passadas,
São delírios, são remansos,
São recatos, explosões,
São dores, somos nós.

REFLEXÕES DE UM ADEUS

Agora, sentado,
ouvindo apenas o ruído do silêncio,
parado,
eu penso em nós.
Vem vindo do fundo, gritante,
alarmante,
a ansiedade do tempo passado
preenchendo do nada
o vazio de dois mundos.
Somos duas pontas de flexas,
disparadas do infinito,
que não se encontrarão.
Um grito de alarme
cresce na garganta
e espanta
no vôo, a felicidade
que em vão tenta o pouso
em minha alma angustiada.
Somos dois que
marcham ao longo,
sem cruzamentos,
nem encontros.
Tontos,
procuramos nos dar as mãos
através o nevoeiro do tempo.
Ilusão temerária de sermos um,
quando seremos, eternamente
dois.
Pois,
não percebes?
Teu mundo é formado
de outras cores.
Consulto o silêncio,
tal fora o relógio da vida,
e vejo nos ponteiros
que não se tocam
nossa própria tentativa
do ser uno.
Nessa ilusão míope não vemos
que passamos
um pelo outro,
sem nos tocarmos,
como os ponteiros
que marcam a vida,
perdida.

Errante

Sou como a ave
errante…
sem ninho,
sem morada.
Meu caminho
liga ao nada,
e do distante
venho e vou,
pois sei que sou
errante…
nada tenho,
nada guardo,
nem espero.
Venho e vou…
distante.
Hoje, eu chego,
como cheguei um dia,
igual,
como partirei,
sem mais nada
que a dor gritante
de ir e vir,
errante.

A colheita

Um relâmpago
Azul de ilusão
Riscou, no negro
De um céu de dúvidas,
O branco de seu nome…
Afago
De nuvens,
Carícias,
Derramadas
Em grandes gotas,
Que cresceram
E inundaram a vida.
Onda de ternura
Tão pura
Tão querida!
Mas, quando o sol
Brilhou no horizonte
As águas
Tinham lavado a terra,
E não mais vinham
Do alto rolando,
Os risos das mãos
Que plantaram as sementes
Das juras
Do amor eterno.
E a terra lavada
Secou ao sol,
Partiu-se,
Pedaço por pedaço,
Desfazendo-se
A ilusão engano,
Passo a passo
No caminho
De um outro ano.

Foi assim……ode a meu povo

Foi assim…por mero acaso
que cheguei , certo dia,
à terra de meus pais.
Ainda um menino, pouco sabia
ou um quase nada
sobre os campos distantes
de ventos frios e cortantes
do extremo sul do País.
Essa terra guasca e lindeira
de gente pura e acolhedora
plena de simpatia e lealdade.
Terra de encantos, protetora,
que em realidade era a de todos
meus mais antigos ancestrais.
Rio Grande do Sul, uma nação
orgulhosa de seus feitos e tradições;
uma nação verdadeira,
cuja bandeira, tremulando,
carrega os traços rebeldes
de muitas guerras e peleias
nação com sangue forte nas veias,
curtida no amor à terra e,
a defendê-la fez jorrar esse sangue
por várias gerações.
Menino carioca, da capital
me achando soberano, o tal…
aprendi , muito cedo
a domar o potro da vaidade
e a me entregar de alma,
sangue e corpo
ao minuano campeiro.

Caminhada

Entre palavras,
Murmúrios,
Entre silêncios
E mentiras…
Entre amores, desilusões
E iras…
Segue a vida-busca
A buscar a vida.
Nas ruínas
De antigos castelos,
Derrubados
Ao longo dos caminhos;
Dia-após-dia
Ano-após-ano.
No cerrar do pano
Que marca o fim
De mais um ato,
Sem aplausos,
Sem consagrações,
Sem esperanças.
E eu parto
Mais uma vez,
Com um pouco menos
De mim,
Com um pouco menos
De tudo;
Mudo,
Na correnteza humana,
Insana!
Na força
Que meu corpo arrasta,
O coração dilacera,
Devasta a mente
Na espera
De um outro dia
Igual.
Caravana infernal
De solitários,
Homens-máquinas,
Sem razão,
Sem fim,
A carregar mil cruzes
Sem nexo,
Sob as luzes
Do grande palco.
Mas, eu sigo,
Perplexo,
No andar
Dos que apenas andam,
Sem destino.
E, atrás de mim,
Eu sinto o ranger
De um infinito
Que caminha,
Que ri
E chora.
Mas, eu sei,
Agora
Que já sem rosto
Esse infinito,
Como a própria vida,
Também é morto.

Meu trem

Parte meu trem
Da gare escura,
Pela manhã que não veio,
Ainda.
Do escuro da noite,
Que não finda,
Parte meu trem
Escuro e sujo.
Trem de perfumes
Extravagantes,
Em misturas exóticas
De odores;
Miss dior, num certo azêdo
Do suor
De mil axilas.
O cheiro de peixe
Que exala
De caixotes, em jornal
(sem igual).
Ah, meu trem que parte,
Escuro e sujo!
Trem de luxo
No cotidiano,
Com portas abertas
(incertas)
Que são bocas famintas
(de gente).
De janelas sem vidro,
Com chuva, com vento
Num só lamento,
Do pó que levanta
Do chão,
Juncado do lixo
De muitas mãos
E das bocas que cospem
A miséria de um povo.
Meu trem…
Do cotidiano,
De professoras azuis,
De bêbados cansados,
De suados operários,
Dos peixeiros
Que espalham na manhã
A presença dos mares,
Em horários incertos
(invulgares).
Trem democrático.
Prático!
A professora ao lado
Da lavadeira,
No mesmo trem,
Escuro
E sujo,
Com cheiro de peixe,
De roupa lavada
(ou suja?)
Com o lixo espalhado
No perfume francês.
Quem nos fez
Assim tão irmanados
Nós….Os subdesenvolvidos
Do sul?
Num mesmo trem
Escuro
E sujo.
Com vento
Com chuva
Com frio,
Mas sem cheiro
Do sangue
Da luta de irmãos.
O branco no preto
O preto no branco,
Livres
Num mesmo trem
Escuro
E sujo,
Com vento,
Com chuva,
Com frio,
Mas sem o cheiro
Da pólvora
Da guerra,
Que me aterra

Longa Noite

No espelho da vida
revi mil rostos,
velhos, cansados, perdidos
em passados distantes.
Em meu espanto,
percebi também
quem fui,
pois na luz
que refletia
finalmente eu vi
o tempo que passara.
rápido, implacável, irônico.
pedaços de mim
formavam outras fisionomias
que não eram mais
como um dia foram.
E, em minha mente
lutei por descobrir
vestígios de outrora.
em vão!

ENGANOS

Mergulhei no passado tentando
compreender o presente de uma vida
e descobrir em tantos enganos
a verdade escondida nas mentiras.
Em que dobra do tempo vivido
ela ficou perdida; oculta nas sombras,
tantas vezes negada ou transformada.
O tempo partilhado com o nada.
O prazer sofrido, sem o gozo
do ideal imaginado; perdido.
A mudança rápida de amores,
deixou a mágoa do vazio;
e, por não ser o amor verdade,
fiquei sozinho, sem compreender
o destino cruel que nos leva
a viver tudo o que não é.

Essência cósmica

Sou como o vento
forte, ruidoso, furacão;
às vezes brisa, calmaria.
Sigo à frente meu momento,
passageiro e condutor.
Noites escuras, lindos dias.
Passos largos, riso franco.
Explosão em cores e dor,
vermelhos, rubros, raivas;
azuis, argentos, carícias.
Assobio nas copas e nas taipas.
Assobrado, assobrador.
Sigo o rumo das correntes,
que me levam longe e perto.
Subo e desço por vertentes,
sem paradas, sem descanso;
ora em gritos, ora manso,
mas sempre sou eu, essência,
daquilo que represento,
em vidas que fui,
e em vidas que serei.

Lembranças

Lembranças são crianças, são momentos,

São praças, ruas, brincadeiras.

São nomes, rostos, pessoas;

São encontros e desencontros.

São risos, alegrias, são dores.

Um forte perfume de jasmim

Da casa vizinha de grades verdes,

Que ficou marcado para sempre.

São gatos, cachorros, são cavalos.

São subidas em muitas árvores,

São mangas, abacaxis, são laranjas.

São a primeira escola, a professora.

São lembranças, são descobertas,

São o amor que nasceu medroso.

São um primeiro beijo, roubado.

São as vitórias, são derrotas;

Conquistas e frustações, são medos.

Lembranças são o primeiro sexo,

Sem graça, desajeitado e rápido.

São as descobertas a dois,

São ganhos, são perdas.

São os sonhos e os pesadelos.

São a vida, são a morte,

Saudades dos que foram.

São gostos, músicas e odores.

São caminhos e descaminhos,

São gritos e são silêncios.

São o tudo, são o nada.

São início sem o fim.

Sombras, 2010

Um peso, uma tristeza,
Frustações, cansaços.
Sensação do nada,
Desilusões.
Vazios, sombras,
Passadas.
Não mais reconheço
Minha natureza
De outrora.
Fim de jornadas,
Ciclo de vidas,
Vividas,
Em mil lugares;
Perdidas,
Em mil pedaços.
Dores, alegrias,
Sofrimentos.
Vitórias, conquistas,
Derrotas, arrependimentos.
Encruzilhada do ser
E do não-ser.

Tarde, noite de natal

A tristeza branca
A derramar,
De novo, os tons
(tão bons…),
Tristes e brancos,
Irmanados,
Irmanando,
Num pôr de sóis
Sagrados e únicos,
Os contornos perdidos
Que brotam do povo
Esperançado….
Crédulo,sob um arco-iris
De bondade branca
E triste.
Tudo é calmaria
Nessa tarde de sol
Que desce atrás
Do mar de dezembro.
Ilusão fugáz,
De amor,
De paz,
Comprimida em doze
Meses de ânseios
E dúvidas;
Em eternos veios
De dores reprimidas.
Aqui, sentado,
Parado e alheio,
Com esse sol
A me chamar pro mar…
Não consigo me afastar
Dos sons
Que me alcançam
No fundo da alma,
A alma triste
Desse natal que chegou,
Trazendo um mundo
Que busca outros mundos
Sem conhercer-se a si próprio.
No ventre dilatado
De uma criança qualquer
Está o espanto
Do século dividido.
No pranto da mãe
Que chora mais um anjo
Está o amargo
Das injustiças.
E o mundo busca
Outros mundos,
Sem volver um só
Olhar de piedade.
Que engenhosidade!
A lua a seus pés
Sob a árvore enfeitada
De estrelas;
Que são as gotas
Rolando das faces
Feias e cruas
Que sem compreendê-las
Não aplaudem,
Não riem,
Na mesmice de seus dias
Iguais.
Hoje, é natal,
é paz,
é bondade,
é dádiva,
Mas, em sua tristeza
Ignorante,
Como poderão
Participar
De nossa alegria,
De nossa vitória?
Debaixo de todas as águas
Salgadas
Desse mar,
Fica o fim de uma história
Enterrada e esquecida, e
é natal!

Cicatrizes

Lembranças, lugares, saudades,
Ausências, pensamentos.
São rostos, são nomes,
Chegadas, são partidas.
São tudo, são o nada…
Momentos.
Nos caminhos da mente,
São voltas,
Alegrias,
Tristezas.
Frases perdidas,
Sem respostas, exauridas.
São passados,
Em páginas amareladas.
Gastas no tempo vivido,
Que voltam e gritam.
Presentes.
Amargas, feridas.
Guardadas, esquecidas.
Memórias de outras vidas,
Esmaecidas, recortadas,
Enfraquecidas.
Tempo perdido
Nas marcas que ficam
Das cicatrizes.
Feridas abertas
Na mente e no corpo.
Sentidas.

Buraco Negro

Tentando dormir,
tropecei em meu sono
e caí no buraco negro
da mente.
No susto, não consegui
achar o caminho da volta,
pois, no escuro
tudo se voltava,
de repente,
num turbilhão
de cenas e pensamentos
difusos, confusos;
era eu….não era mais,
um animal….um cão?
Era tudo ou só momentos
de cenas em confusão,
talvez vividas ou sonhadas?
Sem ordem, sem senso
lógico
nem cronológico.
Sem seguimentos,
sem nomes,ou com muitos,
em gritos, chamados…espantos.
Risos de alegrias,
e longos silêncios,
soluços,
de tristezas.
O belo…sem belezas.
Em cenários sucessivos,
alguns quase mortos
outros muito vivos,
fui herói, fui bandido,
fui aclamado
fui banido,
fui amado,
fui traído.
Mas, traidor,
também fui
e fui perdido,
num mar de ondas
rebeldes e negras,
sem me conhecer
e fui caindo,
ainda mais fundo,
no negro mundo,
sem saber.

Lembranças Campeiras

No final da noite
fria,
o vento corta,
cortando a pele
queimada,
com cheiro de suor
e terra.
O sol espia
no horizonte
e clareia o dia.
No chão,
o fogo dança
e espreita
por entre toras.
Na trempe,
a água esquenta
pra fazer o mate
dessas horas.
No espeto,
a carne cheira
enchendo o ar
das narinas
rudes e geladas.
A mão que sova a erva
aguarda
a água quente
pra servir à roda,
com rostos marcados,
de boca em boca,
sorrindo ao dia
que nasce nas coxilhas.
No pampa guasca
é mais um dia
de um conto
gaúcho.

Poema sem nome

Num dia de feroz
Intranquilidade
Desci dos céus
À terra impura
Envolta em véus
De maldade,
De mil doenças,
Sem cura.
E, fui anjo,
Fui demônio.
Expectador
De lutas, de misérias,
De feridas abertas,
Sem dor.
Ao frio das incertezas,
De todas as tristezas,
Em angústias de ais,
Infernais.
Fui arcanjo
Do bem
E do mal,
Em giros gigantes,
Nos gritos vibrantes,
Dos elefantes
Da jangal
De ruinas morais.
Em trilhas tortuosas,
Sinuosas,
A conduzir-nos ao fundo
Dos pantanais de lama,
Fétida.
Onde os javalis
E as hienas
Charfundam,
Em risos roucos
E bestiais.
Onde os pássaros
Não cantarão
Jamais!
Por que desci dos céus
À terra impura?
Loucura!