saramago

126 - 150 do total de 308 pensamentos de saramago

Somos a memória que temos e a responsabilidade que assumimos.
Sem memória não existimos, sem responsabilidade talvez não mereçamos existir.

Por um voto em branco, você está dizendo que você tem uma consciência política, mas você não concorda com qualquer um dos partidos existentes.

O momento das carícias voltou a entrar no quarto, pediu desculpa por ter-se demorado tanto lá fora, Não encontrava o caminho, justificou-se, e, de repente, como aos momentos algumas vezes acontece, tornou-se eterno.

Momentos de fraqueza na vida qualquer um os poderá ter, e, se hoje passámos sem eles, tenhamo-los por certos amanhã.

José Saramago
As Intermitências da Morte

Se começássemos a dizer claramente que a democracia é uma piada, um engano, uma fachada, uma falácia e uma mentira, talvez pudéssemos nos entender melhor.

Se não sais de ti, não chegas a saber quem és.

Posso falar de morte enquanto vivo?
Posso ganir de fome imaginada?
Posso lutar nos versos escondido?
Posso fingir de tudo, sendo nada?

Posso tirar verdades de mentiras,
Ou inundar de fontes um deserto?
Posso mudar de cordas e de liras,
E fazer de má noite sol aberto?

Se tudo a vãs palavras se reduz
E com elas me tapo a retirada,
Do poleiro da sombra nego a luz
Como a canção se nega embalsamada.

Olhos de vidro e asas prisioneiras,
Fiquei-me pelo gosto de palavras
Como rasto das coisas verdadeiras.

José Saramago
Os Poemas Possíveis

...é tanto o que temos para dizer quando nos calamos...
(O homem duplicado)

Nunca esperei nada da vida, por isso tenho tudo.

José Saramago
As palavras de Saramago. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

Há coisas que nunca se poderão explicar por palavras.

José Saramago
O homem duplicado

Tolerar a existência do outro e permitir que ele seja diferente, ainda é muito pouco. Quando se tolera, apenas se concede, e essa não é uma relação de igualdade, mas de superioridade de um sobre o outro.

Costuma-se dizer, dêmos tempo ao tempo, mas aquilo que sempre nos esquecemos de perguntar é se haverá tempo para dar.

É desta massa que nós somos feitos: metade de indiferença, outra metade de maldade.

As palavras são boas. As palavras são más. As palavras ofendem. As palavras pedem desculpa. As palavras queimam. As palavras acariciam. As palavras são dadas, trocadas, oferecidas, vendidas e inventadas. As palavras estão ausentes. Algumas palavras nos absorvem, não nos deixam: são como garras, vem nos livros, nos jornais, nos mensagens publicitárias, nos rótulos dos filmes, nas cartas e nos cartais. As palavras aconselham, sugerem, insinuam, intimidam, impõem, segregam , eliminam. São melífluas ou ácidas. O mundo gira sobre palavras lubrificadas com azeite de paciência. Os cérebros estão cheios de palavras que vivem em paz e em harmonia com suas contrárias e inimigos. Por isso a pessoas fazem o contrario do que pensa crendo pensar o que fazem.
Há muitas palavras. E estão os discursos, que são palavras apoiadas umas em outras, em equilíbrio instável graças a uma sintaxe precária finalizadas com chave de ouro: “Graças. Digo”. Com discursos se comemora, se inaugura, se abrem e cerram sessões, se lançam cortinas de fumo o se dispõem cortinas de veludo. São brindes, orações, conferências e colóquios. Por meio dos discursos se transmitem louvores, agradecimentos, programas e fantasias. E logo as palavras dos discursos aparecem postas em papéis, pintadas em tinta de imprensa “e por essa via entram na imortalidade do Verbo. Ao lado de Sócrates, o presidente da junta domina o discurso que abriu o torneira da fonte. E fluem as palavras, tão fluidas como o “precioso líquido” . Fluem interminavelmente, inundam o solo, chegam até as joelhos, à cintura, a os ombros, ao colo. É o dilúvio universal, um coro desarmado que brota de milhares de bocas. A terra segue seu caminho envolta em um clamor de loucos, a gritos, a berros, envolta também em um murmúrio manso represado e conciliador. De todo há no coro: tenores e contraltos, cantantes baixos, sopranos de dó de peito fácil, barítonos acolchoados, contraltos de voz-surpresa. Nos intervalos se ouve o ponto. E todo isso aturde as estrelas e perturbam as comunicações, como as tempestades solares.
Porque as palavras têm deixado de comunicar. Cada palavra é dita para que não se ouça outra. A palavra, até quando não afirma, se afirma: a palavra é a erva fresca e verde que cobre os dentes do pântano. A palavra não mostra. A palavra disfarça.
Daí que resulte urgente podar as palavras para que a plantação se converta em colheita. Daí que as palavras sejam instrumento de morte ou de salvação. Daí que a palavra só valha o que vale o silêncio do ato.

Há, também, o silêncio. O silêncio é, por definição, o que não se ouve. O silêncio escuta, examina, observa, pesa e analisa. O silêncio é fecundo. O silêncio é a terra negra e fértil, o húmus do ser, a melodia calado sob a luz solar. Caem sobre ele as palavras. Todas as palavras. As palavras boas e as más. O trigo e o joio. “Mas só o trigo dá pão”.

José Saramago

Nota: Trad.: Lucimar Cardoso

O homem nem sonha que, não tendo ainda sequer começado a recrutar os tripulantes, já leva atrás de si a futura encarregada das baldeações e outros asseios, também é deste modo que o destino costuma comportar-se conosco, já está mesmo atrás de nós, já estendeu a mão para tocar-nos o ombro, e nós ainda vamos a murmurar, Acabou-se, não há mais que ver, é tudo igual.

Quero estar onde a minha sombra estiver, se lá é que estiverem os teus olhos.

José Saramago

Não posso crer num deus que foi capaz de criar o ser humano.

...pensa nas contradições da vida, no fato de que para ganhar uma batalha às vezes possa ser necessário perdê-la... (O homem duplicado)

O bem e o mal não existem em si mesmos, cada um deles é somente a ausência do outro.”

Por causa e em nome de Deus é que se tem permitido e justificado tudo, principalmente o mais horrendo e cruel.

...cada um de nós é este pouco e este muito, esta bondade e esta maldade, esta paz e esta guerra, revolta e mansidão.

José Saramago
O Evangelho segundo Jesus Cristo

É interessante como levamos todos os dias da vida a despedir-nos, dizendo e ouvindo dizer até amanhã, e, fatalmente, em um desses dias, o que foi o último para alguém, ou já não está aquele a quem o quem o dissemos, ou já não está nós que o tínhamos dito.

Deixar que o tempo passe, que as coisas amadureçam. E se tiver de ser, será, e se não tiver de ser, não será, acabou.

Em que língua se diz, em que nação,
Em que outra humanidade se aprendeu
A palavra que ordene a confusão
Que neste remoinho se teceu?
Que murmúrio de vento, que dourados
Cantos de ave pousada em altos ramos
Dirão, em som, as coisas que, calados,
No silêncio dos olhos confessamos?

José Saramago
Os Poemas Possíveis

Nem a arte nem a literatura têm de nos dar lições de moral. Somos nós que temos de nos salvar, e isso só é possível com uma postura de cidadania ética, ainda que isto possa soar antigo e anacrônico!