John Bunyan
Tenho guardada no meu peito uma chave chamada promessa que poderá abrir todas as fechaduras do castelo da dúvida.
Não são os longos discursos nem a linguagem eloquente que agrada aos ouvidos do Senhor, mas um coração humilde, quebrantado e contrito.
A conversão não é um processo suave e fácil como algumas pessoas imaginam; se assim fosse, o coração do homem jamais teria sido comparado a um solo não cultivado, e a Palavra de Deus, a um arado.
(...) a uma coisa estou resolvido, isto é, a correr enquanto possa; e quando já não possa correr, caminharei devagar; e quando isto me seja impossível me arrastarei, pois em quanto ao essencial, graças Àquele que me ama, estou decidido.
(O Peregrino)
Me vejo agora no término de minha viagem; meus dias de trabalho concluíram. Vou agora ver Aquela cabeça que por mim foi coroada de espinhos, e Aquele rosto que por mim foi cuspido. Até agora a fé tem me dirigido, porém em diante será Aquele cuja companhia constitui minhas delicias. Tem-me agradado ouvir falar de meu Senhor, e onde quer que tenho visto na terra o rastro de seus pés, ali ansiei pôr também meu pé. Seu nome tem-me sido mais aromático que os mais deliciosos perfumes, e sua voz docíssima, e mais desejei eu contemplar seu rosto do que o homem pode ansiar pela luz do sol. Sua palavra tem-me servido de alimento escolhido e de antídoto contra meus desmaios. "Me susteve e guardou de minhas iniqüidades; sim, meus passos fortaleceu em seu caminho"
Posso falar de minha própria experiência e, com base nisso, contar-lhe a dificuldade de orar a Deus como eu deveria. Isso é suficiente para fazer homens carnais, pobres e cegos entreterem pensamentos estranhos a meu respeito. Quanto ao meu coração, quando vou orar, acho-o tão relutante em buscar a Deus; e quando ele está na presença de Deus, se mostra tão relutante em permanecer com Ele, que muitas vezes sou forçado, em minha orações, a primeiramente implorar a Deus que pegue o meu coração e fixe-o nEle mesmo, em Cristo; e, quando meu coração está ali, peço a Deus que o mantenha ali (Sl 86:11). Ora, muita vezes, não sei pelo que orar (sou tão cego), nem sei como orar (sou tão ignorante). Somente o Espírito (bendita graça) nos assiste em nossas fraquezas (Rm 8:26).
Oh!, quantas dificuldades iniciais o coração experimenta no tempo de oração! Ninguém sabe quantas distrações e desvios levam o coração a se afastar da presença de Deus. Quanto orgulho também há, se somos capacitados com passividade? Quanta hipocrisia, se estamos diante dos outros? E quão pouca consciência temos da oração entre Deus e a alma, em secreto, se o espírito de súplica (Zc 12:10), não estiver ali para ajudar?
O pecado é o desafio da justiça de Deus, o estupro de sua misericórdia a zombar de sua paciência, o ligeiro de Seu poder e o desprezo de seu amor.
Os clamores de algumas pessoas contra o pecado são como os de uma mãe contra o filho a quem repreende, mas que logo beija e acaricia.
Meu trabalho é grande, meu coração é vil, o diabo fica vigiando e o mundo gostaria de dizer alegremente, Aha, aha, é assim que queremos! Quanto a mim, preservar-me não posso, confiar em mim, não ouso; se Deus não me ajudar, estou certo de que não vai demorar muito para que meu coração me engane, e o mundo tome vantagem sobre mim.
Antes que a tentação venha, pensamos que podemos caminhar sobre o mar, mas quando os ventos sopram, sentimos que começamos a afundar...
E, ainda assim, isto não nos traz nenhum bem? Não poderíamos viver sem tais mudanças da mão de Deus sobre nós. Nossa natureza carnal cresceria excessivamente, se não tivéssemos nossos invernos, no tempo apropriado. Diz-se que em alguns países as árvores crescem, mas não produzem fruto, pois não há inverno ali.
Quer o poder da graça? Peça a Deus. Quer poder para resistir as tentações do diabo? Peça a Deus. Quando o diabo o tentar, diga isso ao Pai celestial, derrame suas queixas diante de Deus. Isto é natural para os filhos de Deus; se alguém lhe faz mal, eles vão e dizem isso ao seu pai; assim é com os que são nascidos de Deus, quando enfrentam tentações vão e dizem a Deus.
Duas coisas devem possuir os que vão em peregrinação, a saber: valor e uma vida irrepreensível. Sem valor não podem continuar seu caminho; e se suas vidas são relaxadas, desacreditam o bom nome dos peregrinos.
Eu posso fazer mais que orar, depois de ter orado, mas eu não posso fazer mais que orar, até que tenha orado!.
O ouvir não é mais do que semear a palavra, e o falar não é bastante para demonstrar que há fruto, realmente, no coração e na vida. E devemos estar bem seguros de que, no dia do juízo, serão todos julgados segundo os frutos que houverem produzido (Mateus 25:31-46). Não se lhes perguntará: Creste? Mas sim: Praticaste? E nesta conformidade será o julgamento. Por isso é o fim do mundo comparado à sega da seara (Mateus 13:18-23), E tu sabes perfeitamente que o segador não considera senão os frutos.
(O Peregrino)
Orar é derramar o coração e alma de modo sincero, consciente e afetuoso diante Deus por meio de Cristo, no poder e ajuda do Espírito. Essas coisas dependem de tal modo umas das outras, que é impossível que haja oração sem que todas elas cooperem. Por mais excelente que seja o nosso discurso, Deus rejeita toda súplica que não possua estas características. Se não se derrama coração sincera, consciente e afetuosamente diante dEle, e isso por meio de Cristo, não se faz outra coisa senão um
mero esforço de lábios, o que está longe de ser agradável aos ouvidos de Deus. Assim também, se não é no poder e ajuda do Espírito, é como o fogo estranho que ofereceram os filhos de Arão (Levítico10:1).
Nas minhas crises de agonia espiritual, eu tive fortes tentações para desistir e não buscar mais ao Senhor, todavia havendo-me feito entender quão grandes pecadores eram aqueles de quem Ele teve misericórdia, e quão grande eram as suas promessas aos pecadores, e que não era ao que está são, mas o doente, não ao justo, mas o pecador, e
não ao que está pleno, mas ao que está vazio, a quem lhes comunicava a Sua graça e misericórdia, e isto, com a ajuda do Espírito Santo, fez-me aderir a Ele, apoiar-me nEle, e que ao mesmo tempo clamasse, ainda que no momento não enviou resposta.
Os aparentes atrasos de Deus não são provas de Seu desagrado, às vezes é possível que esconda Seu rosto dos santos que mais ama. Lhe agrada em extremo manter os Seus em oração, encontrá-los continuamente batendo na porta do céu. Pode ser, diz a alma, que o Senhor me prova, ou que Lhe agrada ouvir como lhe apresento, gemendo, a minha condição.
Muito estimo, disse Evangelista, não que tenhais passado por todas essas provas, mas que tenhais delas saído vencedores, e que, apesar das vossas muitas fraquezas, tenhais seguido por este caminho até o presente. E tanto me alegro por vós como por mim. Eu semeei, e vós tendes colhido, e o dia vem em que o que semeia e o que colhe gozarão juntos (João 4:36), isto é, se vos mantiverdes firmes, porque a seu tempo colhereis, se não houverdes desfalecido! (Gálatas 6:9). Diante de vós a coroa incorruptível; correi de maneira que a alcanceis (I Coríntios 9:24-27). Alguns há que se põem a caminho para alcançar esta coroa, mas depois de já irem muito adiantados, vem outro e arrebata-a. Retende, portanto, o que já tendes, para que ninguém vos tire a vossa coroa. Ainda não estais fora do alcance de satanás, ainda não tendes resistido até ao sangue, combatendo contra o pecado (Apocalipse 3:2; Hebreus 12:4). Tende sempre o reino diante dos vossos olhos, e crede firmemente nas coisas invisíveis. Não deixeis invadir o vosso coração pelas coisas do mundo, e velai principalmente pelos vossos corações e suas concupiscências, porque são enganosos sobre todas as coisas, e desesperadamente maus. Tendes a vosso lado todo o poder que há no céu e na terra.
(O Peregrino)