Textos Gabriel Garcia

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ENCONTRO COM A PALAVRA


"Aqui jaz Fernando Sabino. Nasceu homem, morreu menino". A frase poética escolhida pelo autor de "O Encontro Marcado" para a sua lápide expõe de maneira sucinta, mas explícita, um pouco da personalidade, dos desejos e anseios de um protagonista da palavra. Um autor cuja pena produziu, desde a mais tenra juventude, textos fundamentados na sensibilidade capaz de captar a angústia humana como poucos de sua geração souberam fazer. Sobre ele, um dos maiores críticos literários brasileiros, Antonio Cândido, avalia: "Fernando tinha um olhar infalível para os pormenores expressivos e uma capacidade prodigiosa de invenção verbal". Com a morte de Sabino, encerra-se um tempo singular que, por um desses desígnios inexplicáveis, teve o mérito de reunir, em uma mesma época e em um mesmo cenário - a cidade de Belo Horizonte -, o famoso quarteto de escritores mineiros composto por Sabino e pelos amigos Hélio Pellegrino, Otto Lara Resende e Paulo Mendes Campos. Sabino foi o único dos quatro a chegar aos 80 anos. O único a sentir a ausência corrosiva provocada pela perda das grandes amizades. Suas dezenas de romances, crônicas, novelas, correspondências e relatos de viagem trazem em sua essência o cerne de um dom raro: o de fazer dessas histórias uma ponte entre a ficção e a reflexão. Um elo entre o eu e o outro. Entre o particular e o universal. A narrativa de Sabino instiga os leitores à realização de uma busca rumo ao autoconhecimento - virtude característica dos grandes mestres da palavra. Foi assim com o personagem Eduardo Marciano que, desde 1956, com a publicação de "O Encontro Marcado", prossegue arrebatando corações e mentes. A escrita fluente e a leveza que dava a textos de temáticas muitas vezes angustiantes nasciam de um cuidado extremista de Sabino com a palavra. O mesmo que dedicou à música. Eclético, como todos que possuem espírito inquieto, Sabino era baterista de uma banda de jazz - estilo caracterizado pelo predomínio do improviso sobre a técnica. Assim também era Sabino na literatura: artista cujo compasso ritmado era marcado pela junção da técnica e da sensibilidade. A perda do escritor mineiro já seria motivo suficiente para que o reino das palavras ostentasse luto por prazo indefinido. Entretanto, dois dias antes, o mundo das letras, da filosofia, do pensamento dava adeus ao filósofo Jacques Derrida, famoso pela teoria da "desconstrução", cujo princípio era desfazer o texto do modo que foi previamente organizado para revelar significados ocultos. Suas pesquisas apontavam que, tanto na literatura como nas demais formas de arte, é possível observar - por meio de análises detidas - numerosas camadas de significados não necessariamente planejados pelo criador da obra. Assim como Sabino, Derrida era o único sobrevivente de um grupo ímpar de personagens que ajudaram a compor a história de uma geração. Juntos, Althusser, Barthes, Deleuze, Foucault, Lacan e Derrida tornaram-se conhecidos como "os pensadores de 1968". Desde então, o filósofo contribuiu sobremaneira para o entendimento de questões essenciais à compreensão do século 20. O autor de "Espectros de Marx" não se furtava, mesmo já muito doente, o direito de viajar pelos continentes lançando luzes sobre temas variados e polêmicos como a literatura, a política, a ética, os conflitos árabe-israelenses, a luta contra o aparthaid, os últimos atentados em solo americano, a rapidez dos processos tecnológicos. Derrida era um cidadão do mundo, um homem que viveu apaixonadamente e defendeu sua ideologia e seus propósitos de todos os modos. A justiça, os direitos humanos, a conquista da cidadania e a dignidade da pessoa humana eram, invariavelmente, bandeiras que empunhava em favor da edificação de um tempo mais pacífico e igualitário para povos e nações. Foi ele, também, o criador, em 1983, do Colégio Internacional de Filosofia, a que presidiu até 1985. Sem dúvida, as vidas de Sabino e de Derrida são exemplos de entusiasmo e de dedicação. Convites a uma existência mais pró-ativa, passional, conectada à nossa verdade interior e à procura da felicidade individual que se expande para o coletivo. Foram-se dois grandes homens. Ficam duas grandes lições. Que todos tenhamos sabedoria para apreender os ensinamentos que deixaram em seus livros e que os manterá, para sempre, vivos. Afinal, como afirmou Derrida em uma das tantas entrevistas que concedeu: "(...) a vida é sobrevida. Sobreviver no sentido corrente quer dizer continuar vivendo, mas também viver após a morte".


Publicado no jornal Diário de S. Paulo

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MENSAGEM PARA O MAGISTÉRIO
A função mais importante do professor é gerenciar sonhos. Mas nesse mister a amplitude da tarefa é maior que isso: instigar obreiros, fazedores, estimular a inspiração que leva ao domínio do sonhar e do realizar. Iniciativas em torno desse conceito é que constituem os elementos essenciais para o aprendizado, e que levam a criança e o jovem a aprender a ser, a conviver, a conhecer, a fazer. São atitudes que permeiam todas as tradicionais disciplinas, porque o aluno não pode ser um repetidor de fórmulas decoradas. Tem que ser um cidadão, um humanista. Por isso, o ato de ensinar requer um grande respeito pelos jovens, pelos seus desejos e pelas suas expectativas. Até porque essas crianças e adolescentes não são nossos filhos, como pontificou o grande poeta Khalil Gibran, mas são "os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma". Para concretizar essa compreensão do universo do magistério, os professores têm, de seu lado, a vocação e a dedicação, e pelo lado da instituição estadual, o apoio que merecem para serem os viabilizadores da vivência ensino-aprendizagem. A capacitação é prioridade. Porque o professor quer e precisa estar atualizado para levar a efeito a nobre tarefa do magistério. Ferramentas importantíssimas para a capacitação de professores foram disponibilizadas. Entre os professores efetivos, não há um sequer sem diploma universitário ou em vias de obtê-lo. Os quase 7.000 que ainda não tinham cursado universidade já receberam esse benefício do Estado, que agora auxilia também as Prefeituras municipais a darem a mesma formação aos seus professores. Dando mais um passo, o governador Geraldo Alckmin autorizou a concessão de bolsa mestrado para inicialmente 2.000 professores da rede pública estadual. É a concretização do sonho da evolução na carreira acadêmica. A Rede do Saber, pólo de divulgação de conhecimento em total sintonia com a era informacional, tem em funcionamento 104 centros de capacitação de videoconferência, e impressiona por sua produtividade e modernidade. A Teia do Saber e os cursos presenciais asseguram o direito indistinto e democrático de todos os professores de se capacitarem. E além disso, já é grande o grupo de professores estudando em outros países, em universidades parceiras. Só o Banco Santander Banespa está enviando mais de 100 professores para um estágio orientado na Universidade de Salamanca. São iniciativas que propiciam a professores que jamais saíram de sua microrregião natal a oportunidade de vivenciar outras realidades, experienciar outras culturas, tomar contato com avanços tecnológicos e didáticos que serão úteis no seu cotidiano profissional e na sua vida pessoal. E que professor não se tornará melhor quando aprimora o seu conhecimento, a sua sensibilidade para as coisas do mundo e a sua capacidade de compreender? O concurso público para quase 50.000 cargos foi mais um progresso na melhoria da carreira pública. E, recentemente, a aprovação de alterações da Lei Complementar 836, que instituiu o plano de carreira, vencimentos e salários para os integrantes do Quadro do Magistério da Secretaria da Educação, reajustando o salário de todos os professores e funcionários. Nesse universo estão incluídos os aposentados, um grupo de profissionais que hoje repousa da faina diária, mas que durante anos e anos prestou à sociedade o imprescindível serviço de estimular sonhos e de promover realizações. Já que o futuro começa hoje, o professor também quer e precisa ter qualidade de vida. Que se traduz em mais segurança nas escolas, com o programa de segurança escolar. E que se traduz na grande revolução educacional desta gestão, que é o Programa Escola da Família. Locais onde antes nada existia contam agora com a escola como grande centro comunitário de atividades sociais, artísticas e culturais. A comunidade foi para a escola, para todas as 5.306 escolas, como deve ser, e passou a acompanhar os seus filhos e filhas, e a fazer parte do dia-a-dia pedagógico dessas crianças e desses jovens, praticando e exercendo a cidadania nos espaços escolares, transformados em centros de convivência. Esse conjunto de iniciativas mostra o que podemos celebrar neste dia 15 de outubro. Mas, certamente, quem tem mais a celebrar são os alunos, filhos e filhas da ânsia da vida por si mesma, e que através de nós, professores, se lançam como flechas rumo ao infinito. Com certeza toda a comunidade está agradecendo aos professores pelo respeito e pela dedicação que seus filhos recebem, e cujos frutos serão colhidos ao longo de toda a vida. A vocês, queridos professores, mestres na arte de amar, regentes de orquestras em busca de afinação, condutores de sonhos, está endereçada esta mensagem. Vocês são os realizadores. Merecem, portanto, todo o nosso carinho, nesse dia em que o milagre do aprendizado resplandece nas milhares de salas de aula, como em cada manhã.


Publicado no jornal Folha de S. Paulo

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O 'Cinema Paradiso' e a volta às aulas

No clássico Cinema Paradiso (1989), do diretor e roteirista italiano Giuseppe Tornatore, o pequeno e sensível protagonista Totó descobre o mundo por meio de uma escola diferente. Uma escola encantada, impregnada de sonhos, desejos, possibilidades. Uma escola travestida de cinema e que prescinde do quadro negro justamente porque ensina, comove e arrebata os corações e mentes utilizando imagens, emoções, sentimentos e ações reproduzidas nas projeções comandadas por Alfredo - espécie de mentor, professor, pai e amigo do eloqüente Totó. É essa vontade de desvendar o mundo, vivenciada pelo pequeno personagem de Tornatore, que pretendemos levar aos alunos da rede estadual de ensino na próxima segunda-feira, quando seis milhões de estudantes voltam às aulas e assumem seus postos de aprendizes nas seis mil escolas do Estado. Estamos convictos de que a maioria de nossos 250 mil educadores tem muito do amor, da generosidade e do espírito apaixonado do velho projecionista Alfredo. Homem que se vale dos filmes e de suas histórias para fazer do menino Totó um ser humano melhor, mais confiante no futuro. Uma criança comprometida com o aprimoramento de seus talentos. Alfredo ministra ao bambino muito mais do que o ofício da projeção das fitas. Sábio, o velho mentor ensina, a bem da verdade, a importância do sonho, a importância de acreditar neles e a necessidade de lutar para que se tornem realidade. Alfredo é um professor na acepção mais completa do termo. Um mestre que, mesmo após ter perdido a visão durante um dramático incêndio no cinema em que trabalhava, consegue enxergar em seu pupilo o grande artista que ele se tornaria um dia. O grande homem que deixaria aquela pequena cidade sem oportunidades em que viviam em busca da concretização de seus ideais. Ideais fundamentados na concepção, na produção e na execução de suas próprias histórias. Histórias, por isso mesmo, mais fascinantes do que aquelas assistidas nas sessões das matinês. É essa a função do educador. É essa a missão das instituições de ensino. Despertar potenciais. Descobrir dons adormecidos. Injetar confiança em crianças e jovens muitas vezes descrentes de seu valor, de sua singular capacidade de escrever belos roteiros para suas vidas. Nesta época do ano, em que retomamos as atividades do processo ensino-aprendizagem em nossas escolas, faz-se necessário refletir sobre o modo como devemos "seduzir" nossos alunos para a beleza da vida e para as diversas maneiras de torná-la melhor, a cada dia. As salas de aula podem, sim, ser tão atraentes quanto as telas de cinema. Até porque é por meio delas que começamos a aprender mais sobre nós mesmos, sobre os que estão à nossa volta e sobre os que estão distantes. É nelas que deparamos com a melodia da poesia, com a dança frenética dos números, com a natureza e seus infinitos mistérios. É lá que os melhores professores nos orientam sobre o quanto podemos ser detentores das rédeas de nosso destino. O período escolar encerra anos indispensáveis ao crescimento emocional e intelectual dos indivíduos. Anos em que precisamos receber estímulos, incentivos, elogios e críticas construtivas. Tempos em que planejamos, passo a passo, o início de nossa trajetória. A educação necessita de doses maciças de ousadia, da intensidade de espíritos inquietos, da energia pulsante de uma vocação peculiar: a vocação pela propagação de saberes, pelo gosto em debater, refletir, discutir e analisar o mundo junto com o outro. Uma vocação que impulsiona o ser humano ao crescimento ininterrupto. Vocação que se traduz em amar o conhecimento e, principalmente, em compartilhá-lo. A Secretaria de Estado da Educação acredita em seus educadores e tem orgulho de presenciar o modo com que têm exercitado o magistério. É impressionante o empenho desses mestres em fazer o melhor, em participar ativamente de nossos programas, projetos e ações, como é o caso do Escola da Família. Nas visitas às unidades educacionais, nos eventos programados pela secretaria, nas capacitações, na maneira dedicada com que nos apresentam sugestões, no brilho apaixonado com que nos revelam suas idéias... Tudo nos lembra a grandeza e a extrema sensibilidade do inesquecível Alfredo, de Cinema Paradiso. Por tudo isso, a todos vocês que fazem da educação um exercício contínuo de arte, de amor e de altruísmo, um maravilhoso ano letivo. E, sobretudo, o nosso muito obrigado. Que em 2004, possamos avançar ainda mais na construção de uma escola viva, dinâmica e sedutora. Uma escola capaz de deixar nossos aprendizes como o pequeno Totó: repletos de entusiasmo, energia e autoconfiança.


Publicado na Folha de S. Paulo

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Nova Febem: educação, recuperação e liberdade

" (...) Liberdade - essa palavra que o sonho humano alimenta:/que não há ninguém que explique,/ e ninguém que não entenda!/". Esses belíssimos versos extraídos do Romanceiro da Inconfidência, de Cecília Meireles, são perfeitos para ilustrar o novo conceito de recuperação de adolescentes em conflito com a lei atendidos pela Febem. Trata-se de uma proposta ousada, moderna, fundamentada na expansão de unidades de semiliberdade, administradas pelo Governo do Estado, em parceria com entidades não-governamentais, dando início a um sistema de co-gestão. Um exemplo disso é a recente inauguração do Espaço Educacional Profissionalizante da Febem, que já está funcionando desde o último dia 15, no prédio do antigo presídio do Hipódromo. Nessa unidade caberão à Febem as atribuições pertinentes ao Estado: dirigir e supervisionar todo o funcionamento de contenção dos adolescentes. Já a organização parceira da entidade, o Instituto Mamãe - Associação de Assistência à Criança Santamarense, contará com o apoio de um conselho gestor e irá desenvolver as atividades pedagógicas voltadas à ressocialização do jovem. O novo prédio tem capacidade para atender, inicialmente, 200 alunos. Para o segundo semestre, a previsão é ampliar esse número, de modo que 400 adolescentes tenham acesso aos benefícios do Espaço Educacional. É preciso ressaltar que os primeiros 40 aprendizes serão escolhidos dentro da Unidade de Semiliberdade Inicial, que abriga adolescentes que nunca haviam passado pela Febem e que receberam a semiliberdade como primeira medida determinada pelo Judiciário. A principal diferença entre essa unidade e as demais é que o adolescente receberá um atendimento ainda mais completo, sob a forma de aulas do ensino regulamentar (Fundamental e Médio) e também dos cursos profissionalizantes - panificação, estética, manutenção de computadores, gráfica -, perfazendo oito horas de estudos, no período diurno. Ao final do dia, os estudantes devem retornar para casa. Nas outras unidades de semiliberdade, o processo ocorre de forma inversa. Os jovens ficam fora o dia todo para trabalhar e estudar e retornam para a Febem à noite. Outra novidade capaz de revolucionar positivamente a vida desses jovens diz respeito à Orientação do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), instituição que irá propiciar aos adolescentes ensinamentos e informações indispensáveis sobre empreendedorismo e visão de negócios, qualificações oportunas à juventude do século XXI. O projeto encerra, ainda, outro aspecto inovador e essencial à ressocialização desses meninos: todos poderão prestar serviços à comunidade local, vendendo pães e consertando aparelhos eletrônicos a um custo bem menor do que aquele oferecido pelo mercado. Estamos convictos de que os adolescentes podem ser totalmente recuperados, desde que recebam oportunidades concretas de aprendizado, crescimento e desenvolvimento de seus talentos, habilidades e competências. A cada dia, os profissionais da Secretaria de Estado da Educação e das unidades da Febem se surpreendem com a determinação e a vontade de superar limites demonstradas por esses adolescentes nas oficinas pedagógicas, profissionalizantes e culturais que acontecem de forma simultânea em todas as nossas unidades. Que esses jovens do Espaço Educacional e Profissionalizante também nos surpreendam, da mesma forma que as moças e rapazes de outras unidades da Febem. Adolescentes que mudaram o rumo da sua história e que, por isso mesmo, já têm emprego garantido em grandes empresas e instituições como o Empório Ravioli, o Mc Donald's, o Mister Sheik, o COC e a própria Secretaria de Estado da Educação. Jovens que despertaram para a arte e que nos comovem em suas apresentações de canto, teatro e música instrumental Nossa proposta inovadora tem o aval do mestre Anísio Teixeira, que em seu texto Por Que Escola Nova? sabiamente afirmou: "À medida que formos mais livres, que abrangermos em nosso coração e em nossa inteligência mais coisas, que ganharmos critérios mais finos de compreensão, nessa medida nos sentiremos maiores e mais felizes. A finalidade da educação se confunde com a finalidade da vida". Esse é o lema que norteia o novo conceito da Febem. E você é nosso convidado para conhecer as unidades, assistir às apresentações dos aprendizes e, principalmente, compartilhar do sonho de construir, pedra por pedra, as bases da fundação dessa nova geração. Uma geração composta por seres humanos que, um dia, erraram - como todos nós erramos -, mas que souberam fazer disso uma grande lição e uma ponte para a conquista da dignidade.


Publicado no Jornal da Tarde

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Um aprendizado contínuo
"Digo: o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia". A frase magistral, extraída da obra Grande Sertão: Veredas, do mestre João Guimarães Rosa, encerra uma série de conceitos, idéias e sugestões capazes de nos arrebatar por dias seguidos, tamanho o seu impacto e a sua densidade. Como quase tudo que o autor de Sagarana escreveu, ela exerce nos leitores um fascínio quase hipnótico, justamente porque representa uma síntese rara que une poesia e filosofia, convidando-nos à reflexão e também à apreciação estética. Ela nos leva a pensar sobre as experiências que vamos acumulando durante a vida e o modo como elas ajudam a moldar nosso caráter, nossa personalidade, nosso jeito singular de ser, de existir no mundo. Nossa convergência ou divergência dos valores, da ética, da moral. Guimarães Rosa parecia mesmo possuir a chave que abre a porta dos mais diversos mistérios que regem a aventura humana. Não foi à toa que, quando de sua morte, o poeta Carlos Drummond de Andrade escreveu para ele o poema "Um chamado João", em que, de forma sábia, questionava a melhor maneira de definir o criador de Riobaldo e Diadorim: "Embaixador do reino/ que há por trás dos reinos,/dos poderes, das/ supostas fórmulas/ do abracadabra, sésamo?/". O poeta de Itabira acertara mais uma vez. Assim como ele próprio o era, há artistas, escritores e pensadores que nos instigam, com suas obras, a encontrar o caminho do meio-termo, do equilíbrio entre a razão e a emoção. Um caminho que nos leva a apreender a magia do real. Um real muitas vezes invadido, enriquecido e incrementado pelas vias do imaginário. Esse imaginário tomado pela percepção aguçada que adquirimos por intermédio de suas histórias, de sua lógica primorosa, de seus sentimentos, de suas emoções. A leitura e o conhecimento são, por assim dizer, as pedras fundamentais das construções que originamos em nossa passagem na Terra. Ambos nos possibilitam, ainda, integrar os mais variados rincões espácio-temporais. Sentimos, por exemplo, um gosto doce de eternidade quando lemos estes versos de "Evocação ao Recife", de Manuel Bandeira: "Recife... /Rua da União.../ A casa de meu avô.../ Nunca pensei que ela acabasse!/Tudo lá parecia impregnado de eternidade/ Recife.../. Rosa, Drummond e Bandeira nos mostram que os grandes artistas e pensadores nos capacitam para uma jornada que mescla as lembranças do passado e a compreensão do presente, perfazendo vias que, comumente, podem nos transportar às paisagens tão sonhadas para o nosso futuro. Três tempos que, juntos, propiciam descobertas fantásticas. O conhecimento que transmitem por intermédio de seus textos e de sua arte nos impulsiona a seguir veredas especiais e a sair das cavernas escuras da ignorância. Foi assim, também, com os filósofos gregos, dentre eles, Aristóteles, que no livro Ética a Nicômaco desenvolveu um verdadeiro tratado sobre a arte do bem-viver. A obra do preceptor de Alexandre, o Grande, foi escrita especialmente para mostrar a Nicômaco, filho de Aristóteles, as direções mais adequadas a tomar para uma vida pautada pela ética, sustentada pela tolerância, pelo respeito aos seus semelhantes, pelo cultivo da amizade e do amor. Escrito há mais de dois mil anos, o texto é cada vez mais atual e necessário. Neste início de século XXI, seria maravilhoso se todos tivessem a oportunidade de se debruçar sobre essa obra magnânima. Foi pensando nisso que apostamos na idéia de realizar trabalhos que divulguem e propaguem idéias fundamentadas nesse livro de Aristóteles, utilizando, no entanto, linguagens e exemplos mais próximos da nossa realidade. É nossa esperança contribuir para que todos, principalmente os mais jovens, despertem para a apreciação de textos mais reflexivos e para a leitura de temas relevantes. Trata-se de uma tentativa de traduzir de forma mais contemporânea os caminhos inicialmente indicados por Aristóteles para a felicidade, para a prática do bem, para o apego à justiça e à sua propagação, para as atitudes moderadas, para a sapiência em concretizar as melhores escolhas, em conhecer e praticar as virtudes mais nobres, em valer-se da razão e do coração, em cultivar o amor e, principalmente, ser feliz. Sabemos que não existem fórmulas prontas ou tampouco mapas que apontem o passo a passo para a edificação de uma vida digna e honrada. Entretanto, temos convicção de que o conhecimento é o único passaporte capaz de levar as pessoas a uma postura verdadeiramente ética e a atitudes condizentes com as sugestões do filósofo grego, que dizia: "Toda a arte e toda a indagação, assim como toda ação e todo o propósito, visam a algum bem". Esse é o nosso maior desejo: fazer o bem para os que buscam compreender um pouco mais sobre o seu norte e sobre as bússolas que podem conduzi-los pelo grande Sertão que é a vida. Acreditamos na grandeza dessa jornada, sobretudo porque temos o respaldo do mestre Rosa, embaixador de todos os reinos, quando afirmou, pela boca da personagem Riobaldo: "Sertão. Sabe o senhor: sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do que o poder do lugar (...) O sertão é do tamanho do mundo". Que o nosso mundo e as nossas fronteiras possam se expandir, sempre, pela estrada verdejante da ética.
Publicado no Jornal do Commercio

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Respeito e admiração
Professor, professora. Educadores. Todo dia é dia do mestre! De quem ensina e de quem aprende. De quem entende o sublime destino de caminhar ao lado das sendas do conhecimento, do aprendizado, do encontro com o novo, com o recontado. Histórias do cotidiano de milhares de professores e professoras que nos mais diversos rincões exercitam essa magnífica expressão de amor: partilhar sonhos, medos, angústias, dúvidas, projetos, vida. Agostinho de Hipona, famoso pregador medieval, ensinava por meio de sermões. Dizia que o sermão era uma dívida de amor que deveria ser paga sempre. O amor que transbordava, conhecimento vivo, vivificador. Palavra poderosa que animava, isso é, dava alma aos fiéis ouvintes. Rousseau, em Emílio, obra clássica da educação, clamava: "(...) uero ensinar o mais importante: quero ensinar-lhe a viver". É o amor que ensina a viver. E isso não é utopia. É o cotidiano dos nossos mestres nas salas de aulas. Regentes de instrumentos diversos. Uns mais afinados, outros mais arredios. Mas todos com sua beleza. É preciso talento: saber ouvir, puxar a corda até o ponto certo para que não fique frouxa nem arrebente. Entender o tom e o modo de misturar tantas e tão diversas habilidades. O resultado é a sinfonia que se nota nas salas de aula, lugar sagrado em que mestres e aprendizes vivem a poesia da vida. Nietzsche falava dessa poesia nas menores coisas. O olhar no olhar, por vezes distante e entristecido do aluno. Por vezes agressivo, não por essência, mas por ausência. Ausência de afeto, de projetos, de futuro. Basta dar perspectiva aos jovens e eles se tornam gigantes. E isso nós também percebemos em nossas escolas. Dia do mestre. O governador Geraldo Alckmin conta com entusiasmo sobre seus tempos de professor. Histórias do curso de madureza. Histórias da química orgânica, matéria que regia magistralmente como mestre que já antecipava o carinho e o respeito que tem pelas pessoas. E é esse respeito que faz com que ele coloque a educação como a grande prioridade de seu governo. E nesse diapasão multiplicam-se os projetos e as ações. A Escola da Família e o desafio de levar 6 milhões de famílias às escolas, nos finais de semana, para a difícil arte da convivência. Aprendizado conjunto, eficaz. 25 mil bolsas de estudos para jovens carentes egressos de escolas públicas. É praticamente uma nova universidade. Além disso, a implantação da USP, na Zona Leste, e a ampliação da UNESP. O crescimento das Faculdades de Tecnologia. É o governo educador. Sério. Transparente. Sabe que ainda falta muito, mas tem consciência de que educação é processo e não demagogia. São Paulo tem os melhores índices de informatização escolar. Enquanto no Ensino Médio temos 95% das escolas com computadores, a média nacional é de 38%. É ainda o único Estado que garantiu o curso de graduação aos professores e agora lança o programa Bolsa-mestrado para que o mestre que ensina possa aprender cada vez mais. O investimento em formação continuada não pára por aí: o programa de inclusão digital possibilitou que 60 mil professores pudessem ter computador em casa. Além disso, criamos programas como Teia do saber e Rede do saber. A maior rede de videoconferência do País e uma das maiores do mundo com mais de 100 pólos de alta geração, utilizando a tecnologia para desenvolver a sensibilidade. Dia do mestre. Tarefa árdua e gratificante. O que pensa o alfabetizador quando percebe os rabiscos se transformando em letras, palavras, pensamento? O que sente o professor de matemática com as primeiras operações que se transformam em equações e demonstram a força do raciocínio? E os primeiros estudos de ciências? A curiosidade fremente nas descobertas do corpo humano. Edificadores de uma história em construção perene. Guerreiros medievais, artistas renascentistas. A arte. A magia da arte que leva ao palco, aos muros das escolas, aos corais que multiplicam essa sensibilidade que não pode ficar adormecida. E a literatura? A história dos sentimentos. História contada por filigranas de quem enxerga um pouco mais e transforma o cotidiano em uma inesquecível narrativa. E assim sucessivamente. O conhecimento se avolumando e dando maturidade aos navegadores que ainda temem deixar o porto-seguro. É preciso pensar com liberdade. Aluno não é receptáculo de conhecimento. É águia ensaiando vôo. Respeitar e valorizar o mestre é tarefa de todos. Governo e sociedade. Se há professores que não ensinam e que não têm o grande compromisso de educar, essa minoria não pode tirar o brilho da grande plêiade de mestres que dedicam a vida à arte de fazer pessoas felizes. Arte de amor... Como os sermões de Agostinho de Hipona, a educação cotidiana de Rousseau e a poesia da simplicidade de Nietzsche.


Publicado no jornal Diário de S. Paulo

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Por uma educação poética
Em seu poema "Belo Belo", publicado na obra Lira dos cinqüent'anos, o poeta Manuel Bandeira dispara: "Não quero amar,/Não quero ser amado./Não quero combater,/Não quero ser soldado/. - Quero a delícia de poder sentir as coisas mais simples/. Por meio do discurso dessa autoridade incontestável da seara das letras, impregnado de uma sabedoria que a maioria de nós busca alcançar, nos sentimos propensos a refletir sobre a grandeza existente nas coisas singelas e a forma como elas conduzem nossos corações e mentes para o caminho do que é realmente importante à existência humana. Possibilitar essa visão apurada da vida é contribuir para o entendimento de que a felicidade é composta pelas ações e sensações presentes nas coisas mais corriqueiras. Esse aprendizado deve ser, ou pelo menos deveria, um dos objetivos primeiros da educação. Nas disciplinas do currículo regular, na abordagem dos temas transversais, nas numerosas atividades que devem configurar o ano letivo das escolas - semanas culturais, gincanas, passeios, comemorações cívicas -, é necessário que os educadores propiciem aos seus aprendizes a consciência do que é o bem, o bom e o belo. Até porque essa tríade, capaz de dotar o espírito e a mente humana do viço e da energia essenciais à edificação de ideais nobres, cria um círculo virtuoso fundamental à convivência social pacífica, ao desenvolvimento do caráter ético e ao fortalecimento de valores como: honestidade, lealdade, respeito, civilidade, fraternidade, solidariedade e senso de justiça. Essas e tantas outras percepções e virtudes provêm do aprendizado adquirido na família e também das influências recebidas pelo meio. É aí que entra o papel da escola e o trabalho sensível dos educadores. Mestres são também maestros. Regentes cuja missão é ensinar aos músicos/aprendizes a ler as partituras da vida equilibrando razão e emoção, competência técnica e amor. Para isso, há que se despertar os educandos para o singelo, para a verdade e para a beleza essencial de todas as coisas. Em seus versos irretocáveis, Manuel Bandeira sintetiza parte dos conceitos filosóficos descritos por Platão a respeito do belo, tanto em seu texto Fedro, quanto em República. No primeiro, o filósofo nos diz: " (...) na beleza e no amor que ela suscita, o homem encontra o ponto de partida para a recordação ou a contemplação das substâncias ideais". Já em sua República, Platão compara o bem ao Sol, que dá aos objetos não apenas a possibilidade de serem vistos, como também a de serem gerados, de crescerem e de nutrir-se. O pensamento filosófico e a poesia não oferecem mapas ou guias para a felicidade. Muito melhor do que isso, apontam caminhos para que possamos ter o prazer de encontrá-la pelos nossos próprios esforços. Assim deve ocorrer também com a educação, cujo compromisso maior precisa ser o de proporcionar escolhas, opções de rota, além de fornecer aos seres em formação os instrumentos básicos para as suas jornadas pessoais. Mestres e aprendizes têm de compartilhar a fascinante aventura da troca e da descoberta, de modo que, juntos, ampliem a capacidade de olhar as paisagens da vida com os olhos de ver... Carlos Drummond de Andrade - outro mestre sagrado da poesia - já falava sobre isso em seu belíssimo poema "A flor e a náusea", do livro A rosa do povo: "Uma flor nasceu na rua!/(...)Uma flor ainda desbotada/ilude a polícia, rompe o asfalto./Façam completo silêncio, paralisem os negócios,/garanto que uma flor nasceu./(...)É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio/." Essa visão privilegiada dos poeta, dos grandes visionários e filósofos tem de estar no cerne das propostas educacionais. Seja nas instituições de ensino superior, seja nas escolas da rede pública ou privada, nos colégios da periferia, quiosques, cabanas e ocas em que a educação transcende as carências de infra-estrutura física e material e se dá por meio do altruísmo de milhares de mestres que habitam os mais variados rincões do País.... É preciso utilizar uma pedagogia que revele o bom, o bem e o belo em sua essência primeva. No ensaio "Inquietudes na poesia de Drummond", do livro Vários Escritos, o professor Antonio Candido discorre sobre o que chama de "função redentora da poesia". É esse o alerta e o norte necessário à educação de excelência. No dia-a-dia da sala de aula, no vaivém do processo ensino-aprendizagem, no ritmo alucinante da busca pelo saber, é necessário encontrar um tempo para ler, reler e resgatar, enfim, os dizeres dos grandes filósofos e poetas, de modo que possamos nos educar e educar aos demais para olhar o asfalto e, ainda assim, poder enxergar a flor.


Publicado na Folha de S. Paulo

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Escola da família: espaço da paz
Educação. Conhecimento. Saber. Palavras capazes de operar milagres, revolucionar histórias e construir futuros condizentes com as expectativas sociais. Um país comprometido com a educação de seu povo concede aos seus cidadãos a argila propícia à grande escultura coletiva responsável por moldar as nações verdadeiramente soberanas. Nações executoras de uma obra-prima imprescindível que é a herança maior das gerações que se sucedem. O Governo do Estado de São Paulo está empenhado em proporcionar essa educação efetiva e eficaz cujo legado dará origem a um Brasil mais justo, fraterno e igualitário. Brasil que se faz dia a dia por meio de desafios, ideias, projetos e ações como o Programa Escola da Família, lançado recentemente e que acontece todos os finais de semana nas mais de seis mil escolas da rede estadual de ensino. Trata-se de uma iniciativa tão inédita quanto ousada, fundamentada no compromisso de fazer da escola um ambiente acolhedor, familiar... Um ambiente que possibilite uma educação multiplicadora, extensiva aos familiares dos alunos e a toda a comunidade do entorno escolar. Um lugar que visa a retomar o espírito sagrado das academias gregas, onde alguns dos maiores filósofos de todos os tempos prepararam os aprendizes com vínculo, afeto. Na Academia, no Liceu ou no Jardim de Epicuro o saber se misturava ao prazer. Isso é educação. Cultura, esporte, saúde, lazer, cursos e palestras que promovem geração de renda estão disponíveis nessa nova proposta de instituição de ensino. Aos sábados e aos domingos, as unidades educacionais abrem suas portas e presenteiam a população do Estado com espaços e atividades que fornecem aprendizagem e entretenimento para seis milhões de alunos, somados aos seus familiares e aos 25 mil universitários que estão compartilhando seus conhecimentos com a comunidade. Jovens que monitoram essas ações pedagógicas e recreativas. Nesse contexto, o sonho de edificar uma escola de qualidade está agora mais próximo da realidade. Uma realidade também integrada ao sonho da universidade gratuita. Isso porque todos os milhares de universitários que atuam no programa - somente alunos egressos da escola pública - estudarão sem custos nas faculdades particulares parceiras desse empreendimento. O Estado paga a metade, até o limite de 267 reais. A faculdade assume a outra metade e o aluno, como contrapartida, trabalha em uma escola pública. São duas grandes ações de enorme envergadura social: escolas abertas à comunidade e o acesso à universidade para os nossos aprendizes. A democracia é a espinha dorsal do projeto, uma vez que a comunidade escolar escolhe as atividades que serão implementadas de acordo com as suas maiores necessidades, respeitando a cultura e os costumes locais. É a escola como o espaço mais importante do bairro, da cidade, da região. Parceiros de grande estatura acreditaram nesse sonho e partilham conosco do maior programa de cidadania escolar já desenvolvido neste país. O instituto Ayrton Senna, a Unesco, o Faça Parte - Instituto Brasil Voluntário e centenas de colaboradores espalhados por todas as escolas públicas estão caminhando ao nosso lado nesta jornada pela educação de excelência. É a crença no envolvimento, na responsabilidade partilhada. É a escola pronta para os desafios do século XXI. O início teve o êxito que imaginávamos. Escolas repletas. Os universitários, os educadores contratados, pais, alunos e muitos, muitos voluntários que quiseram dar a sua parcela de contribuição para essa escola dos nossos sonhos. A comunidade tem um novo e bom programa todo final de semana: ir à escola! Pais e filhos estudando juntos, convivendo, ensinando, aprendendo. O Estado fazendo sua parte. São 60 milhões de reais apenas neste semestre. É um investimento de retorno garantido. Investimento no ser humano. Estamos qualificando para a vida e para o mercado de trabalho. Esse é o diferencial da educação competente. Como diz o governador Geraldo Alckmin: "O prédio é importante. A construção é importante. Cada biblioteca e cada laboratório são um auxílio precioso no desenvolvimento da aprendizagem. Mas o essencial não é a obra de cimento e cal. O essencial é a obra humana". Professores, pais, alunos.... Esperança de um mundo em que a convivência seja menos traumática e mais afetuosa. Uma convivência que pode ser enriquecida e solidificada nesta nova Escola da Família, neste novo espaço de paz.

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Uma Nova Oportunidade

"Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai, à porta do Ateneu." São estas as palavras que abrem um dos grandes clássicos da literatura brasileira, O Ateneu, do fluminense Raul Pompéia. Adquirir domínio sobre a leitura e a escrita, essas ferramentas extraordinárias, é exatamente esse "encontrar o mundo", é abrir surpreendentes e infinitas estradas ao pensamento, no mapa do tempo e da história, no mapa do sonho e da imaginação, ampliando em muito o alcance da mente e dos sentidos, aumentando a capacidade de absorver e compartilhar as experiências próprias e alheias, tornando a todos mais ricos daquela riqueza que os ladrões jamais poderão roubar. Paralela à leitura, a técnica da escrita permite a possibilidade de registrar e transportar sentimentos, pensamentos, levando atuação e intervenção concretas a lugares muito distantes, numa irradiação dos produtos do espírito humano para muito além dos limites restritos da presença física de cada um. A escrita dá a cada um de nós um poder extraordinário: o dom da ubiqüidade, ou seja, a capacidade de estar em muitos e diversos lugares ao mesmo tempo. Escrever um bilhete e deixá-lo para ser lido por alguém que só chegará depois é um exemplo simples e cotidiano desse dom. Uma carta enviada a algum remoto lugar onde nunca se esteve, ao qual fisicamente talvez nunca se irá, é outra prova dessa capacidade de ultrapassar limites físicos e ampliar a presença pessoal no mundo. Os extraordinários recursos postos à disposição do homem pela informática e pelo desenvolvimento tecnológico dependem da leitura e da escrita para poderem ser plenamente desfrutados. Quem não domina essas ferramentas acaba sofrendo, portanto, uma exclusão dupla. Todas essas capacidades quase mágicas são facilitadas por essas duas práticas, tão cotidianas que chegam a ser vistas com trivialidade. Sendo tão naturais, tão compartilhadas por todos, tão presentes no mundo, muitas vezes fica até difícil imaginar, neste tempo renovado de um século que se inicia, a existência de pessoas que, por razões que não cabe discutir aqui, não adquiriram esses instrumentos tão necessários para compartilhar existência e experiência, permanecendo por isso mergulhadas num sombrio estado de isolamento, uma espécie de limbo social que as torna quase invisíveis, motivo de limitações e dificuldades que surgem a cada dia e já não se justificam de nenhum modo. Existe um grande esforço espalhado por todo o país, muita gente empenhada em enfrentar e transformar essa situação. Exatamente para se reunir a esse esforço e resgatar desse inaceitável limbo pelo menos setecentas mil pessoas acima dos quinze anos de idade é que a Secretaria de Estado da Educação, associada ao Sindicato das Entidades Mantenedoras dos Estabelecimentos de Ensino Superior em São Paulo (SEMESP), lança o Programa de Alfabetização e Inclusão, que também atende pela sugestiva sigla PAI. O objetivo é, em quatro anos, atingir essa meta. Professores e salas de aula, sustentáculos humanos e base estrutural do programa, serão fornecidos por mais de cem instituições de ensino superior que já mostraram interesse pela parceria. O governador Geraldo Alckmin esteve presente ao evento de assinatura do convênio entre SEMESP e Secretaria da Educação, no dia 5 de junho último, no Centro Universitário Adventista, e ficou visivelmente tocado ao testemunhar a viva emoção de pessoas de cinqüenta, sessenta, setenta anos, mais que felizes por esta bem-vinda nova chance e pela circunstância muito especial, jamais imaginada, de que isso vá acontecer dentro de uma universidade. Entre as melhores lembranças desse dia ficará o sorriso de uma senhora de sessenta e quatro anos, respondendo orgulhosa à neta que lhe perguntava o que ia fazer: - Vou à universidade, ao sonho, à vida! À Secretaria de Educação caberá a supervisão dos cursos e a orientação pedagógica, realizada a partir das Diretorias Regionais de Ensino. No segundo semestre de 2003 estarão mobilizados mais de dois mil estudantes universitários espalhados por mil salas de aula. Caberá às universidades e faculdades articular o recrutamento dos estudantes dentro de sua base territorial. Esses são apenas números iniciais. Com a adesão de mais instituições de ensino também crescem as perspectivas de expansão do programa. Uma das preocupações que orientam o projeto é trabalhar a aprendizagem a partir dos problemas locais da comunidade, chamando a atenção dos estudantes para uma visão nova do seu próprio universo. Tudo isso vai ser feito com a intenção de criar caminhos e possibilidades para que as pessoas promovam sua própria inclusão social e compartilhem com todos o luminoso sol do conhecimento, e também o seu calor.


Publicado no Diário do Grande ABC

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A invasão da paz
É momento de paz! O mundo clama. A sociedade anseia. Paz. Viver e conviver em harmonia, sem medo, com equilíbrio. É necessário promover a invasão da paz. Bem-vinda invasão, para reforçar os laços afetivos entre escola e comunidade. Invasão total: seis mil escolas da rede, em todos os municípios do estado, abrirão as portas, permitindo, incentivando a ocupação do espaço pela comunidade nos fins de semana, no início do próximo semestre letivo. São esses os objetivos do projeto Escola da Família: Espaços de Paz, parceria entre Secretaria da Educação, Unesco e Instituto Ayrton Senna, que também vai envolver faculdades particulares e seus alunos vindos da rede pública, educadores contratados pelas Associações de Pais e Mestres, além dos milhares de voluntários que já entenderam a missão da partilha e o trabalho de amor. Daí sairão equipes de planejamento e monitoria de atividades para todos interessados, nas escolas abertas aos sábados e domingos. Há tempos acontecia encontrar, após o fim de semana, desagradável surpresa na volta à escola. Arrombamentos, documentos furtados apenas pelo estúpido gosto de fazer o mal, já que nenhum proveito deles se poderia tirar. Sujeira, pichações nas paredes, equipamentos inutilizados, isso produzia, nos que lidavam com esse quadro, sensação de inutilidade de esforços. Para eles parecia repetir-se o castigo de Sísifo, conforme a tradição da mitologia grega. Castigo que consistia em empurrar enorme pedra ladeira acima para, em chegando ao alto, ver a pedra rolar ladeira abaixo, descer atrás dela, começar tudo de novo. Era preciso limpar, arrumar, improvisar, rápido refazer condições para retomada do funcionamento, porque os alunos ali estavam, prontos para suas atividades normais. Dever cumprido com a consciência da pendente ameaça de ter de fazer tudo outra vez na seguinte segunda-feira. Ameaça que se concretizou muitas vezes. Fechada nos fins de semana, a escola parecia dar as costas à comunidade. Alguns de seus menos amigáveis membros forçavam, de modo criminoso e prejudicial a todos, a abertura da escola, promovendo essas invasões indesejadas pela esmagadora maioria. O argumento fundamental do Escola da Família: Espaços da Paz é a certeza que o isolamento nunca será suficiente para garantir a segurança e a proteção da escola, ao lado de outra certeza: o que atingir a escola estará ferindo a comunidade num dos seus pontos essenciais. Somente a presença e a ampla participação da família e da comunidade, que é a família ampliada, no interior da escola vão garantir a proteção e a segurança desejadas, para escola e comunidade. Um espaço de paz e convivência que muito depressa transcenderá aqueles muros. Quando os envolvidos tiverem a certeza de que a escola é órgão vivo e vital dessa mesma comunidade, estarão prontos a defendê-la como se estivessem defendendo suas próprias casas e essa será de fato uma garantia. É a consciência do pertencimento. A escola pertence à comunidade. Isso ficou provado pela sensível queda de índices de violência no entorno das escolas que já desenvolvem atividades durante o fim de semana. A decisão sobre as atividades oferecidas a esses novos e bem-vindos invasores dos sábados e domingos não será tomada à distância, mas no local, pela própria comunidade. O projeto prevê atividades esportivas e recreativas, culturais, de treinamento e qualificação para o trabalho e de informação para melhoria da qualidade de vida. A esperança neste projeto é ver dele surgir pessoas interessadas em diversas modalidades esportivas, quem sabe até um atleta de destaque, grupos de teatro, de música, muitos e muitos leitores, poetas expondo e trocando trabalhos, rádios comunitárias fazendo reverberar em ondas cada vez mais amplas as novas possibilidades e idéias que com certeza surgirão nesses alegres fins de semana dentro da escola de portas abertas. E também gente habilitada a procurar novas possibilidades de colocação na dura luta pela sobrevivência. Filhos ensinando pais a utilizar o computador. A magia da convivência, a energia transformadora do afeto capacitando gente a se cuidar melhor, gostar mais de si mesma, viver com mais saúde, saber como melhor aproveitar variadíssimos recursos colocados ao seu alcance. É o grande desafio da escola. Ser um centro de luz que irradia para toda a comunidade. Uma escola atraente, acolhedora. Cecília Meireles já sonhava, nos idos de 1930, com uma escola que tivesse a poesia das goiabeiras e mangueiras, o canto e a liberdade dos pássaros, o encanto e a cor dos girassóis e margaridas. Este é um desafio de todos. Professores, funcionários, pais, alunos, comunidade... Todos que têm a consciência dessa divina invasão da paz.


Publicado no Diário de S. Paulo

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Tecnologia do Bem

Na trilogia cinematográfica De volta para o futuro, sucesso levado às telas no final da década de 80 e início da de 90 pelo diretor Robert Zemeckis, as personagens Marty MacFly e Emmet Brown respectivamente interpretados pelos atores Michael J. Fox e Christopher Lloyd protagonizavam uma aventura deliciosamente fantástica... Uma espécie de sonho coletivo que, há milênios, povoa o imaginário da humanidade: viajar numa máquina do tempo. O tema exerce um fascínio tão grande sobre as pessoas que, não raro, origina séries televisivas, desenhos animados e livros como A máquina do tempo, de H. G. Wells clássico da ficção científica. Entretanto, tanto na vida real quanto na ficção, todos os sonhos têm um preço. Um preço, às vezes, exorbitante. Sobre esse ponto de vista, o filme de Zemeckis é muito competente, na medida em que nos mostra, sem rodeios, os dois lados dessa interessante moeda tecnológica. Desde o primeiro episódio da trilogia, percebemos que as idas e vindas das personagens em seu turismo espácio-temporal podem ocasionar mudanças drásticas no curso da História, causando transtornos gigantescos para todos. O recado é claro: toda a tecnologia, todo o progresso, todo o desenvolvimento deve ser responsável. Suas conseqüências têm de ser avaliadas, medidas e conferidas de modo a serem usadas em benefício da vida., em benefício da prática do bem. Mesmo quando a proposta inicial não é essa, há que se realizar esforços contínuos da comunidade científica para reverter esse quadro, tornando as invenções instrumentos que contribuam para o nosso processo evolutivo. Em pleno século 21, a Internet não deixa de ser uma espécie de "máquina do tempo", porque nos permite viajar e desbravar fronteiras ao clique de um simples botão. É preciso lembrar, entretanto, que os primeiros passos para a criação da Internet foram dados na década de 60, no século passado, para fins militares, o que não chegou a ser surpreendente, considerando que as duas guerras mundiais impulsionaram a ciência e a tecnologia. Porém, colocando de lado as intenções discutíveis dessas inovações, há motivos nobres a se ressaltarem em torno delas. Motivos que deram a ela esse caráter imprescindível que vemos hoje. A Internet, que trazia em seu projeto inicial o objetivo de ser uma rede de informação indestrutível a ataques militares, prestou-se também, já nos primeiros anos de existência, às instituições de ensino e pesquisa. É essa aplicação da tecnologia da informação e comunicação em rede a serviço da Educação que nos desperta para a verdadeira importância desta iniciativa. Felizmente, no Brasil o acesso à Internet já chegou como parte de um projeto de intercâmbio entre instituições científicas nacionais e estrangeiras. O compromisso era com a troca de experiências, conhecimentos e informações. Hoje, a Internet atingiu proporções indissociáveis da Educação, da formação humana e da conquista do saber. A força alcançada por esse meio é de tal proporção que se pode dizer, com boa margem de segurança, que a Internet se tornou um dos principais propulsores da melhoria das relações humanas e da interação entre os indivíduos a distância. Mesmo assim, faz-se necessário lembrar que a tecnologia é apenas um dos numerosos e eficazes caminhos para evoluir. É preciso evitar o que o filósofo Herbert Marcuse denominou de "o homem unidimensional" aquele que se especializou numa única linguagem e só consegue ver o mundo por meio dela. Seguindo nessa direção, do uso da tecnologia como ferramenta indispensável para melhor criação, produção e superação das limitações, lançamos recentemente um programa que disponibiliza uma rede integrada de comunicação para videoconferência em 89 localidades, operada no sistema Internet e de alta velocidade, a serviço dos professores da rede pública de ensino no Estado de São Paulo. A iniciativa, denominada "Rede do Saber" é um serviço essencial para o nosso programa de formação continuada dos educadores, que objetiva um constante crescimento técnico, intelectual, emocional e afetivo, especialmente num Estado com 645 municípios. Esse compartilhar de vivências e experiências que a "Rede do Saber" proporciona nos permitirá aprofundar o conhecimento do professor nas situações de aprendizagem e as contradições vividas nas salas de aula. Ao contrário da máquina do tempo do filme de Zemeckis, nossa "Rede do Saber" só tem aspectos positivos. É uma prova de que a Internet expõe uma face interessante do homem. Ele foi competente em converter a sua idéia individualista em algo capaz de tornar a sociedade mais comprometida com o desenvolvimento dos cidadãos. É isso: é preciso transformar sonhos em realidade sempre com responsabilidade e visando, sobretudo, o bem coletivo.


Publicado no Jornal Vale Paraíbano

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Educar é um ato de coragem e afeto

Desde as mais remotas civilizações, a convivência social foi um grande desafio. Mulheres e homens, crianças e velhos, cada um à sua maneira tentou ao longo dos tempos percorrer os caminhos da sabedoria para encontrar a tão sonhada felicidade. O ser humano é social, não vive sem o outro e, sem o outro, não consegue ser feliz. Nesse instigante espectro, podemos reconhecer a grandeza divina - somos mais de cinco bilhões de pessoas, e somos únicos. Não há duas pessoas iguais. Sonhos, medos, alegrias, desesperanças... Vida. Nesse mosaico fascinante é que se percebe a importância e a grandeza da arte de educar. Educar é um ato de cumplicidade, de troca, de amor. Educar é ato de vida, o caminho e o encontro da felicidade. Educar é arquitetar e construir o futuro, é o abnegado ofício de plantar e colher. O grande desafio da sociedade contemporânea está aí: educar! Garantir, pelo conhecimento, a liberdade e o desenvolvimento dos povos. O problema econômico mundial passa pela educação. Povo educado tem mais higiene, consequentemente mais saúde. Povo educado trabalha melhor, portanto tem mais produtividade. Ou seja, com bons níveis educacionais se gasta menos, se ganha mais. É comum termos contato com relevantes dados do mundo informacional, a revolução tecnológica, o progresso científico, os avanços da engenharia genética e outras espetaculares façanhas conquistadas pela mente humana. A máquina alcançou patamares impressionantes, é verdade. Entretanto, o ser humano chegou ao macro e ao microcosmos, mas, não chegou ao essencial. Se as viagens entre países e continentes ficaram mais rápidas e seguras, a viagem ao interior humano ainda é penosa, complexa e rara. Em pleno Século XXI ainda se fala em discriminação, preconceito, isolamento racial, social, econômico. Na vivência da era digital, ficção literária e cinematográfica, a violência não cedeu espaços à paz, a tão desejada paz entre mulheres e homens. Assim, podemos afirmar que a educação é um ato de coragem e afeto. Coragem, porque não será a máquina ou o computador que substituirão o maestro da orquestra, o regente do processo de saber, a essência da educação: o professor. Nesse contexto, a educação torna-se ainda mais importante. Afeto, porque educar é um ato de amor ao próximo e a si mesmo. Quem educa não apenas ensina como, permanentemente, aprende. Crescem ambos os que estão envolvidos nesse diálogo, o mestre e o aprendiz. Porque se confundem na mesma pessoa, na troca de conhecimento. Na evolução pelo saber. No equilíbrio do amar e ser amado, do dar e receber. No universo cada vez mais competitivo que ora vivemos, coube à escola também acumular a tarefa da educação como forma de preparar para a vida, como um todo. Construir homens e mulheres capazes de não apenas viver, mas, principalmente, entender a vida e participar dela de forma intensa. Gente que, pelo saber, exerça a liberdade com responsabilidade e saiba defender os seus direitos; verdadeiros cidadãos. Por tudo isso, o papel do professor tornou-se ainda mais importante. O ato de ensinar, de aprender e, junto com os alunos, descobrir novos e maiores horizontes passou a exigir ainda maior empenho e dedicação. No mundo globalizado, para que o professor consiga cumprir o seu compromisso de preparar de forma ampla para a vida cada um de seus alunos, é preciso ter em mente mais do que um bom projeto pedagógico, um bom aparato didático - é indispensável ter coragem e dar afeto. Nesse sentido, mais do que nunca, faz-se indispensável a valorização do professor. É primordial que, além da consistente formação acadêmica e prática, o professor possa ter acesso a constantes programas de atualização e desenvolvimento profissional, participe do projeto de educação do qual será o agente e, claro, seja remunerado com dignidade e tratado com respeito. O aprendizado transcende os muros da escola, ultrapassa os limites dos graus de formação, é necessidade constante de todos, professores e alunos, dentro e fora da instituição. Eis o grande desafio da sociedade e dos governos: desenvolver uma Educação substantiva. A escola deve ser um espaço sagrado, no qual a convivência seja prazerosa. É o sonho e a realidade que se misturam na nobre missão de construir uma sociedade iluminada. A revolução da Educação é a revolução da humanidade. Colheita de uma semeadura corajosa e competente. Luz que poderá fazer germinar uma geração sem preconceitos e discriminações; com menos violência e apatia. A revelação do melhor, a essência do bem, o encontro da felicidade.


Publicado no Jornal A Tribuna - Santos

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Luz, câmera... E ação!
No cultuado filme Ao mestre com carinho, temos uma análise sensibilíssima da influência do educador na vida de aprendizes com comportamentos agressivos e arredios. Jovens marginalizados, marcados pela realidade dura das regiões vulneráveis, dos guetos. Ambientes que imprimem em seus corpos e almas as insígnias da exclusão social, da carência de recursos, da ausência de opções de estudos, de trabalho e de lazer. O clássico, protagonizado pelo ator Sidney Poitier, nos mostra a situação limite vivenciada pelos adolescentes pertencentes às camadas desfavorecidas da população. Jovens descrentes, rebeldes e desestimulados justamente porque vêem à sua frente paisagens áridas, sem cor, caracterizadas pela projeção contínua de cenas nada animadoras. Imagens que revelam uma seqüência ininterrupta de destinos tristes, desprovidos de perspectivas positivas. Heranças que vêm, geralmente, de famílias desestruradas, lares destruídos, infâncias traumáticas. São experiências extremas, eficazes para minar as expectativas de quem deveria trazer no sangue a seiva do viço, da energia, da disposição. Rapazes e moças que dispõem, inclusive, do tempo como aliado. Tempo que pode ser um fardo para quem tem o histórico dramático desses adolescentes retratados pelo filme - ícones que representam os jovens que vivem a dor de serem vistos como párias. Nesse cenário repleto de desencanto, a missão de Mark, professor interpretado por Poitier, era despertar nesses alunos o que tinham de mais precioso e desconhecido: a capacidade de sonhar, de transformar, de acreditar em si mesmos, de se reconhecerem como escritores habilidosos da história de suas próprias vidas. Outras produções cinematográficas trouxeram à tona dramas semelhantes, que enfocavam a saga de educadores-redentores, homens e mulheres movidos a entusiasmo e a esperança, como a professora interpretada por Michelle Pfeiffer em Mentes Perigosas ou o professor vivido pelo excelente Morgan Freeman em Meu mestre, minha vida. Portadores do gene sonhador de Quixote, esses educadores nos emocionam e nos fazem refletir sobre o quanto ainda é possível fazer pelos nossos aprendizes. Crianças e jovens espalhados por todos os rincões do Brasil. Aprendizes como os meninos e meninas da Febem. Adolescentes à espera de afeto, atenção... Sedentos por oportunidades que lhes possibilitem o conhecimento de seus potenciais e talentos adormecidos. O governo do Estado de São Paulo, na figura do governador Geraldo Alckmin, já está atento para essas necessidades. Prova disso é que acaba de autorizar a contratação de 2.000 estagiários oriundos da Febem, que serão treinados por um pool de empresas e instituições, entre elas Fundação Bradesco, Centro Paula Souza, Senac, Senai e Canal Futura. Os jovens irão atuar como monitores de informática e de bibliotecas nas escolas da rede pública de ensino. As vagas representam a liberação de cerca de 40% do total de internos da Febem, hoje em torno de 5.500 adolescentes. É um passo importante, mas esperamos que seja apenas o primeiro rumo a um futuro mais promissor para esses jovens. Em breve, esperamos vê-los atuando nos mais variados setores do mercado. Empresas privadas, rede de hotéis, restaurantes, grandes magazines, shoppings centers e demais organizações poderão oferecer a esses adolescentes a chance de sonhar e de viver uma história diferente, com enredos e cores muito mais vibrantes e propícios a uma atuação verdadeiramente heróica. Será a confirmação de que a sociedade, como um todo, participará de forma pró-ativa na criação de um novo tempo. É isso. É preciso olhar esses aprendizes com olhos de educadores. Olhos de quem jamais perde a esperança. Olhos de quem acredita que é possível mudar, sempre, para melhor. A Febem tem um roteiro complexo, marcado por problemas que não podem ser vencidos de uma hora para outra. Não há milagre. Educação é processo. Temos um enorme desafio, mas estamos dispostos a enfrentá-lo e a transformar esse filme num espetáculo tão bonito quanto o da peça Dom Quixote - Num lugar de la Mancha, protagonizada - vejam só que maravilha! - pelos atores da Oficina de Artes da Febem. Jovens que nos ensinam ser possível transformar sonhos, mesmo que pareçam quixotescos, em realidade. Se todos assumirmos o compromisso de olhar e de agir como educadores, poderemos dar, diretores que seremos, um final muito mais belo para essa história. E, às platéias do futuro, restará aplaudir de pé, orgulhosas pelo modo corajoso e competente com que praticamos essa AÇÃO.


Publicado no Diário de S. Paulo

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O poder de fogo da educação


Algumas palavras têm o poder de trazer consigo uma imensa carga de sentimentos, emoções, expectativas, sonhos, desejos e quereres. São, a um só tempo, misto de poesia, de filosofia, de arte... Expressá-las e professá-las pode significar a mudança, a transformação, a transcendência. A junção de suas sílabas tem uma força capaz de mudar o mundo e, em casos extremos, funciona como um artifício bélico do bem, utilizado pelos desbravadores de novos tempos e pelos descobridores de novos caminhos. São armas que injetam ânimo, coragem, sensibilidade, talento. Dessa forma, podemos definir o amplo leque de sentidos e potencialidades da palavra educação, cuja beleza está em desvendar novos amanhãs e promissores horizontes. A todos nós, educadores, foi concedida a oportunidade de contribuir para promovê-la, transmitindo e propagando o desejo pelo conhecimento. Colaboramos para a criação de realidades mais belas e mais condizentes com os nossos sonhos. Faz parte da natureza humana querer sempre o melhor. Buscar a evolução, o desafio, a superação de limites. Façanhas impossíveis sem a educação como fundamento e passaporte. Ciente da grandiosidade dessa missão e de tudo o que ela pode proporcionar, o governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Estado da Educação, tem trabalhado para fazer da rede estadual de ensino uma ponte capaz de levar nossos 6 milhões de alunos à aquisição de saberes, de competências e de habilidades capazes de torná-los cidadãos críticos e conscientes, aptos à construção de um futuro erguido sobre os pilares da infinita capacidade humana (que deve ser desenvolvida, incentivada e constantemente aguçada). Nossos programas, projetos e ações têm o objetivo primeiro de despertar mentes e corações para o prazer do aprendizado, da revelação, da epifania que caracterizam o fascinante processo da descoberta. Está sob nossa responsabilidade formar atores sociais talentosos, com maturidade intelectual e emocional suficiente para alcançar não apenas o sucesso profissional, mas a felicidade plena, em todos os aspectos de suas vidas. Todos os nossos alunos compõem um complexo contingente educacional, mas, ao mesmo tempo em que formam um grupo, uma coletividade, são também seres únicos, dotados de histórias de vida singulares, ricas e de natureza incomparável. São meninos e meninas, crianças e jovens provenientes das mais diversas realidades e origens. Muitos vivenciam uma infância e uma adolescência repleta de amor, de cuidado, de atenção e de incentivo de suas famílias. Outros, no entanto, sobrevivem a duras penas numa atmosfera densa, pesada, em nada parecida com o que deveria ser o aconchego e a proteção de um lar estruturado. São desprovidos dos referenciais mais básicos e têm por alimento da alma apenas a esperança depositada em dias melhores. Felizes ou apenas esperançosos têm, como todos nós, carências, problemas, alegrias, vontades, medos, posturas e os mais heterogêneos sonhos. Some-se a isso o fato de estarem atravessando uma fase de formação, de intenso aprendizado, de dúvidas, de questionamentos, de buscas incansáveis... Têm o privilégio, e também a grande responsabilidade, de ter todo um futuro pela frente. Nesse sentido, nossas políticas públicas educacionais levam em consideração, em primeiro lugar, as necessidades mais básicas desses cidadãos do futuro: a compreensão, o respeito por suas diferenças, por seus valores e pela história pessoal de cada um.O desempenho, o sucesso e a ampliação do potencial dos aprendizes dependem de nossa sensibilidade para vê-los como seres humanos e não apenas como números registrados nas listas de chamada. Por meio dessa prática, nós, educadores, poderemos ter a chance de ir além e de também aprender com nossos educandos. Sem essa troca essencial, estamos condenados a perder o brilho, a seiva, o norte... Educar é, sobretudo, nunca deixar de aprender e de acreditar. O primeiro passo para fazer da educação uma possibilidade real para todos já foi dado na medida em que promovemos a universalização do ensino. Os números mais recentes apontam um total de 99% de crianças freqüentando a escola no Estado de São Paulo. Uma vez garantido o acesso aos bancos escolares, nossos esforços convergem diretamente para as melhorias nas condições de aprendizagem - decorrentes do reflexo direto da mudança de filosofia da cultura escolar. Agora, singramos os mares de forma mais habilidosa porque navegamos com um lema comum a todas as nossas rotas: "todo professor é capaz de ensinar, todo aluno é capaz de aprender". E o inverso é absolutamente verdadeiro. Um lema que nos faz respeitar, por exemplo, o ritmo próprio de aprendizado e de assimilação de conteúdos de cada estudante. Um direito do indivíduo que vinha sendo relegado, mas que ganhou força com a implantação, em janeiro de 98, do regime de progressão continuada da aprendizagem, que possibilita o avanço contínuo dos alunos ao longo do percurso escolar, organizando o Ensino Fundamental em dois ciclos de quatro anos cada. Para ampliar os benefícios dessa prática aos estudantes de níveis mais avançados, adotamos a flexibilização do currículo no ensino médio, permitindo a matrícula por disciplina e evitando que o aluno refaça componentes nos quais foi bem-sucedido. Nessa viagem de importância histórica, a sociedade civil organizada tem sido nossa grande companheira. Empresas, igrejas, ONGs, universidades, entidades e associações variadas têm contribuído para que nossos alunos e professores desfrutem uma formação intelectual, física e emocional sólida, com direito ao esporte, à cultura, ao lazer, à arte, à profissionalização, à saúde e, enfim, à conquista de uma vida melhor. Juntos, temos viabilizado a capacitação constante dos educadores por meio de cursos, palestras, teleconferências e congressos. Em dezembro, por exemplo, presenciamos a formatura de 7 mil professores pelo programa PEC - Formação Universitária , programa de educação continuada, cujo objetivo é fornecer aos professores efetivos no ensino da 1ª à 4ª série, com formação de nível médio, de mais de 2 mil escolas de ensino fundamental do Estado, a oportunidade de formação em nível superior fornecida pela USP, Unesp e PUC-SP. Em todas as capacitações, encontros, visitas às escolas e conversas com os representantes da categoria, sempre ressaltamos a importância da aliança entre o aperfeiçoamento técnico do professor e a solidificação de uma postura afetiva em sala de aula. Queremos que nossos aprendizes enxerguem no mestre um exemplo a ser seguido, um amigo com quem possam contar e não uma autoridade acima do bem e do mal. Nas escolas, muitos programas e projetos têm favorecido essa prática mais afetiva e integrada. Os alunos sentem-se incentivados a participar, a descobrir e a mostrar seus talentos. Por isso, é fundamental que a comunidade do entorno escolar e da sociedade como um todo prestigie os eventos constantemente promovidos pelos estabelecimentos de ensino. Foi o que a secretaria - juntamente com a população que transitava pelo Centro de São Paulo - fez durante o mês de dezembro de 2002. Nossos funcionários uniam-se aos populares, sempre ao meio-dia, na Praça da República, para prestigiar os corais natalinos de dezenas de escolas estaduais provenientes das mais diversas regiões do Estado. O programa dos corais nas escolas, bem como aqueles ligados à música clássica, ao teatro, ao cinema, à criação de bandas e fanfarras, à preservação do meio ambiente, ao exercício dos direitos e deveres do cidadão - fortalecimento e reativação dos grêmios, campanhas comunitárias, combate às drogas e à violência, etc. - têm propiciado uma revolução verdadeiramente positiva na vida dos estudantes. Programas como Parceiros do Futuro, Comunidade Presente, Prevenção Também se Ensina, Escola em Parceria, Mutirão da Cidadania e Programa Profissão estão, na verdade, plantando sementes e oferecendo não só para São Paulo, mas para todo o Brasil, a chance de ter, num futuro breve, uma colheita digna dos anseios e do trabalho de todo o seu povo. Que as nossas palavras, corroboradas - e impregnadas - pela verdade impressa em nossas ações, possam colaborar para a discussão, para o debate e para a reflexão em torno dessa educação afetiva e eficaz. Uma educação que privilegia a criação de gerações mais capacitadas, tanto para contribuir para o desenvolvimento e o progresso da ciência quanto para desfrutar todos os seus benefícios. Uma educação que oriente e funcione como a bússola que desvenda as infinitas maneiras de navegar, com sucesso, pelos mares da vida.


Publicado na Gazeta Lemense

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Febem - Um desafio possível

Paulo Lins, autor do romance Cidade de Deus - sucesso adaptado com genialidade por Fernando Meirelles para as telas do cinema -, captou com maestria a realidade cruel e dolorosa de crianças e jovens que, corrompidos pelo meio (leia-se ausência total de oportunidades, incentivo, educação e estruturação familiar), ingressaram no universo da marginalidade e da violência. O mesmo teria acontecido, provavelmente, à pequena e indefesa "Negrinha", personagem imortalizada pelo conto homônimo de Monteiro Lobato, caso a menina tivesse nascido no final do século 20, longe dos resquícios da escravidão das fazendas, mas próximo à escravidão social dos ambientes urbanos. Mais uma vez, a ficção - seja literária, seja cinematográfica - nos dá uma lição de vida imprescindível: ou a sociedade compreende a necessidade premente de romper o ciclo vicioso da criminalidade ou estaremos condenando o futuro do Brasil e do mundo de forma irreversível. Somente a mobilização social, por meio da união de esforços entre governos e demais instituições da sociedade civil organizada, pode reverter o rumo caótico que os acontecimentos vêm tomando. Em todo o mundo, os altos índices de violência, que agora se expandem em ritmo acelerado das metrópoles em direção às cidades do interior, compõem um quadro dramático cujos desenhos dantescos nos convidam à tomada de ações imediatas. Em São Paulo, o governador Geraldo Alckmin demonstrou total sintonia com a urgência dessa situação. Por meio de uma atitude corajosa e inovadora, integrou a Febem aos quadros da Secretaria de Estado da Educação, uma iniciativa fundamentada sobre os pilares de um conceito básico para a recuperação dos adolescentes em conflito com a lei: a ressocialização via aprendizado, preparo psicológico, acesso à informação, à cultura, ao esporte e ao lazer. Um método que resulta na aquisição da auto-estima e da autoconfiança, provenientes da descoberta gradativa dos talentos e das potencialidades dos educandos - da mesma forma que deve ocorrer com os alunos do ensino regular, nas escolas. Assim é que se adquire consciência crítica, capacidade de discernimento e, enfim, se constrói a cidadania. É essa a nova proposta da Febem, totalmente condizente com os projetos e ações da Secretaria de Estado da Educação. Temos um enorme desafio pela frente. E, para que possamos superá-lo de forma eficaz, precisaremos do apoio, do incentivo e da colaboração de todos os segmentos sociais. Nesse sentido, gostaríamos de convidar empresas, ONGs, igrejas, universidades e demais instituições para nos auxiliar na missão instigante que é reescrever o roteiro desse filme grandioso e, por isso mesmo, complexo em toda a sua estrutura. Se assumirmos os papéis de diretores, cenógrafos e produtores que essa grande obra requer, poderemos mudar a história de milhares de jovens atores que necessitam de uma orientação mais cuidadosa na concepção, na criação e, finalmente, na concretização de cenas que viabilizem finais mais felizes para suas vidas reais. A ampliação dos programas de liberdade assistida e a construção de unidades menores da Febem, tanto na Capital quanto no Interior, privilegia essa nova realidade e tem possibilitado às equipes da instituição a realização de um trabalho mais produtivo e bem-sucedido, capacitando esses jovens e transformando-os em protagonistas aptos a exercerem sua plena cidadania. Milhares de jovens atores estão aprimorando suas habilidades por meio de aulas do ensino regular e profissionalizante, diversas oficinas de arte, cultura (teatro, dança, artesanato) e, ainda, 32 modalidades esportivas que abrangem do futebol ao xadrez. E isso é só o começo. De nossa parte, garantimos total dedicação e empenho para dar a este enredo um desfecho verdadeiramente alegre, bem diferente dos finais da maioria dos personagens da obra de Paulo Lins e da protagonista do conto de Lobato. Acreditar que é possível é essencial. Vamos seguir à risca a cartilha de Victor Hugo - outro grande ficcionista que retratou em seus livros as injustiças e problemas sociais de seu tempo - que já alertava: "Nada melhor do que um sonho para criar o futuro".


Publicado no jornal Diário de S.Paulo

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Volta às aulas: aprendizagem, ficção e vida real

Aos sete anos de idade, o menino está tenso, preocupado e repleto de expectativas sobre o seu primeiro dia de aula. A recepção na escola não é das melhores, porém, as sensações da má experiência vivenciada pelo garoto Moncho conseguem ser rapidamente dissipadas graças à habilidade, à generosidade e à extrema dedicação de seu professor, o velho mestre Don Gregorio. Os dois personagens protagonizam o belíssimo drama espanhol A Língua das Mariposas (1999), filme dirigido por José Luís Cuerda, que narra de maneira delicada as fascinantes possibilidades do processo ensino/aprendizagem, com ênfase na cumplicidade entre professor e aluno. A trama tem como pano de fundo a ascensão do regime militar espanhol e as conseqüências desse processo em uma pequena cidade daquele país, representada por uma população atemorizada e desprovida de mecanismos para exercer e/ou apoiar a resistência então praticada por um pequeno grupo de opositores ao sistema opressor, do qual fazia parte o professor Don Gregorio. O cinema, mais uma vez, nos oferece condições para que possamos refletir e analisar a nossa própria realidade, independentemente das diferenças históricas e culturais experimentadas pelos espectadores em seus países de origem. A essência das relações humanas, os sentimentos, os temores, os erros e acertos das personagens da trama sempre nos ensinam algo. No caso da obra em questão, tentaremos, aqui no Estado de São Paulo, reproduzir, neste dia 10 de fevereiro, primeiro dia de aula na rede estadual de ensino, um pouco da poesia e da beleza transmitidas pelo filme de Cuerda no que diz respeito à prática educativa e à relação educador/educando. Realizaremos uma experiência singular, que pretende fortalecer significativamente a parceria entre escola e comunidade, uma das principais metas da Secretaria de Estado da Educação para 2003. Neste primeiro dia de aula, pais, mães, irmãos e amigos dos estudantes são os nossos convidados para essa verdadeira festa educacional, que reúne cerca de seis milhões de alunos, em mais de seis mil estabelecimentos de ensino. Pensando na grandiosidade que envolve esse evento, as escolas organizaram uma recepção calorosa, cujo objetivo é tornar esta data uma experiência positivamente inesquecível para educadores, educandos e comunidade. O roteiro inovador dessa nova história da educação será escrito de forma concomitante por educadores, funcionários das unidades educacionais, alunos e toda a população que vive no entorno das escolas. Nossos convidados poderão conhecer as instalações dos prédios escolares, seus profissionais e o projeto pedagógico adotado nas unidades. A programação inclui ainda atividades como vivências e sensibilizações. A idéia é reforçar em todos os participantes a consciência de que a escola é um centro de luz, um lugar que recebe e que propaga saberes, conhecimentos, aprendizados, descobertas... O século 21 exige uma escola em constante transformação, como é a própria vida. Uma escola pulsante, que instigue o aluno a ser um desbravador, um criador, um inventor do seu próprio caminho. Nesse contexto, a participação ativa da sociedade na escola é essencial. Ela será o elo entre os educandos e o mundo à sua volta, auxiliando na criação de um ensino cada vez mais comprometido com a resolução dos problemas enfrentados pela comunidade. Assim, os alunos poderão exercer papéis sociais de destaque enquanto ainda estiverem em processo de formação, o que contribuirá para o seu crescimento emocional e intelectual, originando gerações muito mais críticas e conscientes de sua cidadania. Governo e sociedade devem unir esforços no sentido de oferecer um ensino de qualidade às crianças e jovens que representarão o capital intelectual do país e que fortalecerão, cada vez mais, o espírito democrático e todos os seus valores. Em seu livro Gramática da Fantasia, o educador italiano Gianni Rodari nos oferece uma síntese perfeita da importância dessa questão, quando nos lembra que a principal disciplina em todas as escolas deveria ser justamente "a realidade, abordada por todos os pontos de vista, a começar da realidade primeira, a comunidade escolar (...). Em uma escola desse tipo, a criança não é mais uma 'consumidora' de cultura e de valores, mas uma criadora e produtora de valores e cultura". Que nesse retorno às aulas todos possamos refletir sobre isso e, mais importante, contribuir para tornar esse conceito uma realidade. Nesse sentido, estamos esperando a presença de todos vocês, pais, mães, irmãos, amigos e demais representantes da comunidade na escola neste dia 10, dando início a um novo e instigante aprendizado para todos.


Publicado na Folha de S.Paulo

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Leitura: uma odisséia rumo à descoberta

É impressionante como o mar e a leitura estão ligados de forma indelével há milhares de anos. O escritor argentino Jorge Luis Borges - amante inveterado dos livros - dizia uma frase que sintetiza bem esse conceito: "Toda a literatura declina de Homero". A afirmação impactante do autor de Ficções expõe a importância do poeta grego, cujas obras Ilíada e Odisséia podem ser consideradas verdadeiros marcos da literatura ocidental. Ambos são belíssimos, mas, em Odisséia, Homero criou uma das mais belas e instigantes histórias já escritas e na qual o mar exerce um papel fundamental no desenvolvimento de seu enredo. Afinal, o que seria de Ulisses (ou Odisseu) sem o mar como pano de fundo para suas aventuras? Da mesma forma, Luís de Camões e Fernando Pessoa - para citar apenas dois ícones da literatura de língua portuguesa - muitas vezes fizeram uso da pena para versificar sobre o mar, sua grandiosidade, sua imponência, sua beleza e sua relevância crucial para o progresso da civilização (grandes descobrimentos, novas rotas de navegação, possibilidade de expansão econômica, comercial etc.) Por meio da História e da Literatura, percebemos que o mar sempre foi palco de grandes aventuras, conquistas e numerosos feitos heróicos da humanidade. Esse mesmo sentimento de descoberta, de desbravamento e de heroísmo presente no espírito dos grandes navegadores também se apodera de todos os personagens reais da vida quando se envolvem, se entregam e se deixam levar pela fascinante viagem proporcionada pela leitura. Quando nos tornamos leitores e passamos a apreciar e valorizar devidamente essa condição, percebemos o quão maravilhoso é poder desvendar o universo e cruzar suas fronteiras de forma ilimitada. Em outras palavras, ler é singrar os mares em direção à esplêndida aventura do conhecimento e do aprendizado. Temos nos livros uma espécie de bússola que nos orienta - piratas e vikings curiosos e sedentos de experiências diversas - na direção exata de um tesouro singular: o saber. Passaporte imprescindível para quem deseja realizar a verdadeira viagem da vida. Neste novo tempo em que o verbo "navegar" ganhou conotações cibernéticas devido às novas ferramentas tecnológicas que nos auxiliam na busca contínua do entretenimento e da informação (leia-se internet), é preciso deixar claro: nada substitui o prazer e os ganhos proporcionados pela leitura de um bom livro. Sem uma sólida formação cultural, acabamos por subutilizar tanto a rede mundial de computadores como todas as demais criações tecnológicas, recebendo suas informações de forma fragmentada e descontextualizada. A leitura nos fornece as condições necessárias para ampliarmos nossos horizontes ao infinito. Aumentamos nossa capacidade crítica, nosso poder de argumentação, de discernimento, de persuasão... Adquirimos a força, a coragem, o entusiasmo, o dinamismo e o espírito adequado para enfrentar as grande tempestades, turbulências e desafios da jornada. Os livros nos credenciam para empreender com sucesso as expedições mais variadas, traçando o rumo de nosso próprio destino com talento, sabedoria e confiança. Em seu poema O Livro e a América, o poeta brasileiro Castro Alves mescla com maestria a relação metafórica mais do que pertinente entre o livro e o mar. Uma visão magistral e que, certamente, irá nos inspirar para que prossigamos esta reflexão que apenas iniciamos : "Oh, Bendito o que semeia / Livros... livros à mão cheia... / E manda o povo pensar! / O livro caindo n'alma / É gérmen - que faz a palma, / É chuva - que faz o mar".


Publicado na Revista E - Sesc SP

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Aprendizes eternos

"Mestre não é só quem ensina; mas quem, de repente, aprende." A frase lapidar de Guimarães Rosa é perfeita para ilustrar este momento histórico da educação paulista. Em dezembro, sete mil e quinhentos professores da rede estadual de ensino realizaram um sonho e conquistaram uma vitória inédita em suas vidas. Os docentes concluíram sua participação no PEC - Formação Universitária, programa de educação continuada cujo objetivo é fornecer aos professores efetivos no ensino da 1ª à 4ª série, com formação de nível médio, de mais de 2.000 escolas de ensino fundamental do Estado, a oportunidade de formação em nível superior fornecida pela USP, Unesp e PUC-SP. Esses profissionais deram um salto qualitativo sem precedentes em suas carreiras na medida em que vivenciaram e venceram os desafios impostos pelo mundo acadêmico, ampliando seus horizontes pessoais e profissionais. A universidade propicia a aquisição de saberes variados, edificados por meio das reflexões, das contestações, das discussões e dos debates inerentes à formação superior. Essa experiência forneceu aos educadores a chance de estabelecer contato com as mais modernas tecnologias interativas voltadas para o ensino, o que surtirá efeitos bastante positivos na prática docente. O processo de atualização ininterrupta dos professores é fundamental para o aumento da qualidade de ensino nas escolas estaduais. É importante que os educadores adquiram uma visão ampla do processo educacional, analisando e avaliando as novas tendências da educação do século 21, bem como a consciência sobre o papel crucial que desenvolvem na formação de uma geração mais crítica, participativa e cidadã. O reflexo dessas percepções é imediato. As aulas tornam-se mais dinâmicas e produtivas, instigando a participação dos alunos e colaborando para o sucesso do binômio ensino-aprendizado. Se há uma integração positiva entre mestres e aprendizes, o professor passa a ser um referencial efetivo para o aluno, que, por sua vez, absorve os ensinamentos e transforma-se em agente multiplicador desses conhecimentos em sua comunidade de origem. É o início de modificações significativas que se expandem em todos os níveis da pirâmide social. A educação é uma prioridade para o governo Geraldo Alckmin, cuja gestão é alicerçada pelos ideais verdadeiramente democráticos. Nas palavras do grande educador brasileiro Anísio Teixeira: "Nascemos desiguais e nascemos ignorantes, isto é, escravos. A educação faz-nos livres pelo conhecimento e pelo saber e iguais pela capacidade de desenvolver ao máximo os nossos poderes inatos. (...) Democracia é, literalmente, educação". Acreditamos nesse conceito e, por isso, não estamos medindo esforços para a valorização dos professores e para a melhoria gradativa das unidades escolares. Prova disso é que, assim como o PEC, dezenas de outros programas estão causando uma revolução fantástica no dia-a-dia da educação de São Paulo. Nosso próximo passo é viabilizar o programa Bolsa-Mestrado, que prevê financiamento dos cursos de mestrado para os professores da rede. Outra coisa importante e que já está sendo feita é a transformação das 89 diretorias regionais de ensino em núcleos de capacitação permanente para os professores da rede, proporcionando treinamento para os docentes de suas respectivas regiões. Essa medida vai agilizar todos os processos relativos à educação continuada dos educadores. Nosso desejo é implementar uma formação de excelência, pautada no diálogo franco e aberto com os profissionais da área educacional e na concretização de parcerias com empresas, ONGs e demais instituições sociais. Estamos realizando debates frutíferos sobre o tema, como ocorreu na Semana de Estudos "A Escola dos Nossos Sonhos", realizada em novembro e que deu origem ao Fórum Permanente "A escola dos nossos sonhos" e ao Fórum Regional "Parceiros da Escola". Todas essas iniciativas, aliadas ao nosso entusiasmo em dar prosseguimento a elas, nos dão a certeza de que o ano de 2003 será decisivo na solidificação dessa proposta de uma educação de ponta, voltada à formação integral do ser e à construção de uma realidade mais justa, fraterna e igualitária. E os professores são, sem dúvida, os grandes executores dessa nova política educacional. Semeadores incansáveis cuja missão é fazer germinar no coração dos aprendizes o amor pelo saber - esse parceiro inseparável na jornada rumo à felicidade.


Publicado no Jornal A Tribuna - Santos

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A revolução da rede

"A boa educação é moeda de ouro, em toda parte tem valor." A afirmação, proferida há séculos pelo padre Antônio Vieira, parece adquirir, a cada dia, um significado ainda mais contundente e atual. Isso se deve ao fato de estarmos vivenciando uma época sem precedentes na História. Um período tão complexo quanto fascinante porque oferece - na mesma proporção - um sem-número de possibilidades e de incertezas. Em meio a esse quadro inacabado que esboça um futuro nebuloso, quem não dispõe de um ensino de qualidade torna-se um sério candidato à exclusão social gradativa. Explica-se: não há mais lugar para amadores na galeria do século 21. Nesse sentido, é papel das três esferas do Governo e de todos os segmentos da sociedade civil organizada mobilizarem-se para propiciar uma educação de excelência às nossas crianças e jovens. Para que isso ocorra, os investimentos no setor precisam ter caráter prioritário e, em paralelo, deve haver a ampliação e o aprimoramento de parcerias entre escolas, empresas, fundações, ONGs e outras instituições. A participação efetiva dos pais e da comunidade do entorno escolar nas unidades educacionais é outro ponto importante desse processo, bem como a concentração de esforços por parte dos educadores e demais atores sociais em torno da concepção e da implementação dessa educação eficaz e cidadã. Juntas, essas ações irão possibilitar a devida formação do capital intelectual brasileiro, constituído pelas novas gerações a partir do desenvolvimento de suas habilidades cognitivas, sociais e emocionais. Trata-se de instrumentalizar esses jovens para que elevem o Brasil a uma posição de destaque no cenário competitivo e globalizado do novo milênio. Trata-se de orientá-los para o resgate dos valores essenciais à vida em sociedade, de forma que a paz e a fraternidade imperem no lugar da violência, da intolerância e dos conflitos generalizados. Trata-se de capacitá-los para o exercício pleno de sua consciência crítica. Por tudo isso, a Secretaria de Estado da Educação tem organizado uma série de ações, projetos e programas que viabilizam a discussão, o debate e a reflexão sobre os mecanismos que irão estruturar esta educação modelar que desejamos instituir em todas as escolas da rede estadual de ensino. Um exemplo ocorreu entre os dias 26 e 29 de novembro, quando reunimos vários setores da sociedade no evento denominado Semana de Estudos "A Escola de Nossos Sonhos". Esse debate inicial deu origem ao Fórum Permanente "A Escola de Nossos Sonhos" e ao Fórum Regional "Parceiros da Escola". O primeiro pretende aglutinar, num único espaço, setores da sociedade que possam colaborar para a reflexão relativa ao aprimoramento da escola pública, o segundo ficará a cargo das regiões administrativas do Estado, juntamente com as 89 diretorias regionais de ensino. A intenção é que seja produzido um documento com propostas e análises das ações da Secretaria de Estado da Educação e que apontem soluções concretas para a construção dessa Escola-Cidadã. O primeiro passo para esse processo de discussão conjunta foi dado por meio das palestras, teleconferências e encontros que já vêm sendo realizados pela Secretaria com o objetivo de lançar um olhar crítico para o setor e buscar alternativas para os problemas de uma rede com mais de 6 milhões de alunos. Temos pela frente um grande desafio: fazer do Brasil uma nação ainda mais soberana e condizente com a fortaleza que é o seu povo. São Paulo, como sempre, pode e deve ser a locomotiva que nos conduzirá em direção a esse novo horizonte que se descortina. Nossa filosofia de trabalho é pautada no diálogo, na troca de experiências e na constante avaliação e análise de nossas ações pela sociedade. Cremos ser essa postura não apenas uma exigência, mas um benefício proporcionado pelo exercício democrático. O Governo Geraldo Alckmin defende esses princípios e os solidifica na medida em que assumiu um compromisso fundamentado nos pilares do desenvolvimento, da educação, da prestação de serviço e da solidariedade. Convidamos toda a sociedade a participar ativamente dessa proposta imprescindível ao crescimento de São Paulo e do Brasil. Vamos dar o exemplo e unir forças. Esse é o melhor ensinamento que podemos deixar aos que irão nos suceder. Sêneca, o filósofo, já atentava para isso quando disse: "Longo é o caminho do ensino por meio de teorias; breve e eficaz por meio de exemplos". Que todos tenhamos a sabedoria para apreender a grandeza dessa lição.


Publicado no Diário do Grande ABC

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A descendência de Cervantes


Professor. Uma palavra de traduções diversas que encerra significados tão numerosos quanto belos. Um termo apropriado àqueles que acreditam na grandiosidade da doação, do altruísmo e da capacidade de despertar outros seres humanos para a aventura ímpar do aprendizado e da transcendência. Neste dia 15 de outubro, é importante refletir sobre esse profissional, que dedica sua vida à propagação de saberes. Saberes que possibilitam aos aprendizes ultrapassar fronteiras, superar obstáculos e articular estratégias que os conduzem em direção à realização de seus sonhos. Cheios de uma poesia própria, ousam desafiar o renomado poeta Vinícius de Moraes, na medida em que vivem e preconizam um amor imortal - posto que não é chama, contrariando o famoso verso do "Soneto da Fidelidade". Quantos milhões de professores terão o Brasil e o mundo? O que seria da sociedade sem a participação efetiva e compromissada desses homens e mulheres? Educadores que, todos os dias, somam, multiplicam e dividem tudo o que têm de mais precioso com centenas de crianças e jovens. Discípulos que assimilam, às vezes sem se dar conta, a essência do verbo compartilhar. Nas salas de aula do mundo, mestres e aprendizes ensaiam um balé sincrônico e ritmado, embalados pela musicalidade do amor, do conhecimento, do afeto, do respeito, dos sorrisos e dos olhares de confiança mútua. Educandos devem nutrir por seus professores um sentimento de admiração que inspire o respeito. Nessa relação, não deve haver lugar para o autoritarismo e para o medo, coreografias incompatíveis com o espetáculo majestoso da vida. Educadores... Como recompensá-los por tudo que nos proporcionam? Como agradecer-lhes da forma que merecem? E, principalmente: como retribuir sua força e seu exemplo seguro e altivo nos momentos em que fraquejamos e pensamos em desistir de tudo? Como resgatar sua auto-estima, cada vez mais abalada por este mundo que privilegia os bens materiais em detrimento de valores como a ética, a fraternidade, a justiça e o amor ao próximo? Como devolver aos professores o seu lugar de destaque na sociedade? Sejamos sinceros: não temos todas as respostas e nem tampouco pretendemos posar de donos da verdade, mas esta homenagem tem o intuito de propiciar aos leitores uma reflexão sobre essas pessoas iluminadas que nos presentearam com as condições para obter o alimento do corpo e do espírito. Uma reflexão sobre os nossos mestres e o papel imprescindível que desempenham em nossas vidas. Seres raros que vivem sob os signos diversos, mas complementares, da paixão e da razão. Exemplos de vida que nos transmitem lições essenciais à construção de nossas histórias. É esse o perfil da grande maioria dos educadores - crianças crescidas que, tal qual Peter Pan, se recusam a deixar de sonhar. E prosseguem incansáveis, dia após dia, capacitando seus alunos rumo à descoberta de suas potencialidades e talentos. Dia após dia, contribuindo para formação de personalidades e de cidadãos que transitem apenas pelo caminho do bem. Espécies encantadas como foi um dos mestres que tive na vida: professor André Franco Montoro, um jovem eterno que, mesmo tendo completado 60 anos de magistério, entrava para dar aula com o entusiasmo de um iniciante. A paixão de Franco Montoro era conhecida por muitos. A maioria de nossos educadores é constituída por heróis anônimos que lutam, muitas vezes, empunhando apenas o giz e a boa vontade. Heróis que atravessam a seca, os igarapés ou mesmo o trânsito alucinante das metrópoles com o objetivo único de semear idéias, honestidade, honradez, boa vontade, oportunidades, ideais, criatividade e autoconfiança. Professores são descendentes diretos da linhagem onírica criada por Cervantes em seu Dom Quixote. Sonhadores e idealistas que pairam muito acima de ideologias políticas, filosóficas ou religiosas. Preferem se ocupar com questões maiores: levam a vida a professar a educação e tudo de positivo que ela representa. Que, nesta data comemorativa e sempre, saibamos reconhecer seu valor e devolver-lhe a dignidade luzidia de um passado recente, mas que já traz muitas saudades.


Publicado na Folha de S.Paulo

Inserida por fraseschalita

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