Textos de Fracasso
quero a poesia alta e superior
a que se eleve acima do corpo
capaz de transcender a lucidez
como se o sonho da montanha
fosse mais importante e nobre
que a própria subida à montanha
uma poesia que não obedeça
ao circadiano ritmo dos homens
uma poesia portanto sem o ritmo
perpendicular da língua no céu
cheio de uma tonalidade viva
que não seja o azul celeste
quero a poesia que incapacite
os homens ásperos da terra
incapazes da vigília letárgica
de um astro que os queime.
(Pedro Rodrigues de Menezes, "um cometa chamado poesia")
pai
não tenho memórias
desde que mostraram
a mortalha coerciva
cercando o teu corpo
pai
ouvia dizeres “é a fingir”
eu ria e dizia “é a fingir”
por isso todos acreditaram
que a minha extravagância
era um produto da loucura
pai
como se na aritmética
da vida que continua
e do tempo que passa
coubesse alguma lógica.
(Pedro Rodrigues de Menezes, "aritmética do luto")
uma flecha que anoitecesse no tempo
lugar, pedaço de terra, erva ou árvore
uma flecha que resistisse implacável
à biologia de uma meia volta de Úrano
sem a subtracção de uma soma
este lugar contém o mesmo
azul celeste sem ser galáctico
poalha invisível sem ser cósmico
é este o lugar onde renascem
os primeiros homens órfãos
do destino sem distinguirem
a mortalidade do seu tempo
densos e altos e firmes poentes
ave, voo pleno ou plano boreal
desvelam frondosos sobre a água
o misticismo das sereias mudas
ninguém as vê plantando os peixes
ninguém as vê caminhando sobre o céu
ninguém as vê contando as pedras
e os peixes voam no céu como pedras.
(Pedro Rodrigues de Menezes, "os peixes voam no céu como pedras")
ancestral aranha que mascaras
balaustradas, capitólios e olimpos
sigiloso movimento trespassando
o invisível lugar de visível vazio
aroma metálico ou apurado gume
na distracção sonora do sono
afinal, de quantos rituais e cantos
ou milenares hecatombes aladas
se fazem as arestas criminosas
onde jazem brancas e indefesas
as mil e uma esvoaçantes criaturas
que encontraram na sedutora luz
o seu destino ébrio de inocência?
(Pedro Rodrigues de Menezes, "ancestral sibila")
é olhando para todas as mães
com as suas vaginas derrotadas
e os ventres espiando a cicatriz
que me adormecem os olhos
perante a mão cega e grotesca
somos incapazes de vir ao mundo
sem ensanguentar o mundo inteiro
sem arrancar dormitando ainda
sendo ainda esse sonho por gerar
pedaços vivos da carne e do sonho
criaturas invariantes e futuras
condenações a estourar hediondez.
(Pedro Rodrigues de Menezes, "hediondez maternal")
o corpo pairando
suspenso nu
fantasma sem cor
com forma de fantasma
candura obliterada
interrupção incomum
cadáver assombroso
terra inclinada na chuva
um poeta sobre uma poça
milenar
o sangue coagulando todo
vertical
a veia míope tocando o
horizonte
a vírgula expansiva da sua artéria
cavernosa
os pés, uma chaga infernal do
caminho
as mãos, um claustro negro de
silêncio
o poeta salta
o poeta corre
o poeta também ri
mas o poeta está morto.
(Pedro Rodrigues de Menezes, "o poeta, o poema e o fantasma")
ESVAZIAMENTO ("A comunhão com o outro acontece no esvaziamento de si mesmo." — Tarik Markov)
Hoje, neste domingão de quarentena, estou um tanto reservado e reflexivo, mas sinto um despertar de meu lado afetuoso e que me conduz a abrir meu coração para uma pessoa que mereça confiança. Preciso desabafar para alguém! Ando muito na defensiva com relação a meus sentimentos. Será que se eu for sincero, atrairei a compreensão dela? O meu desejo é apenas socializar, para que possamos aproveitá-lo para nosso enriquecimento mútuo. Conversar, aprender juntos, consolidar o que nos poderá unir. Dois anos de pandemia, ainda estou só..., perdido no caminho e tentando voltar no tempo para quando eu era feliz e não sabia! Que amigos e filhos alguns atenderiam essa necessidade? Agora sou pai, por isso deixei de ser somente filho. As decepções de pai são menos doloridas, pois os filhos pagam pelos erros dos pais. Preciso de uma "mãe de peito"! Aquelas que me livraram da desnutrição já morreram desnutridas. Disse Charles Canela: "Se a sensação que fica é de esvaziamento ao se dar, está dando o que não pode."
Procuro minha
melhor versão
dentro de mim
navego entre mundos
deslizo em águas
cristalinas
em busca da completude
as vezes encontro
águas turvas
perco a direção
Incompreensão
Invade meu âmago
delírios
persistem em mim
preciso soltar a âncora
voltar a navegar
em outros mares
devanear
em águas cristalinas
@zeni.poeta
No campo a vida é serena
o menino vira pássaro
solo fertil de felicidade
No campo a vida é solitária
a terra é seu maior amigo
e o tempo não tem relógio
No campo a vida é madrugada
gotas de orvalho banham as mãos
aroma verde seduz a alma
@zeni.poeta
Ávida pela vida
Momentos de prazer
que banha meu ser
flores perfumadas
êxtase de desejos
invade meu âmago
saciar minha sede
tempestade de ventos
sacode meu corpo
minha pele vibra
ansia pela vida
gentileza exposta
com sede de viver
satisfazer-se
de júbilo
contemplar o belo
@zeni.poeta
Encontro
duas almas
um pensamento
na busca do amor
que banha a pele
irradia calor
transpira confiança
faz brilhar o sol
em dia nublado
escolhe ficar
na chuva
e brincar em Poças
d'águas
experimenta
a melodia
para tranbordar
em sorrisos
olhar as nuvens
e lá no alto
ver corações
e as flores....
Ah, aquele perfume
engole minha alma
enche os pulmões
e sopra afago
@zeni.poeta
Deserto
secura de boca
garganta aspera
desejo cansado
café amargo
cova prolongada
pedra
cimento
rio sinuoso
emboscada
mente tirana
arruína âmago
agradar o ego
corromper o ser
flagela o viver
aperceber-se
agregar bravura
desinflamar a psique
@zeni.poeta
Espinha dorsal
Mergulho profundo
de fora pra dentro
fissuras existencias
escavação íntima
pequenas brechas
acasos do tempo
infiltrações
necessárias
reaprender ensaios
metamorfoses
encalço do belo
harmonizar-se
com a lucidez
de minhas trevas
@zeni.poeta
Agosto
Brisa suave
sol mansinho
mente serena
sentir equilíbrio
na leveza do dia
silêncio das árvores
no sopro do vento
pele desfruta
frescor de agosto
caminhar na rua
sentir a poesia
no beijo do vento
sorrir pra vivência
saborear a longevidade
degustar a permanência
descortina-se
acaricie
povoar amor
@zeni.poeta
Entrega
Amanhã vou acordar mais cedo
Vou abrir a porta e te deixar entrar
Você que cabe perfeito
No conforto do meu sofá
Então te darei sorrisos
E te deixarei sentar
Na melhor cadeira
Da sala de jantar
Vou permitir, nesse dia que virá,
Que você conheça o meu lugar
E te direi, bem calma:
Não faça nada que não me agradar
Você saberá ao certo
De qual desejo eu vou falar
E, que no instante exato,
Naquele ato vou me entregar.
CHOVENDO
Um gole após o outro
Vou sorvendo dessa bebida gelada
Que espalha por onde passa um frescor que me devassa
Uma lágrima após a outra
Vou curtindo esse choro contido
Que limpa por onde escorre, na minha pele onde passa.
Um passo após o outro
Vou correndo nessa avenida
Que compete com meu compasso e me deixa embevecida
Um dia após o outro
Vou seguindo concentrada
Cuidando onde piso, num prazer úmido e velado.
MULHER REALEZA
Conheço uma mulher realeza
Não falo de força e beleza
É sobre fé, luz e clareza
Saída do casulo escuro
Em meio à natureza
Com asas virou borboleta
É como digo a vocês
Muito do que carrega
São dores, culpas e entrega
Dos filhos que alguém cuidou
Amor do peito brotou
Aos seus pais pode honrar
E com sabedoria perdoar
Nas rodas, danças, fogueiras
Expurgando os sofrimentos
Nas pedras da corredeira
Em cada gota que pulsa
Viveu lindos momentos
Sabendo que vai vencer
Um dia vivido por vez
Se por hoje escolheu viver
Foi em nome dos filhos de Deus.
verme alado
as galáxias
é sempre
as galáxias
da infinita luz bruta
que todo eu em bruto
porventura em vão
espero um dia alcançar
apesar da fome
e da solidão
e da força
dos meus braços
tão livres
dos meus lábios
tão mudos
dos meus olhos
tão cerrados
um verme
rastejando nu
de asas
contemplando
para além da terra
e da memória sideral
a dormência do sono
a vibração do sonho.
(Pedro Rodrigues de Menezes, “verme alado”)
Versos de um dia frio
Palavras invadem a alma
Escritas sem pedir licença
E uma imensidão de versos
Pulsando na ponta dos dedos
Nem sempre a rima chega
Nem sempre o ritmo é dança
A arte de ser poeta
Conquista pela constância
Aviso que não cabe pouco
Na fonte do meu dizer
Traduzo em poucas linhas
Meu insensato jeito de ser
Angela, meus versos
Morena bonita
Quem aguenta o tanto que agita
Manda em tudo, se precisar, apita
O jogo, a ordem do dia, ordena
Anda por rodas, fogueiras, rezos e danças
- De onde surgiu, me perguntam
- Quem te seguiu, quem te formou?
Escreve para ser lida, não esquecida
Por janelas azuis, às vezes cinza
Se espelha sua alma, minha alma
Eu estou aqui nestes versos
Que gostaria de ter recebido,
Mas não fico sem homenagem
Eu mesma me dedico esta mensagem
✨ Às vezes, tudo que precisamos é de uma frase certa, no momento certo.
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