Poesias de Machado de Assis

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⁠Quanto às minhas opiniões públicas, te­nho duas, uma impossível, outra realizada. A impossível é a republica de Platão. A realizada é o sistema representativo. É sobre­tudo como brasileiro que me agrada esta úl­tima opinião, e eu peço aos deuses (também creio nos deuses) que afastem do Brasil o sistema republicano, porque esse dia seria o do nascimento da mais insolente aristocra­cia que o sol jamais iluminou.

Machado de Assis
Diário do Rio de Janeiro, 5 mar. 1867.

Se eu lembrasse de deixar a vida por aborrecimento ou capricho, seria você acusado de me haver propinado o veneno?

Mas, enfim, os cabelos iam acabando, por mais que eu os quisesse intermináveis. Não pedi ao céu que eles fossem tão longos como os da Aurora, porque não conhecia ainda esta divindade que os velhos poetas me apresentaram depois; mas, desejei penteá-los por todos os séculos dos séculos, tecer duas tranças que pudessem envolver o infinito por um número inominável de vezes. Se isto vos parecer enfático, desgraçado leitor, é que nunca penteastes uma pequena, nunca pusestes as mãos adolescentes na jovem cabeça de uma ninfa... Uma ninfa!

Machado de Assis
Dom Casmurro (1899).

O destino, que conhece o desfecho de cada drama, sorri dos nossos cálculos, e choraria, se pudesse chorar; das previsões humanas.

Machado de Assis
A semana, 30 de junho de 1895.

A bebedice parece desenvolver-se entre nós, já em tal escala que a taberna é o pórtico da sepultura.

Machado de Assis
Machado de Assis: Obra Completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2021.

Nota: Escrito em 1 de setembro de 1877.

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Minha solidão tomou proporções enormes. Nunca os dias foram mais compridos, nunca o sol abrasou a terra com uma obstinação mais cansativa. As horas batiam de século a século, no velho relógio da sala, cuja pêndula, tic-tac, tic-tac, feria-me a alma interior, como um piparote contínuo da eternidade.

Machado de Assis
Papéis Avulsos (1882).

Nota: Trecho do conto O espelho.

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⁠Há umas plantas que nascem e crescem depressa;outras são tardias e pecas. O nosso amor era daquelas; brotou com tal ímpeto e tanta seiva, que, dentro em pouco, era a mais vasta, folhuda e exuberante criatura dos bosques.

Machado de Assis
Memórias Póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Typografia. Nacional, 1881

⁠Não havendo nada que perdure, é natural que a memória se esvaeça, porque ela não é uma planta aérea, precisa de chão.

Machado de Assis
Memórias Póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Typografia. Nacional, 1881

Descobri uma lei sublime, a lei da equivalência das janelas, e estabeleci que o modo de compensar uma janela fechada é abrir outra, a fim de que a moral possa arejar continuamente a consciência.

Machado de Assis
Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881).

– [...] Para que queres tu mais alguns instantes de vida? Para devorar e seres devorado depois? Não estás farto do espetáculo e da luta? Conheces de sobejo tudo o que eu te deparei menos torpe ou menos aflitivo: o alvor do dia, a melancolia da tarde, a quietação da noite, os aspectos da Terra, o sono, enfim, o maior benefício das minhas mãos. Que mais queres tu, sublime idiota?
– Viver somente, não te peço mais nada. Quem me pôs no coração este amor da vida, senão tu? e, se eu amo a vida, por que te hás de golpear a ti mesma, matando-me?
– Porque já não preciso de ti. Não importa ao tempo o minuto que passa, mas o minuto que vem. O minuto que vem é forte, jucundo, supõe trazer em si a eternidade, e traz a morte, e perece como o outro, mas o tempo subsiste. Egoísmo, dizes tu? Sim, egoísmo, não tenho outra lei. Egoísmo, conservação. A onça mata o novilho porque o raciocínio da onça é que ela deve viver, e se o novilho é tenro tanto melhor: eis o estatuto universal. Sobe e olha.

Machado de Assis
Memórias póstumas de Brás Cubas (1881).

Cada século trazia a sua porção de sombra e de luz, de apatia e de combate, de verdade e de erro, e o seu cortejo de sistemas, de ideias novas, de novas ilusões; cada um deles rebentavam as verduras de uma primavera, e amareleciam depois, para remoçar mais tarde. Ao passo que a vida tinha assim uma regularidade de calendário, fazia-se a história e a civilização, e o homem, nu e desarmado, armava-se e vestia-se, construía o tugúrio e o palácio, a rude aldeia e Tebas de cem portas, criava a ciência, que perscruta, e a arte que enleva, fazia-se orador, mecânico, filósofo, corria a face do globo, descia ao
ventre da Terra, subia à esfera das nuvens, colaborando assim na obra misteriosa, com que entretinha a necessidade da vida e a melancolia do desamparo.

Machado de Assis
Memórias póstumas de Brás Cubas (1881).

E, em vão lutando contra o metro adverso,
Só lhe saiu este pequeno verso:
"Mudaria o Natal ou mudei eu?"

Machado de Assis

Nota: (trecho extraído do livro "Poesias Completas - Ocidentais", 1901, pág. s/nº. – Projeto releituras)

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Pergunta-me por que é que uma moça, casada de fresco, pode ter aborrecimentos? Quem lhe disse que eu tinha aborrecimentos? Escrevi que estava aborrecida, é verdade; mas então a gente não pode um momento ou outro deixar de estar alegre?

É verdade que esses momentos meus são compridos, muito compridos. Agora mesmo, se lhe dissesse o que se passa em mim, ficaria admirada. Mas enfim Deus é grande...

Machado de Assis
ASSIS, M., Questões de Maridos

Hinho Nacional Brazileiro

Enche o peito brasileiro
Doce luz, almo fervor,
Ante o dia abençoado
Do seu grande Imperador

Das florestas em que habito
Solto um canto varonil:
Em honra e glória de Pedro
O gigante do Brazil.

Em firme trono sentado
O colosso Imperial
Tem por base de grandeza
O coração nacional.

Das florestas em que habito
Solto um canto varonil:
Em honra e glória de Pedro
O gigante do Brazil.

Correm anos, e este dia
Surge na terra da Cruz:
Abre-se a alma do povo
Jorra do Céu nova luz.

Das florestas em que habito
Solto um canto varonil:
Em honra e glória de Pedro
O gigante do Brazil.

Machado de Assis
O Constitucional, 11 de dez. de 1867.

Dai à obra de Marta um pouco de Maria,
Dai um beijo de sol ao descuidado arbusto;
Vereis neste florir o tronco erecto e adusto,
E mais gosto achareis naquela e mais valia.
A doce mãe não perde o seu papel augusto,
Nem o lar conjugal a perfeita harmonia.
Viverão dous aonde um até ‘qui vivia,
E o trabalho haverá menos difícil custo.
Urge a vida encarar sem a mole apatia,
Ó mulher! Urge pôr no gracioso busto,
Sob o tépido seio, um coração robusto.
Nem erma escuridão, nem mal-aceso dia.
Basta um jorro de sol ao descuidado arbusto,
Basta à obra de Marta um Pouco de Maria.

Machado de Assis
Machado de Assis: obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2021.
Inserida por laurenmatta

⁠Tal é o vosso destino,
Ó filhas da natureza;
Em que vos pese à beleza,
Pereceis;
Mas, não... Se a mão de um poeta
Vos cultiva agora, ó rosas,
Mais vivas, mais jubilosas,
Floresceis.

Inserida por pensador

Quando chegamos ao alto da Tijuca, onde era o nosso ninho de noivos, o céu recolheu a chuva e acendeu as estrelas, não só as já conhecidas, mas ainda as que só serão descobertas daqui a muitos
séculos. Foi grande fineza e não foi única. São Pedro, que tem as chaves do céu, abriu-nos as portas dele, fez-nos entrar, e depois de tocar-nos com o báculo, recitou alguns versículos da sua primeira epístola: "As mulheres sejam sujeitas a seus maridos..."

Machado de Assis
Dom Casmurro (1899).
Inserida por marcosarmuzel

Venha, venha o voto feminino; eu o desejo, não somente porque é ideia de publicistas notáveis, mas porque é um elemento estético nas eleições, onde não há estética.

Machado de Assis
ASSIS, M., "Histórias de 15 Dias", 1 de abril de 1877

Comparava-se ao mar daquela manhã, nem borrascoso nem quieto, mas levemente empolado e crespo, tão prestes a adormecer de todo, como a crescer e arremessar-se à praia.

Machado de Assis
Iaiá Garcia (1878).

Abriu a veneziana da janela e interrogou o Céu. O céu não lhe respondeu nada; esse imenso taciturno tem olhos para ver, mas não tem ouvidos para ouvir. A noite era clara e serena; os milhões de estrelas que cintilavam pareciam rir dos milhões de angústias da Terra.

Machado de Assis
Iaiá Garcia (1878).