Poemas de quem Deu um Fora

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Se eu fosse um padre, eu, nos meus sermões,
não falaria em Deus nem no Pecado
— muito menos no Anjo Rebelado
e os encantos das suas seduções,

não citaria santos e profetas:
nada das suas celestiais promessas
ou das suas terríveis maldições...
Se eu fosse um padre eu citaria os poetas,

Rezaria seus versos, os mais belos,
desses que desde a infância me embalaram
e quem me dera que alguns fossem meus!

Porque a poesia purifica a alma
...e um belo poema — ainda que de Deus se aparte —
um belo poema sempre leva a Deus!

CANÇÃO DO AMOR IMPREVISTO

Eu sou um homem fechado.
O mundo me tornou egoísta e mau.
E a minha poesia é um vício triste,
Desesperado e solitário
Que eu faço tudo por abafar.

Mas tu apareceste com a tua boca fresca de madrugada,
Com o teu passo leve,
Com esses teus cabelos...

E o homem taciturno ficou imóvel, sem compreender
nada, numa alegria atônita...

A súbita, a dolorosa alegria de um espantalho inútil
Aonde viessem pousar os passarinhos.

A amizade consegue ser tão complexa.
Deixa uns desanimados, outros bem felizes.
É a alimentação dos fracos
É o reino dos fortes.

Faz-nos cometer erros
Os fracos deixam se ir abaixo
Os fortes erguem sempre a cabeça
Os assim assumem-nos.

Sem pensar conquistamos
o mundo geral
e construímos o nosso pequeno lugar,
deixando brilhar cada estrelinha.

Estrelinhas.
Doces, sensíveis, frias, ternurentas.
Mas sempre presentes em qualquer parte.
Os donos da amizade.

Coisa amar

Contar-te longamente as perigosas
coisas do mar. Contar-te o amor ardente
e as ilhas que só há no verbo amar.
Contar-te longamente.

Amor ardente. Amor ardente. E mar.
Contar-te longamente as misteriosas
maravilhas do verbo navegar.
E mar. Amar: as coisas perigosas.

Contar-te longamente que já foi
num tempo doce coisa amar. E mar.
Contar-te longamente como doí
desembarcar nas ilhas misteriosas.
Contar-te o mar ardente e o verbo amar.
E longamente as coisas perigosas.

Encontro-me de pé sob um céu estrelado
E sinto como o mundo rasteja
no meu sobretudo, para fora e para dentro,
qual um formigueiro

Tecendo a manhã

Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito de um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.

E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.

João Cabral de Melo Neto
Poesia completa. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2020.

Bola de futebol... é um utensílio semivivo,
de reações próprias como bicho,
e que, como bicho, é mister
(mais que bicho, como mulher)
usar com malícia e atenção
dando aos pés astúcias de mãos.

A liberdade é um dos dons mais preciosos que o céu deu aos homens. Nada a iguala, nem os tesouros que a terra encerra no seu seio, nem os que o mar guarda nos seus abismos. Pela liberdade, tanto quanto pela honra, pode e deve aventurar-se a nossa vida.

Quem perde seus bens perde muito; quem perde um amigo perde mais; mas quem perde a coragem perde tudo.

O pensamento, único tesouro que Deus põe fora do alcance de todo o poder e guarda como um elo secreto entre os infelizes e Ele próprio.

Quem nunca disse algo descabido
Quem nunca colocou uma vírgula fora do lugar
Ou é uma pessoa insípida e desinteressante
Ou simplesmente não é humano.

É loucura jogar fora todas as chances de ser feliz porque uma tentativa não deu certo.

Zirtaeb Onamaac
Ordinairement extraordinaire (2015).

Nota: A autoria do pensamento tem vindo a ser erroneamente atribuída ao livro "O Pequeno Príncipe" de Antoine de Saint-Exupéry.

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POEMA

A minha vida é o mar o abril a rua
O meu interior é uma atenção voltada para fora
O meu viver escuta
A frase que de coisa em coisa silabada
Grava no espaço e no tempo a sua escrita

Não trago Deus em mim mas no mundo o procuro
Sabendo que o real o mostrará

Não tenho explicações
Olho e confronto
E por método é nu meu pensamento

A terra o sol o vento o mar
São a minha biografia e são meu rosto

Por isso não me peçam cartão de identidade
Pois nenhum outro senão o mundo tenho
Não me peçam opiniões nem entrevistas
Não me perguntem datas nem moradas
De tudo quanto vejo me acrescento

E a hora da minha morte aflora lentamente
Cada dia preparada

A natureza deu-nos duas orelhas e uma só boca para nos advertir de que se impõe mais ouvir do que falar.

Saber de cor não é saber: é conservar aquilo que se deu a guardar à memória.

A Criança Que Pensa Em Fadas

A CRIANÇA que pensa em fadas e acredita nas fadas
Age como um deus doente, mas como um deus.
Porque embora afirme que existe o que não existe
Sabe como é que as cousas existem, que é existindo,
Sabe que existir existe e não se explica,
Sabe que não há razão nenhuma para nada existir,
Sabe que ser é estar em algum ponto
Só não sabe que o pensamento não é um ponto qualquer.

Porque a vida só se dá pra quem se deu, pra quem amou, pra quem chorou, pra quem sofreu. Ah, quem nunca curtiu uma paixão nunca vai ter nada, Ai de quem não rasga o coração, esse não vai ter perdão. Quem nunca curtiu uma paixão, nunca vai ter nada, não...

Vinicius de Moraes

Nota: Adaptação de trechos de "Como dizia o poeta"

A UM AUSENTE

Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.
Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.

Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.

Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste.

Carlos Drummond de Andrade
"Farewell". Rio de Janeiro: Editora Record, 1996.

Guarda estes versos que escrevi chorando,
Como um alívio a minha saudade,
Como um dever do meu amor; e quando
Houver em ti um eco de saudade,
Beija estes versos que escrevi chorando.

O VELHO E A FLOR

Por céus e mares eu andei,
Vi um poeta e vi um rei
Na esperança de saber
O que é o amor.

Ninguém sabia me dizer,
Eu já queria até morrer
Quando um velhinho
Com uma flor assim falou:

O amor é o carinho,
É o espinho que não se vê em cada flor.
É a vida quando
Chega sangrando aberta
em pétalas de amor.

Vinicius de Moraes
Letra da música "O Velho e a Flor", composta por Vinícius de Moraes, Toquinho e Luis Enríquez Bacalov.
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