Poemas Anônimos
FOSSE LIGEIRO
Tu
Presente duma vida
Que vive há dias em
Nublados que me quaram
Embrião de cambaxirras
Eco alto que se ouve em futuro
Passado ligeiro
Passou, por mim, engomado
Vestido em minha roupa
Façamos tranças
De nossos pêlos eriçados
Contato com contato
Envaidecidos (ego sem dolo)
Em leões lunares:
Pois há beleza nesse
nosso
(a)temporalizar
ASÉ FÉ
Laroyê bará
Abra caminho tranquilo pr'eu passar
Sopra vento, Oyá
Levai-me corpo y alma
Eparrey: Queira qu'eu
Esteja onde puder estar
Kaô Kabecilê
Justiça y martelo firme
Em dias de se padecer
QUE PENA
Uma pena só: que pena!
Fragmento de liberdade
Fruto maduro da asa branca que
Por falta d'água
bateu em nuvens carregadas
y fez
Lufadas pra
Minha saudade
Voar
TRAVESSO
"Quero um peito travesseiro, que cheire a capim-limão, em que se possa atravessar o mundo inteiro - ser onde sonho e faço de chão. Desejo que, qualquer planeta que orbite ao redor de mim, deixe o medo para o fim ou até que a lua volte. Subirei em minhas sobrancelhas para ver o meu amor passar naquela rua, até o gosto me vir à boca, e eu sorrir sem respirar. Pois, do ventre donde que saí, hoje há parreiras e vinho etílico. Preu - que sou travesso - já não o meu lugar."
Fabrício Hundou
ESTAÇÃO
Em algum vagão
Enrijeço a minha nuca de desdém
Não vago em vão e não alugo peito
Não penso em mais ninguém
Só num pronto-abraço que me espera
Na estação mais farta que a primavera
Aonde o meu desembarcar
Pisa efêmero nos trilhos
Em que vou descarrilar
O meu breve juízo
Outra vez
TRATANDO DE MIM
"Quando se trata de mim, eu mesmo dou um trago e dano a boca a falar ainda qu'eu tenha medo, da criança que nina entre os meus dedos, acordar e não parar de sonhar. Livrai-me, Deus, dessa doidice. Eu tenho medo dela contar como dançam tristes as lembranças do meu último sorriso. Isso não é segredo - eu duvido. E me tratando, sempre me curo em outro beijo ou na falta de juízo."
SURRA POÉTICA
Levei uma surra poética
Que me fez menos osso
E menos patética
Que me pôs a chorar em rimas
E soluçar em soluções salinas
Que não me fez nobre
Nem pobre
Apenas apanhei das letras
Lapidei a carne com certezas
Uma surra surreal
Que me fez pingar
Até a vela apagar
E escurecer tudo
Em pleno dia
RE(VOLTA)
"Por enquanto, vão encontrar apenas um grande oco, um eco que sai do esôfago sem esforço e charme algum. Eu só volto quando ganhar mais quilos, quando a lua nascer no meu umbigo e os meus cabelos tocarem os mapas nos meus joelhos. Algum calendário quer me abraçar."
SONS SEM GAIOLAS
Ali, naquele galho retorcido
Repousam pássaros
Em ninhos ornamentados
Pequenas flautas com asas
Por si, são embelezados
Pelo torpor da existência
Ali, átrios e ventrículos se contorcem
O som tem insônia
O eco toca campainhas em hiatos
Sem perturbar nenhum átomo
E, a melodia mais bonita, foi cantada
Com saudade
Se conseguir ouvir
Diga-me que SIMbemol
Um par de asas
Um par de orelhas
Batem com muita fugacidade
Para ouvir a tua voz
O teu sorriso é um piano completo
Cada tecla me desafina
Me retoca o batom
Sei que meu pássaro logo passará
Esteja isento de ingressos
Ingressa-te livremente
No paraíso dos meus sons
Onde não há serpente
Nem maçãs
Só há pássaros vermelhos
Que passam nos meus lábios
E entram em espelhos
Espanto os corvos bons
Não me deixe em pausas
Contorça-me em teus tons
CHEIRO SEM NEXO
Quando chove em minha casa
Telha exala as horas
Eu não sei que horas são
Em espelhos de janela
Ladro ao primeiro vento que vier
A chinela emborcada
Desde que deitei
Testou minha fé
Ninguém sabe a oração
Se amanhã eu parir só rimas
Minhas metáforas
Adestradas pela vergonha na cara
Virão abraçar as tuas silhuetas
E na mesma cena e palco
Saberá que o equilíbrio ensaboado
Escorregou do meu meu corpo
E foi parar no ralo
Pelos logradouros que passou
Deixou o rastro
Não promete retornar.
Ai, que cheiro que deixou...!
CAIXA DE FÓSFORO
Pobre deu que sou de calores
Fervor, cama, leito e aconchego
Fui me atear nesse mundo de dois vértices
Sem saber
Que pro meu fogo
Gente desse bioma
Se esquiva
Pobre de quem não é febril
Perde a fé e o brio
De se inflamar nesses meus braços
Sem saber
Que nessa caixa de fósforo
Nem espirro
Eu posso dar
O Tempo, meus amigos, o Tempo está roubando coisas de mim. Tamanha veemência e desatino, me lembram muito bem que, anos atrás, não era assim. O Tempo tem me ultrapassado, descompassado, fingido não se passar por mim. Decidi ter uma conversa com o Tempo para atarmos uma relação agradável e pedir mais uma vez que ele não me deixe apenas no passado.
Eu perguntei:
- Ríspido, o que tens contra mim?
O Tempo me respondeu:
- Estou farto de ser descuidado e ser usado como desculpa, fingindo que não me tem. Estou cansado de ser perdido em horas em vão. Estou cansado de ser perdido! Se você não tem tempo, tenha tempo para mim.
O Tempo, meus amigos, o tempo está roubando coisa de mim. Nesse nosso relacionamento, já dei adeus ao fôlego, às lágrimas, aos agouros; tamanha veemência e desatino, lembro-me muito bem, ainda não teve fim.
Você já disse no dia de hoje
Para alguém que o ama?
Você hoje já falou para Deus
Que depende dele e o adora?
Se nada disso está acontecendo,
Você não sabe o que está perdendo.
Quando nos damos,
Quando de nós saímos
Encontramos o sentido para a vida
E a nossa existência fica mais florida...
CARECA DE SAUDADE
Há pouco esmero nesse texto. Há pouco ele cresceu. Crespos, lisos, ondulados: tantos são os caminhos para a saudade. Trançados em raiz, espetados, penteados em et ceteras. E, mesmo em caminhos calvos, é algo que cresce, aumenta, cai. Tal vez, saudade. Cabelo, talvez. Arrepia e embaraça. Saudade é capaz conceber sentimentos de arrepiar e embaraçar qualquer sensatez. Há quem peleje ao pentear os fios desse tempo com o credo latente de que a saudade irá passar. Esforços em vão. Cabelo se corta, saudade também. Saudade logo cresce. O cabelo? Também!
PÃO DE ILUSÃO
"Dona Maria vai à mesma padaria há 43 anos e alguns dias. Essa data traz a agonia inventada pela espontaneidade da vetustez. Alguns móveis da padaria, ao longo da modernidade, foram trocados por mármore gelado e mogno lustroso. Os donos do estabelecimento ainda não foram trocados. O padeiro continua com um semblante frio - tanto quanto o mármore - e a balconista, com a sua pele lustrada pela temperatura dos pães, estende dedos grossos para devolver o troco. Em todos esses anos, os formais comprimentos nunca foram trocados por nenhuma amizade com túnica mais interna. Dona Maria é apenas mais uma velha assídua que sempre compra o mesmo bolo de trigo. Os que estão na padaria, também são apenas os mesmos, apenas são, sem muitas túnicas internas, são superficialmente apenas duas almas sem recheio que Dona Maria vê ao longo de seus 43 anos. Por casualidade, há muitos calendários, Dona Maria vê os mesmos rostos, os mesmos objetos, come as mesmas comidas, veste os mesmos vestidos que cheiram a naftalina. Diga-nos, Dona Maria, diga como era o sol naquela década. Diga-nos, diga com dignidade como as pessoas se trajavam, nos diga sobre os programas televisivos, diga-nos se os corpos eram em preto e branco, diga se havia medo de ter esperança. Conte-nos, conte sobre hoje, conte sobre excesso de cores. Conte-nos como contas as moedas do cofre que guardas em cima da geladeira, qual valor tem a mudança. Para Dona Maria, a dinâmica do tempo não lhe foi muito generosa. Dona Maria aguarda, no cume de sua demência, que nada possa mudar, pois envelhecer é um fenômeno agudo, que esculpe pés de galinha e rugas sem muita cortesia estética. E ela inventa todos os dias mais um dia de monotonia, para que não alcance o desespero de um dia ter de que se reinventar. Dona Maria sabe que a eternidade não se vende em nenhuma padaria, mas que a alegria da ilusão lhe traz a sensação de poder ter desenhar a vida que se quer levar."
PÉTALA POR PÉTALA
"Aprendi a andar sobre à vida sem as mãos, sem nenhum apego ou reflexo de segurança mediante ao perigo. Em minha riqueza de aptidões, a que mais contemplam é a terrível maneira como os cadarços se comportam. Os que se importam: sintam-se importantes. Equilíbrios aos equilibristas. Pra eu que tanto me dou bem e mal - pétala por pétala - sob o papel de malabarista, resta rogar habilidade na dinâmica das instabilidades."
Pouco é Querer pouco
Quando eu quero a poesia,
Eu quero anestesia,
Quando eu quero a magia
Eu quero alegria
Quando eu quero conforto
Eu quero um abraço
Quando eu quero amizade
Eu quero pra eternidade
Quando quero,
Quero em demasia
E é isso que me traz agonia
Não consigo viver de pouco
Não sou pessoa de troco
Quero sua mão,
Quero seu coração
Quero sua perna,
Quero sua alma
AMAR - ATO I
"Desde que se tornou verdade, todo medo era apenas mentira, sem parcimônia de sentir a ausência do cais que me era, da imensidão de sorrisos igualmente divididos. Com aqueles braços - que atravessavam-me sutilmente os poros - tod'alma fluía, vestida de lençóis translúcidos, delicados, mas hígidos o suficiente a passar por qualquer espinho sem nem causar ferida, partos e partidas. Partilhas comigo a razão das mais belas canções e da cólera incurável, da falta do ar. Desde que se tornou verdade, tudo se torna...transforma no ato de amar".
O MENINO QUE O VALE LEVA
"Você nunca volta pelos mesmos caminhos. Você, o pequeno menino do vale, também é o grande adulto que leva. E se hoje vai embora - cheio de lentidão na marcha - é porque nunca perdeu o medo de voltar. Sempre soube que, o soluço, é o veredito pujante do perdão digerido. E eu, teimoso como sou, dou conversa ao desespero. Tenho calos por ainda ter cordas, na cabeça, para me pendurar em suas fugas. Corra ligeiro, na cidade que há em mim, com todas as suas coisas que vão perdendo o cheiro, exalando o melhor perfume da sua falta. Vale-me muito esse menino. Valei-me...volte! Pois as placas não têm nomes e, as ruas, não têm saídas. Nos fios da barba, há cama para a sua insônia. Riso também é choro. Cacto também se rega. Amor, não se nega".
[VAIDADE]
No teu verso
Em miúdos alfanuméricos
O prazo de validade.
Nos meus versos
Em graúdos suspiros
A saudade.
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