Poema do Jardim de William Shakespeare
AINDA ESTOU AQUI
Ainda estou aqui,
mesmo que tua surdez me negue.
Ainda estou aqui,
ecoando no vazio do teu silêncio.
Falo o que sinto,
palavras partidas,
versos ocos.
Mas teus ouvidos são muros,
e meus gritos, sementes no asfalto.
Ainda estou aqui,
em cada sombra que ignoras,
no peso do ar que não te toca,
no intervalo entre os gestos que evitamos.
Ainda estou aqui,
e não me calo.
Sou o eco do que já fomos,
o rastro de uma chama esquecida.
Falo porque existir é insistir,
mesmo que o som se dissolva no abismo.
Ainda estou aqui.
Tu me ouves?
SEM TER VOCÊ
Quando o vento da saudade
balançar meu coração,
vou cantar uma canção pra você.
Vem me tirar desse sofrimento,
não aguento este momento
que passa o tempo sem ter você.
O rio no peito está secando,
porque o sol da solidão está queimando.
E o frio da saudade afugenta o meu ser,
não há cobertor que esquente
a vontade de viver.
E o frio da saudade afugenta o meu ser,
não há cobertor que esquente
a vontade de viver.
IPANEMA
Ipanema, Ipanema
Sem Vinícius
E Tom Jobim.
Ipanema, ai que pena
Só restou isso pra mim
A leitura de um poema
Ipanema, mar sem fim.
Na imensidão do do céu
Olha o mar um querubim
A lamentar esta cena
Ipanema tão pequena
Sem Vinícius e Tom Jobim.
Ipanema me distraio
Vendo a praia, cai a tarde
E o sol tem pena...
Nada cura esta saudade,
Deste amor que sempre invade Minha alma tão pequena.
O vento beija minhas mãos
Já calejadas pelo tempo!
Sorrio. E,num misto de magia,
Saltitando de alegria
Eu sigo… vou com o vento.
Maria do Socorro Domingos
Quando quiseres me levar, irei sorrindo.
Quando me achares digno daquele banquete onde serei o prato suculento dos vermes, fique à vontade.
Sei que poeta não deve demorar muito por aqui.
Quanto a essa ilusão que puseste no coração do homem, de ser eterno, fica no vácuo, como hiato cósmico.
Como palavra muda, impronunciável.
Que nós, por confusão mental, criamos em delírio: eternidade.
Epifania no Rosto de Uma Mulher
Não sorri.
Respira.
Como se o tempo nela descansasse
e a luz, vencida, ajoelhasse.
Há alvorada em sua pele,
brancura que arde sem queimar,
sombra de flor que não murcha,
sede de quem sabe amar.
Olhos — dois portos antigos
onde o mundo ancorou seus espantos,
e as marés recuam em silêncio
para que ela permaneça intocada.
Sua boca é um poema contido,
um verso que ainda não se escreveu,
mas já vive nos lábios dos anjos
e no suspiro de quem a leu.
Ela não posa: revela.
Ela não chama: acende.
É beleza que não se explica,
é paz que surpreende.
E o poeta, órfão de palavras,
deixa cair sua pena no chão,
porque diante desse rosto
a única resposta é a contemplação.
Vejo no amor um véu de silêncio e incerteza... figura que se insinua entre o sensível e o inteligível, como a sombra nas paredes da caverna: ora abrigo que consola, ora ilusão que se desfaz ao se voltar para a luz.
E, paradoxalmente, reconhecer esse véu é, por si, uma forma de clareza... como se a própria dúvida fosse um indício de profundidade, e o enigma, uma morada possível para aquilo que não se deixa capturar por inteiro.
A distração fácil não me atrai. Quanto mais desço, mais fundo cavo.
Vivo sob o risco de afundar. E aceito. Porque viver na superfície me parece uma espécie de morte lenta, embalada em risos automáticos e telas que piscam. O que me move é o mergulho — na contramão do tempo, contra a leveza tóxica que nos vendem como liberdade.
No contexto da arte, isso é quase um crime. Tudo nos empurra para o raso. Para o vendável. Para o que se compreende em dez segundos. Mas eu não quero ser entendido tão rápido. Nem quero criar o que consola. Quero o que inquieta, o que fere, o que obriga a parar.
A arte, quando é verdadeira, nos obriga a cavar. Tira o chão. Desloca. E é nesse deslocamento que penso, que existo. Filosofia, pra mim, não é sistema, é vertigem. É quando a pergunta fica maior que qualquer resposta possível. E eu sigo, mesmo assim.
Por isso escolho o abismo. O fundo. O lugar onde o olhar do outro se perde, mas onde talvez haja verdade. Porque há mais vida num gesto sincero do que em mil performances vazias. Há mais beleza no silêncio de quem sente do que no discurso de quem apenas representa.
Não quero distração. Quero escuta. Quero confronto. Quero o risco de não ser compreendido. Porque só quem desce até o fundo pode voltar com algo que vale a pena.
VEJO A VIDA PASSAR PELA JANELA
Todo dia, sobretudo à noite, tenho a impressão de que a vida escorre pela janela. Não como um acontecimento brusco, mas como um escoamento sutil — uma espécie de adeus cotidiano que ninguém percebe, exceto quem aprendeu a olhar.
É pela janela do meu quarto que observo a lua — testemunha antiga dos meus poemas, cúmplice dos versos que escrevi para minha amada, esposa, musa. Foi ali que derramei palavras como quem tenta deter o tempo. Foi ali também que vi meu gato desafiar o espaço, se equilibrando entre o vidro e a rede de proteção, como se pressentisse que a vida, afinal, é esse jogo instável entre o risco e o repouso.
Às vezes me pego contando os dias. Não com a ansiedade de quem espera, mas com a lucidez de quem sabe que tudo se esvai. Como quem vira páginas em um calendário invisível, um calendário metafísico onde cada dia é uma página escrita com o que não vivi plenamente.
E então me pergunto: será que me resignei diante da finitude? Ou apenas me acostumei a contemplar, a escrever, a esperar? Me tornei íntimo da lua, confidente das madrugadas, contador de silêncios. Talvez tenha aceitado que a vida não se segura — apenas se observa. Como quem sabe que o tempo não espera por ninguém, mas pode ser tocado, por um instante, no gesto de olhar com atenção.
A cada noite, sinto que estou escrevendo — com meu corpo, com minha espera, com meus olhos voltados à lua — uma lenta despedida.
O tempo é um tirano silencioso.
Não estende a mão, não consola.
Ele leva sem pedir licença,
rouba risos, desfaz promessas,
e castiga com a saudade.
Mas talvez sua crueldade seja arte —
uma forma estranha de ensinar.
Pois só no vazio que ele deixa,
floresce o que somos capazes de ser.
Fragmento de Alguém
Não há começo.
Há restos.
O que ficou depois que a vida passou
e os olhos ficaram presos à janela.
Não é nome o que se carrega,
mas marcas —
de amores que queimaram antes de aquecer,
de palavras ditas tarde demais,
de silêncios que falaram por nós.
Já se imaginou inteiro,
quando a juventude ainda ardia
e alguém dizia que o tempo era um engano
e amar, uma vertigem sem rede.
Depois, aprendeu a ternura dos gestos mínimos.
O chá servido com mãos que tremem,
a música baixa que cobre a ausência,
o toque que não exige, mas ampara.
Não se busca memória.
Busca-se não sumir.
Não se deseja contar,
mas apenas soprar os cacos
de quem ainda respira entre ruínas.
Não se sabe terminar.
Nem os versos.
Nem os dias.
Nem a si.
Fragmento de Mim
Não começo.
Não termino.
Sou o intervalo entre o que passou e o que nunca veio.
Carrego pedaços —
ecos de vozes que já não me chamam,
calafrios de toques que o tempo apagou.
Já me entreguei inteiro a quem não ficou.
Já ardi por dentro sem que ninguém visse a fumaça.
Aprendi a amar no escuro,
com medo da luz mostrar demais.
Hoje, caminho com mais cautela.
Não por medo, mas por memória.
Há ternura no gesto contido,
há desejo no silêncio que não grita.
Não procuro mais sentido.
Procuro abrigo.
Um canto onde eu possa não explicar.
Apenas ser — sem enredo, sem promessa.
Tenho um mundo dentro que ninguém visita.
Um vazio que aprendi a conversar.
Às vezes, só preciso que alguém escute
o que nem eu consigo dizer.
Sou feito de pausas,
de tentativas,
de páginas rasgadas que nunca viraram história.
Mas ainda estou aqui.
Mesmo que em pedaços.
Quase
eu quase morri.
não foi por falta de dor,
mas por excesso de espera.
quase fim,
quase meio,
quase gesto inteiro que se perde no intervalo.
quase vida —
essa sombra acesa que não ilumina.
quase amor —
esse sopro que não toca,
mas levanta poeira no peito.
quase ida,
porque eu ainda volto em sonhos.
quase vinda,
porque nunca cheguei por completo.
quase morte,
como um adeus sussurrado sem convicção.
quase destino,
feito linha torta que não ousa ser traço.
quase eu,
quase tudo,
quase nunca.
na sombra da vida
onde tudo se faz,
a noite, um açoite,
engano voraz.
o homem se perde
em plano desfeito,
sem fé, sem direito
de tentar outra vez.
a vida é só uma,
sem chance de volta.
só há revolta
e um lutar no vão.
no palco do medo,
só culpa e segredo —
sussurro de morte
e retorno ao chão.
Ser fiel a si mesmo é o primeiro passo para não se perder no outro. Quando quem amamos não está, percebemos o quanto a vida é dura — e curta. Esperar finais felizes parece ingênuo diante da realidade que insiste em nos quebrar.
Mas há força na dor. As partes que se quebram revelam quem realmente somos. A ausência do outro escancara a necessidade de presença de si. E quando dizemos “nunca mais”, talvez estejamos, enfim, dizendo “agora, sim” — para nós mesmos.
Da minha janela, olho a lua. Está inteira, clara, e sempre me encanta, mas o que mais me espanta é o fato de que ela não tem luz própria. Como pode algo tão brilhante ser apenas um reflexo, uma ilusão de luz? Ela se mostra em sua plenitude, mas não é sua a chama que a torna visível. A luz que vemos, tão intensa e bela, vem do sol, distante e silencioso. E, mesmo assim, a lua reflete, com tamanha força, essa luz emprestada, como se fosse sua. Como pode uma ilusão ser tão real? Como algo que não emite, mas apenas reflete, pode ter tanto poder sobre os nossos olhos e pensamentos?
Isso me leva a pensar em outras coisas que, assim como a lua, existem apenas na ilusão que construímos sobre elas. A gravidade, por exemplo. Nós sentimos, nos afetamos, mas não podemos tocá-la, como se fosse uma presença invisível que nos mantém ancorados à Terra, mas, no fundo, não a vemos. E o tempo? Ele passa, nos arrasta com sua corrente invisível, e vivemos sobre a ideia de que ele é linear e certeiro, mas, na verdade, não passa de uma construção mental, uma convenção que decidimos acreditar para dar sentido à nossa existência.
A verdade, muitas vezes, é uma construção. A própria realidade, o que chamamos de “real”, não é senão um jogo de percepções e interpretações que aceitamos, até mesmo nos convencendo de que o irreal é, de fato, real. Como uma miragem no deserto, ou um sonho que, ao acordarmos, parece mais real do que o próprio mundo em que vivemos. E, ainda assim, acreditamos. Abraçamos a ilusão porque ela nos oferece sentido, segurança, uma sensação de pertencimento ao que não compreendemos completamente. E, talvez, seja isso o mais misterioso de tudo: nossa capacidade de acreditar no intangível, de fazer da ilusão uma verdade irrefutável.
O Homem dos Sete Instrumentos
Chamam-me assim —
homem dos sete instrumentos —
mas não sabem:
não são sete,
nem instrumentos.
São cicatrizes.
São fomes.
São vozes que nunca couberam num só corpo.
Toco o violão como quem acaricia um amor perdido
que ainda respira na madeira.
O piano, como quem dialoga com espectros —
meus mortos têm teclas.
Canto como quem sangra acordes pela garganta.
Escrevo como quem rasga o próprio peito
à procura de um som
que ainda não nasceu.
Componho canções, poemas,
romances e vertigens.
Verso o que não sei nomear.
Não sou um, nem sou muitos.
Sou aquilo que sobra
quando o som se desfaz,
quando o aplauso se cala
e só resta o eco.
Sou o intervalo entre duas notas,
a pausa onde mora o abismo,
o silêncio que sustenta a beleza.
Cada instrumento em mim é um vazio domesticado,
uma ausência que aprendi a afinar.
Cada palavra, um grito soterrado.
Cada acorde, uma oração profana.
Sou feito de ecos e assombros,
de mãos que buscam o invisível,
de olhos que enxergam o que não se mostra.
Carrego um palco dentro do peito —
feito de memórias e ruínas —
onde cada noite,
sem que ninguém veja,
enceno minha última vez.
Se me chamam homem dos sete instrumentos,
é porque ainda não perceberam:
sou o que resta
quando a vida desaprende a dizer,
quando o mundo se recolhe
e só o humano
ainda insiste
em cantar.
A Mecânica Quântica é a Terapeuta da física Clássica.
P.S. Quando vocês chegarem no teto, estaremos aqui para oferecerem-lhes o Todo.
Sobre ser poeta
Ser poeta
não é escrever.
É sangrar sem ferida visível.
É andar entre os vivos
com os pés fincados no invisível.
Ser poeta
é ouvir o que não foi dito,
ler o que o tempo omitiu,
beber da fonte que seca os outros.
Não há descanso para o que vê demais.
Não há paz para o que sente em excesso.
Ser poeta é dormir com as cicatrizes abertas
e acordar com palavras grudadas nos olhos.
É saber que nada dura
e ainda assim amar —
como quem beija o rosto da água
antes que ela escorra.
Poeta não descreve.
Poeta desvela.
Poeta não tem vocação.
Tem maldição.
É escolhido pelo silêncio
pra dizer o que mata
e, ao dizer,
sobrevive.
Manifestar a benção antes dela chegar.
Pra que ela se sinta à vontade e bem vinda dentro da gente.
Pra ela ficar.
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