Poema de Mario Quintana Pe de Pilao

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Triste mastigação
As reflexões dos velhos são amargas como azeitonas.

(in: Sapato Florido, 1948.)

O lampião
A janelinha de acetilene do lampião da esquina tinha uma luz que não era a do dia nem a da noite... a mesma luz que banhava as pessoas, animais e coisas que a gente via em sonhos... aquela mesma luz que deveria enluarar, mais tarde, as janelas altas do outro mundo...

( in: Sapato Florido, 1948.)

“De noite todos os meus pensamentos são escuros
E todas as palavras têm a letra "u"
Rude
Virtude
Cruzes!”.

(in: Velório sem defunto, 1990.)

“O que mais me comove, em música,
são essas notas soltas — pobres notas únicas —
que do teclado arrancam o afinador de pianos”...

(Versos extraídos do livro “Mário Quintana — Prosa e Verso”, Editora Globo (9ª edição).)

Pessoa muito respeitada, amigável, generosa
e fácil de lidar. Mas quando o assunto é o
seu dinheiro, seu tempo ou suas preocupações,
nada ou ninguém é mais importante. Isso
demonstra que deve aprender muito ainda
sobre o crescimento da alma. Mas
controlando esse egoísmo e usando mais
de diplomacia ao tratar com as pessoas,
conseguirá avançar muito no seu caminho.

Dorme, ruazinha...
É tudo escuro...
E os meus passos, quem é que pode ouvi-los?
Dorme o teu sono sossegado e puro,
Com teus lampiões, com teus jardins tranquilos.
Dorme...
Não há ladrões, eu te asseguro...
Nem guardas para acaso persegui-los...
Na noite alta, como sobre um muro,
As estrelinhas cantam como grilos...
O vento está dormindo na calçada,
O vento enovelou-se como um cão...
Dorme, ruazinha...
Não há nada...
Só os meus passos...
Mas tão leves são
Que até parecem, pela madrugada,
Os da minha futura assombração...

O adolescente

⁠A vida é tão bela que chega a dar medo,
Não o medo que paralisa e gela,
estátua súbita,
mas
esse medo fascinante e fremente de curiosidade
que faz
o jovem felino seguir para a frente farejando o vento
ao sair, a primeira vez, da gruta.
Medo que ofusca: luz!
Cumplicentemente,
as folhas contam-te um segredo
velho como o mundo:
Adolescente, olha! A vida é nova…
A vida é nova e anda nua
– vestida apenas com o teu desejo!

Mario Quintana
Nariz de vidro. São Paulo: Moderna, 1998.

O amigo

Amigo é a criatura que escuta todas as nossas coisas sem aquela cara
que parece estar dizendo: – E eu com isso?

Mario Quintana
Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2006.

HAVIA
Havia naquele tempo tanta coisa,
Tanta coisa que subiria depois como um balão azul
Quando eu precisasse de um pretexto urgente para não me matar...
Havia
A que passava cuidadosamente os meus poemas a ferro
(e nisso eu vejo agora a maior poesia deles...)
Havia a que sabia fingir que me escutava,
Que parecia beber até, com seus grandes olhos,
Os meus solilóquios
(eram tão chatos que só podiam ser solilóquios mesmo...)
E havia, entre todas,
A Eleita,
A que cortava as unhas da minha mão direita
(agora tenho que recorrer a profissionais...)
E havia, entre as demais,
A que ficou não sei onde esquecida...

MARIO QUINTANA In: Baú de Espantos

Ser criança

Sinto falta de correr descalço em busca de magia
Sinto faltar de olhar todas as pessoas como iguais
Sinto falta de abraçar minha família
Sinto falta de chorar mesmo sentindo a pequena dor possível,

Sinto falta de olhar para o horizonte
E me imaginar como alguém especial diante do mundo,
Sinto falta de sonhar acordado comendo qualquer besteira,
Sinto falta de esquecer do futuro e viver o presente,

Sinto falta de subir na mais alta árvore
E sentir a liberdade diante da mais pura ilusão,
Sinto falta de dizer tudo que eu pensava sem medo
Sinto falta de mim, sinto falta de ser criança.

O degrau da escada não foi inventado para repousar, mas apenas para sustentar o pé o tempo necessário para que o homem coloque o outro pé um pouco mais alto.

Deixe que os outros vivam vidas pequenas, mas não você. Deixe que os outros discutam por coisas pequenas, mas não você. Deixe que os outros chorem por pequenas feridas, mas não você. Deixe que os outros deixem os seus futuros nas mãos de alguma outra pessoa, mas não você.

Aquele que quer aprender a voar um dia precisa primeiro aprender a ficar de pé, caminhar, correr, escalar e dançar; ninguém consegue voar só aprendendo vôo.

Quem nunca caiu não tem bem a noção do esforço que é preciso para se manter de pé.

É tão fácil enganar-se a si mesmo sem o perceber, como é difícil enganar os outros sem que o percebam.

O amor afirma, o ódio nega. Mas por cada afirmação há milhentas de negação. Assim o amor é pequeno em face do que se odeia. Vê se consegues que isso seja mentira. E terás chegado à verdade.

Vergílio Ferreira
FERREIRA, V., Escrever

Deviam parar com a demagogia sobre as massas. As massas são rudes, sem preparação, ignorantes, perniciosas em suas reivindicações e influências. Não precisam de lisonjas, mas de instrução.

A maior desgraça que pode acontecer a um artista é começar pela literatura, em vez de começar pela vida.

Miguel Torga
TORGA, M., Diário, 1947

Há grandeza mais verdadeira numa boa ação do que num bom poema ou numa grande vitória.

Poema em linha reta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
(Heterônimo de Fernando Pessoa)

Álvaro de Campos

Nota: Poema presente no livro "Poesias de Álvaro de Campos", de Fernando Pessoa (heterônimo Álvaro de Campos). Link

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