O Homem Errado Luis Fermando Verissimo
Apego-me.
A simplicidade é a leveza do meu corpo,
E a essência do meu espírito.
Prefiro as fórmulas simples.
Não gosto de enrolação.
Se eu faço é de bom gosto
Não costumo esconder o rosto.
Máscara não me acompanha.
Sou assim e não tenho oposto.
Apego-me e sinto falta.
Humildade facilmente me ganha.
Fujo do centro para ver a ribalta.
Coloco os amigos na posição mais alta.
A distância me maltrata.
A presença me faz falta.
Trem
Trem.
Trem. Trem.
Trem. Trem. Trem.
Trem. Trem. Trem. Trem.
Trem. Trem. Trem. Trem. Trem.
Trem. Trem. Trem. Trem. Trem. Trem.
Woooh! Woooh! Woooh!
Trem. Trem. Trem. Trem. Trem. Trem.
Trem. Trem. Trem. Trem. Trem.
Trem. Trem. Trem. Trem.
Trem. Trem. Trem.
Trem. Trem.
Trem.
Fshhhhh! Fshhhhh! Fshhhhh!
Música da vitória
O melhor do jogo é ganhar.
O vencedor é aplaudido.
Sobe ao pódio, é premiado.
O perdedor nem será lembrado.
A vitória faz amigos
Bajuladores em profusão.
Perder faz ser esquecido.
Ninguém pra te dar a mão.
Triunfar vale a taça.
E uma princesa pra valsa.
Fracassar não tem valor.
Apenas mais um sonhador.
Sem o primeiro lugar
Nunca farás história.
Não terás par pra dançar
A música da vitória.
Faça de sua vida. III
Faça de sua vida um pequeno labirinto,
Com acessos e saídas fáceis.
Com bancos em sombras abundantes
Onde possas sentar-se e descansar o bastante.
Faça de sua vida um meditar,
Ore, sirva, agradeça e faça orações.
Evite a fanatismo
Por qualquer que seja a religião.
Faça de sua vida um romance narrável.
Uma novela com final feliz.
Um roteiro irrecusável
Um enredo de aprendiz.
Quando a vida fechar a cortina.
Não tem como recorrer.
É seu ciclo que termina.
Deixe a alma ainda mais linda
Para os últimos aplausos receber.
Eu sei, mas não gostaria
Sei que quando nos afastarmos
Voltarei ao ostracismo malfadado.
A ele serei relegado.
Não tem como ser presente
Se o alimento é só do passado.
Eu sei que etapas terminam.
Que gelo derrete-se em água,
Que as flores efêmeras duram só um dia.
Que amores mal acabados viram agonias.
Eu sei que se for falso não brilha.
Que azurita nem sempre trará alegria.
Que nenhum ser humano é uma ilha.
Que o sonho é irmão da fantasia.
Ao começar eu não queria
Que fosse finito um dia.
Contudo prevalece o que é real
E não o que eu gostaria.
O poeta
O poeta chega à tardinha sem dizer nada.
Traz nos olhos uma panaceia em elixir.
Fica comigo pela madrugada.
Ao amanhecer tem que partir.
Em outdoors na minha mente
Espalha ideias e vontades.
Consegue entender o que meu amar sente.
Sabe como ninguém aguçar minha saudade.
Com ele vem só a folha em branco.
Quer sorver minha inspiração.
Sentamos eu e ele em algum banco.
E viajamos na nossa imaginação.
O poeta é meu leal confidente.
Por vezes soluçamos abraçados.
Sabe o que sinto e se cala sabiamente
Sofremos juntos, vivemos entrelaçados.
Na próxima página
Manuseio com o cuidado de quem ama.
Folha por folha. Uma por vez.
A formiguinha do Quintana.
Encontrarei logo ali, talvez.
A próxima página tem um grito.
Um risco. Um rabisco. Gerúndios.
Olhos espiando, café esfriando.
Um poeta aflito gestando.
Tem a ilha querendo sair.
O rio que entra no mar.
A lua começando a surgir.
E um beija-flor no pomar.
Vinícius compondo sonetos.
Olavo ouvindo uma estrela.
Carlos e seus anjos tortos.
Em Pasárgada, amando, Bandeira.
Dias escutando o sabiá.
Drummond consolando José,
Nos versos íntimos Augusto.
Na bola! Adivinha que é?
Romeu acariciando Julieta,
Titanic começando a afundar.
A baderna do boi da cara preta.
E um sofá pra Beethoven sentar.
Mona Lisa sempre sorridente.
Letras de poetas expoentes.
Comédia divina de Dante.
O Quixote Miguel de Cervantes.
Não sei o lado certo onde esta.
Com a mania que até hoje tenho,
De traz pra frente venho
Folhando de lá pra cá.
Beija-me
"Da vez primeira em que me assassinaram
perdi um jeito de sorrir que eu tinha..."
Mario Quintana
Debruço nos joelhos a dor da perda.
Na pedra fria faço orações.
Beijei-te no último adeus.
Chorei a perda
Do colo amigo, do meu abrigo.
Da proteção.
Mãe,
Deus te levou.
Fiquei aqui
Pensando em ti,
Reunindo forças para seguir.
O segundo domingo de maio,
É o mais triste do calendário.
À noite,
Vou adormecer pra
Sonhar com você.
Quem sabe assim,
Encontrarei de novo,
O sentido de viver.
Talvez eu ganhe teu beijo
Como na vida,
Que era inteira
De qualquer maneira,
EU AMO VOCÊ.
Perdeu
A casa caiu!
Era o grito que mais temia ouvir. Contudo, agora era real. Ali estava. Algemado e com o rosto colado ao chão. Perto das humilhações que enfrentaria dali pra frente, capitão Nascimento se tornara humilde e doce em sua imaginação.
Na cela 35 do presídio central viu-se em Dois Rios escrevendo “Memórias de um Cárcere”. Via alguns companheiros tomados por moléstias graves morrendo dolorosamente numa cela nojenta e fedorentamente úmida.
A sorte estava definida. Antes tivesse conseguido se exilar em outro país da América bela e generosa.
Febril e dolorido passava horas detido, literalmente, em pensamentos amenos que lhe aliviavam os dias.
Dos tempos da roça trouxera tão somente cicatrizes de tocos, vara de pesca e uma antiga dívida do financiamento do primeiro e único utensilio agrícola que comprou. Com o nome registrado em órgãos de proteção ao crédito e uma vontade louca de vencer tentou de todas as formas emprego digno.
Com o passar dos dias via estreitar os caminhos que julgava seriam largos naquela cidade. Escola não frequentou. Mal conheceu o MOBRAL cuja única lembrança era da professora linda e delicadamente perfumada.
Por dias a fio teve a mais honesta das vontades de buscar um trabalho condizente com a sua capacidade e formação. Que formação? Dura realidade.
Meses depois a bebedeira passou a ser sua segunda casa e as amizades o mais influente dos mandamentos seguidos.
Pouco tempo e o grupo se formou. Queria ser Al Capone no mundo criminoso.
Haveria de, junto com os companheiros, criar um plano espetacular de ações geniais, lucrativas e bem sucedidas.
Contudo a panela ficou sem tampa.
Agora ali preso e recrutado pelo comando vermelho, garimpava um caminho de volta a liberdade.
Sonhava.
Contudo não foi assim. Condenado cumpriu a pena até ser liberado para a condicional.
Ao sair durante o dia entendeu que as portas que antes estavam fechadas agora passaram, também a serem vigiadas por guardas armados.
A liberdade virou castigo. Nada comparada a um prêmio.
Trêmulo, embriagado assassinou a história.
Hoje não busca mais nada.
A estrada chamada vida se tornou rua sem saída.
Frio
Estas pessoas que vivem
Em locais de extremo frio,
Não são como os tropicais.
Não devem ter alma.
São agasalhos movediços.
Que graça terá ficar nu
Numa terra tão gelada.
Como ficar pelos bares
Até alta madrugada.
Devem ter partes atrofiadas.
Vivem muito fechados.
No máximo, São Joaquim,
E tá bom pra mim.
Como vivem sem sorvetes.
No frio extremo não se consome.
Andam tão vestidos que tanto faz
Se for mulher ou se for homem.
O pequeno criador
Quando a fêmea ficou sozinha devido à morte do macho, passou a esconder-se na mata perto de um pequeno rio de águas mansas.
Todo final de tarde chegava ela.
Com gestos desconfiados comia seu trato e ia lentamente desaparecendo pelo costado da cerca.
O menino que lhe servia comida, muitas vezes a seguia. No entanto, nunca descobrirá onde era seu esconderijo. Tinha medo de adentrar a mata fechada e ser notado por algum animal selvagem, que segundo ouvia, seria perigoso.
De manhã ninguém via a ave. O menino despertava e corria. Percorria o caminho da casa até o rio na esperança de encontrar, ao menos alguns ovos, num ninho, que pensava ele, seria bem ornamentado com folhas e palhas.
Um dia a ave não apareceu para a alimentação habitual. O menino ficou preocupado. Acreditou que ela deveria ter ficado no mato devido ao cansaço que era subir a ladeira que levava à casa da família. Porém, no segundo dia ele pensou que estivesse acontecido algo de grave.
Mal amanheceu o dia se pôs a procurar. Jurou que não voltaria sem descobrir o que estava acontecendo.
Ouviu um barulho. Em seus olhos brilhou a esperança. Parou. Baixou a cabeça e viu por entre a mata pequenas aves. Aproximou-se. Sentiu-se muito feliz. Tentou apanhar uma, mas foi barrado pela mãe ave. Deixou todos ali e saiu em disparada. Entrando em casa abraçou a mãe. Entusiasmado pediu comida. A mãe disse que o café estava servido.
-Não, comida para os patinhos.
Já com o alimento para seus pequenos amiguinhos, sumiu na mata cantando e pulando.
Pura felicidade.
Quando chegou às margens do rio, mal pode ver aquela unida família que descia pelas águas lentas. Chorando largou a comida na água e abanou para os nadadores.
Sorri
Sorri à noite,
Mirando o céu
E uma estrela
Piscou-me.
Será você anjo?
Parece que te vi.
Quando Deus,
Você vai deixar de sumir?
Genial
Genialidade nas linhas que escrevias,
Que se perpetuam por gerações.
Genialidade nos versos que compunha,
Para entalhar nos corações.
Genial para exaltar um povo,
Uma nação, um país.
Genial para buscar o novo,
E uma forma de ser feliz.
Gênio triste... Talvez!
Que também viveu alegrias,
Poeta de enorme altivez.
Genial GONÇALVES DIAS.
Reticências
Um grafema bastava-me.
Pouca coisa eu queria.
Saber que ali eu estava
Enchia-me de alegria.
Uma palavra já seria até demais.
Uma frase eu nem sei se mereceria.
Ser estrofe? Nunca. Jamais.
Muito menos ser a tua poesia.
Uma página eu ganhei.
Antológico você me fez.
Ali para sempre estarei.
Muito mais do que sonhei.
Livro é o que hoje sou.
Capa dura preferida.
Um romance de amor.
Uma história para toda vida.
Falar de você
Falar de você Gonçalves,
Faz pensar no canto do sabiá.
Em estrelas, palmeiras e flores.
Da frustração nos amores.
Do viver lá como cá.
Homenagear você Gonçalves,
Faz pensar no amor que não viveu.
Em todos teus sonhos iludidos
E no crime que não cometeu,
Mesmo quando a amada perdeu.
Saudar você Gonçalves,
Faz lembrar oceano.
Um romântico leito de morte.
Mesmo com seus poucos anos
Selou a tua sorte.
Na presença da morte foste forte,
Um guerreiro lutador
Nacionalista e sonhador
Enalteço com alegria
Magnânimo... GONÇALVES DIAS
Quando eu vivi
Quando eu vivi,
Nunca fui notado.
Nunca estive no centro.
Sempre fui deixado de lado.
Pra sobreviver aprendi.
Perdoei para ser perdoado.
Externei tudo o que senti.
Amei para ser amado.
Erros e acertos equilibrados.
Sucessos e fracassos suplantados.
Matéria só tem valor
Antes de ser sepultado.
Não vem
Chega, desisto de ficar esperando.
Nunca mais voltarei aqui.
Neste tempo que ainda tenho,
Deste lugar me abstenho.
Aqui, um dia,
Prometemos amor eterno,
Faz tempo, eu sei,
Mas isso aqui virou um inferno.
A data eu não lembro.
Acho que era primavera,
De flores cheirosas.
De lindos botões de rosa.
Eu voltei. Você não veio.
Quebrou a promessa ao meio.
Não terei mais devaneios,
Só eu voltei. Você não veio.
Entre as pranchas da pinguela,
A água me vê pelas frestas.
Mães d’água dançam,
Em clima pleno de festa.
Do poente o sol se lasca em sombras,
Meus pés barulham na madeira.
Cresce a vontade voar,
Cair na corredeira.
O que há jundiá?
Não venho te pescar.
Relaxa.
Vamos nadar.
Corações
Dos corações que eu tinha
Quase todos foram embora.
Restou-me apenas este
Que bate no peito agora.
O do amor partiu primeiro.
Depois foi o aventureiro.
O sonhador foi em terceiro.
Por último o bagunceiro.
O que ficou é técnico.
Não conhece emoções
Reto e muito ético.
Apenas cumpre suas obrigações.
Tenho saudades dos que foram.
Eles que me davam alegria.
Todos valiam ouro.
Sinto falta das folias.
Uvas, beijos e chocolates
Sem pensar joguei-me em ti.
Sem licença fiz castelo.
Sem habite-se me instalei.
Sem base me apaixonei.
Sem receio se ausentou.
A construção embargou.
Pediu que eu saísse,
Até a estrutura desabou.
Cabisbaixo, fui andando.
Comigo somente meu corpo.
Nem precisei de mochila.
Na mão só um litro de tequila.
Lento os dias foram passando,
Meu sorriso encurtando.
Nossos caminhos descruzando,
Eu de você sempre lembrando.
Se me vir neste universo
Num improvável desempate,
Estarei compondo versos
De uvas, beijos e chocolates.
