O..."abrir-se da entranha... Maria Zambrano

O ..."abrir-se da entranha coração"
(...)
“Somente aquilo que constitutivamente é fechado pode ser a sede de uma intimidade; aquilo que com suprema nobreza pode abrir-se sem deixar de ser cavidade, interioridade que oferece o que era a sua força e o seu tesouro, sem se converter em superfície. Que, ao oferecer-se, não é para sair de si mesmo, mas para fazer adentrar-se nele o que vagueia fora. Interioridade aberta; passividade activa. Tal parece ser a vida primeira do coração, víscera onde todas as restantes cifram a sua nobreza, como se nela tivessem delegado para executar essa acção suprema, delicada e infinitamente arriscada. Porque neste abrir-se da entranha coração, arrisca-se a vida das restantes que não podem fazê-lo, mas que estão comprometidas por participação. Pouco valor teria essa abertura do coração se ocorresse sem participação das demais entranhas somente passivas, puro trabalho também -. Se tal participação não sucedesse, o coração poderia Ter uma vida independente e solitária, como chega a Ter o pensamento.
(...)
A profundidade impõe tanto e é tão misteriosa porque é o espaço que sentimos criar-se, pela acção de algo que está a ponto de trair o seu ser para oferecê-lo numa entrega suprema, como é toda a entrega daquilo que não se tem primariamente e se adquire para entregá-lo a quem somente assim pode ir a quem o chama. O profundo é uma chamada amorosa. Por isso, toda a gruta atrai.”
(...)