Manifesto: Quero o meu lado mulherzinha... Fernanda Mello

Manifesto: Quero o meu lado mulherzinha de volta
(ou em outras palavras: até que ponto a gente sabe administrar o rebolado?)

Primeiramente devo dizer: a culpa não é de ninguém. Não me atirem pedras nem queimem meus sutiãs, que me são tão raros, caros e meus. Ando pensando muito sobre a questão ying/yang na sociedade e dentro de nós (minha monografia foi sobre a revolução feminina e a repercussão na publicidade atual) e o que eu vejo não são mulheres independentes e felizes com seus novos papéis, nem homens satisfeitos com um ter-que-ser que não combina com seus antigos moldes. O que enxergo são homens e mulheres perdidos e insatisfeitos, loucos por colo e amor, loucos por si só e loucos de saudade. Sim, loucos de saudade. Eu quero ser mulher de novo, estou cansada de virar homem tantas vezes por dia, tendo que resolver a vida e o mundo. Tenho que trabalhar, pagar contas, impostos, saber tudo sobre contabilidade, escrever, recitar Vinicius, ter uma bunda dura, um cabelo macio, quinhentos e cinqüenta e cinco cheiros gostosos pelo corpo, pés e mãos bem-feitos, saber o que está passando no cinema, ler de Sartre a Vogue, ajudar família, amigos, colocar os quadros novos na parede, responder e-mails, saber se o chassi do carro foi adulterado (!?) e estar linda e com a pele fresca quando aquela pessoa que você joga charme há meses te chamar pra sair. Ok, você toma banho em segundos, reclama com sua mãe pelo telefone enquanto decide o que vestir (a eterna dúvida do primeiro encontro) e tenta se focalizar em ser mulher. Apenas mulher. (Mesmo que tenha um bilhete em cima da mesa dizendo para entrar em contato com o contador com a máxima urgência). Máxima urgência? E o interfone toca e você está com duas blusas na mão, nenhum sapato no pé e uma interrogação bem no meio da maquiagem. O espelho não mente: você está ligeiramente linda, confusa e cansada. Mas pega a bolsa e vai... (Afinal, arriscar é viver!). No elevador você pensa, enquanto dá o ar da graça com o eterno blush (amigo de todos os posts e horas): o mundo está invertido ou será que sou eu? E você não encontra respostas mas encontra o cara. Parado. Mudo. Com um olhar bonito e alguma expressão que você não entende. Aí te vem a mesma imagem de minutos atrás: olha o ponto de interrogação bem no meio da cara dele... O cara não sabe o que fazer. Não sabe se abre a porta do carro, se escolhe o restaurante, se te beija, se te come ou manda embrulhar, se leva flores no dia seguinte, se conversa sobre poesia, sobre filhos ou musculação, tudo porque está na dúvida se você vai achar lindo ou vai rir na cara dele. Tudo porque ele está perdido, mas... Caramba! Você também está. Não sabe se ele tem a mente aberta igual aparenta ou se é mais careta que seu pai. E ninguém se percebe. O cara te acha inteligente, gostosa, divertida e acha que você é moderna demais pra gostar de uma mensagem fofa no dia seguinte. Meninos, é mentira. A gente gosta. Tem gente que pode não gostar, mas eu gosto. Vivemos num momento de transição e conflitos, fica difícil entender. Nada mais normal. Eu, por exemplo, trabalho, tenho minha casa, sou forte por acaso mas tenho meu lado mulherzinha que não me deixa. Sou emotiva, sensível, choro à toa, rodo a baiana, mas espero o telefone tocar, tenho meus nhem-nhem-nhens e estou cansada. Cansada de ser racional. Cansada de tomar iniciativa, cansada de ser homem em cima do salto 15. Por isso, em nome do meu equilíbrio, da falsa modernidade e dessa bagunça que virou um simples abrir ou fechar de portas, eu me atrevo a dizer: toda mulher tem seu lado mulherzinha. Rapazes, sejam fortes e persistentes! Nós somos complicadas mas contamos com vocês!

Fernanda Mello

Nota: Texto publicado por Fernanda Mello no seu site oficial a 26 de julho de 2006. Atribuído, por vezes de forma errônea a Martha Medeiros.