ONDE A LUZ SE INFILTRA. Autor: Marcelo... Marcelo Caetano Monteiro
ONDE A LUZ SE INFILTRA.
Autor: Marcelo Caetano Monteiro.
“É principalmente em tuas mais profundas cicatrizes que a luz também entra.”
A afirmação não exalta a dor como virtude nem sacraliza o sofrimento como fim em si mesmo. Ela reconhece um princípio antigo da tradição moral e espiritual segundo o qual a fratura revela a verdade do ser. As cicatrizes não são apenas marcas do que feriu mas sinais do que resistiu. Nelas a consciência aprende a depurar-se, a soberba cede lugar à lucidez e o orgulho silencia diante do limite reconhecido. O que foi rompido abre frestas, e toda fresta é uma possibilidade de discernimento, pois somente o que foi atravessado pela experiência conhece o peso do real.
A luz não entra pela superfície intacta, lisa e protegida, mas pela matéria que já conheceu a noite e sobreviveu a ela. Há aí uma pedagogia severa e antiga: o humano cresce quando aceita ver-se sem ornamentos, quando consente em olhar suas falhas sem cinismo e suas quedas sem desespero. A cicatriz não é a negação da beleza; é a sua maturação ética. Onde houve rasgo nasce responsabilidade. Onde houve dor desperta-se a vigilância interior.
Assim, a luz que entra não ilumina para consolar, mas para ordenar. Ela não promete repouso fácil, mas clareza. E nessa clareza o espírito aprende que a verdadeira elevação não se dá pela ausência de feridas, mas pela dignidade com que se transforma o que sangrou em fonte de consciência, pois é nesse ponto exato que a alma, depurada, começa a erguer-se com firmeza e sentido.
