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O Lobisomem do leprosário


A seguir, vou te contar mais uma daquelas histórias de cair os butiás do bolso. Pensa numa resenha cabulosa… Está preparado? Então, pega tua Ritalina, cuia, bomba e erva, e te aprochegue pra nossa roda de chimarrão. Pois, a partir de agora, você vai ficar hipnotizado com cada história mais macanuda que a outra, narradas em primeira mão, por um Uber Neurodivergente.
Vamos lá! Era uma vez… Era uma vez em Viamão. Enquanto me dirigia por uma longa e sinuosa lomba esburacada, para buscar um passageiro em um sítio, que ficava em um reino tão, tão distante, pensava com meus botões nas histórias que ouço diariamente, dirigindo por aplicativos e imaginando que "pérola" viria dos lábios do próximo passageiro.
A esta altura do campeonato, eu pensava que havia ouvido de tudo, que já tinha um portfólio sólido de histórias dignas de fazer parte de um livro que daria inveja até no Pinóquio, Tio Chico e MC Guina.
No entanto, o que eu estava prestes a ouvir, seria diferente de tudo o que tinha escutado, transitando pelas pavimentadas e bem planejadas ruas de nossas cidades.
Naquela noite de sexta-feira, ao incentivar o passageiro a me contar uma história bagual, quase me arrependi. Pois, o quadro mental da mesma, ficou flutuando como uma "persona non grata" em minha mente nada ortodoxa.
Sem mais delongas, vou tentar te contar de um modo bem tranquilo, para que você não tenha pesadelos a noite, sonhando com "a coisa" que aquele menino viu no leprosário.
-Você parece ser um homem de mente aberta. Por isso, vou te contar um segredo, uma experiência que passei há mais de trinta anos na praia de Itapuã. Inclusive, você é a primeira pessoa a quem "abro o coração" e conto o que presenciei em um leprosário, nos idos dos anos 80.
Nesse momento, ao ouvir meu interlocutor, eu estava mais empolgado do que o Chaves ao ganhar um sanduíche de presunto. Inclusive, quase caímos em uma cratera, coisa nada comum em nossas maravilhosas estradas. Sem ressentimentos, vamos à história.
Naquela noite de lua cheia, Carlos começou a tirar do arco da velha, uma daquelas histórias que te fazem lembrar da antológica frase atribuída a Shakespeare, a qual, diga-se de passagem, está na epígrafe desta perene obra literária.
Continuando, ele contou-me que, durante sua infância, foi algumas vezes visitar sua avó, a qual, devido ao fato de ser portadora de hanseníase, residia no Hospital leprosário de Itapuã.
Ocorre que, em uma de suas idas ao hospital, descobriu que sua avó tinha arrumado um namorado, um sujeito que, segundo ele, era muito estranho. Inclusive, na porta de seu quarto, tinha um pentagrama incrustado.
Abrindo um parêntese, observe que nunca é tarde para o amor. Não esqueça que, sempre há um chinelo velho, disponível para um pé torto. Isso faz sentido para você? Digo isto, pelo fato de, mesmo a vovozinha já estar com seus mais de setenta, com lepra, internada em um hospital por tempo indeterminado, praticamente com o pé na cova, ainda assim, conseguiu encontrar alguém para viver uma história de amor. Isso é lindo! Se eu pudesse, agora mesmo, colocaria a música tema do filme Titanic para te ajudar a imaginar a cena dos dois pombinhos namorando.
Essa senhora, só queria curtir o pouco tempo que ainda lhe restava no grande palco da existência, como bem diz Augusto Cury.
A filosofia da velhinha era simples e pragmática: Lavou, tá nova! Em uma linguagem atual, a velhinha era braba. Se ela ainda estivesse entre nós, diria: Vamo dá-lhe! Dane-se! Já estou quase desencarnando, mesmo. Sendo assim, vou derreter e esfarelar o salgado. Neste caso: a salgada. Sacanagem falar dos mortos, principalmente de uma senhora tão generosa. Bem, pelo menos, eles não nos processam por levarmos alegria às pessoas através do humor, nem nos acusam de sermos os protagonistas de piadas jocosas.
Sem mais digressões, vamos focar no cerne da história e deixar dona Clotilde descansar em paz, ou não…
Nesse momento, passamos por um posto de gasolina e Carlos me pediu para aguardar cinco minutos até ele comprar uma carteira de cigarro. Mano, não é todo dia que ocorre do passageiro, além de te contar uma história inesquecível, ainda te pagar um café. Sim, senhoras e senhores, ele comprou um café para mim, e, enquanto fumava, eu tomava minha água mineral, porque a bendita da máquina enguiçou, não quis me entregar o líquido precioso de todo bom motorista e tive que fazer um brique com a moça do caixa.
Para fechar todas, o app, abandonado, sozinho, dentro do carro, me perguntava: Está tudo bem com você? Você está parado há tanto tempo, que estou preocupado! Chamo a polícia ou o IGP?
Não é preciso dizer que só visualizei a mensagem um ano depois, após meu confidente fumar e exaurir a história com especificidade, em meio a névoas de nicotina. Tô nem aí! Qual o jornalista que vai brigar com a fonte, ao receber um "furo" e tanto? Por mim, ele podia fumar até Chanceler que eu esperaria de boa, desde que, me contasse uma história que valesse a pena, que fosse digna de tornar-se perene.
Agora vai… Não te revolta comigo! Já disse que a culpa é do Machado. Uma vez que descobri a metalinguagem, não consigo parar de usar a danada. Agora foca no essencial, Ben Salomau e deixa de ser um Rolando Lero.
Assim, voltamos ao hospital e vamos acompanhar o menino Carlinhos passar por um trauma jamais visto.
Entre uma e outra tragada, como Arnold Schwarzenegger com seus charutos, Carlos lavou a alma.
Ele me contou que, em uma discussão entre sua mãe e o senhor estranho que pegava sua avó, o menino foi tentar convencer sua progenitora a voltar para casa, pois, morria de medo do homem, não só pelo pentagrama na velha porta marrom. Mas, principalmente, porque os olhos do ancião tinham um brilho diferente e assustador.
Ocorre que, ao caminhar pelo estreito corredor de parquet, rodeado em ambos os lados por quadros com as fotos dos gestores que por ali passaram, todos mortos, diga-se de passagem, ouviu sons de passos vindo em sua direção.
Naquele momento em que, segundos parecem durar uma eternidade, nosso protagonista vê uma sombra gigantesca incidir sobre si, projetando a imagem de um híbrido muito próximo ao que, nos tradicionais contos, é apresentado como lobisomem.
Devagar, bem devagar, o menino correu os olhos de baixo para cima e o que viu, lhe encheu ainda mais de terror. Ele contou-me que, os pés da criatura pareciam patas de vaca. Suas pernas peludas e musculosas lhe instigaram uma indescritível sensação de incapacidade de fugir de sua presença. Da cintura pra cima, ele era uma mistura de homem, cachorro e porco. E o que dizer da cabeça do monstro? Segundo Carlos, era uma aberração, tão diferente e hibridizada, que fica bem difícil descrever.
Neste momento que mais pareceu uma eternidade, "o ser" fitou Carlos longamente, com seus olhos vermelhos flamejantes, dirigindo um olhar gélido, cruzando com o olhar de uma indefesa criança de apenas doze anos. Sabe aquele olhar de reprovação, ou melhor: Um olhar de Coach, te dizendo que tu não passa de um bosta? Isso mesmo! Um abraço, Pablo! Toma o que te mandaram!
Como se não bastasse, não contente em intimidar pelo olhar, bafejou fortemente pelas ventas peludas sobre o peito do pobre infante, quase derrubando-o com o impacto e fazendo o coitado do guri ter um prolapso retal.
Depois de deixar nosso protagonista todo borrado, a aberração passou por ele, e saiu marchando para o vasto campo de artemisia, enquanto os raios luminosos do disco prateado iluminavam o complexo, deixando nosso menino catatônico e bloqueado, sem conseguir falar sobre isso com ninguém por longos anos.
Até que, em uma sexta-feira treze, noite de lua cheia, ao entrar em um HB20 preto e conhecer um Uber que não estava ali para julgar o mérito de sua experiência, abriu o coração e contou-me um inesquecível relato sobre nada mais, nada menos que um baita Lobisomem e o enorme assédio moral por ele imposto sobre um indefeso guri de apartamento, no leprosário de Itapuã.