Reflexão inspirada na musica Fora de... Yuzo Canguçu

Reflexão inspirada na musica Fora de Tom de Yago Oproprio

__________________________

Há dias em que a vida inteira parece desafinada...



Em que cada passo soa errado, cada escolha pesa mais do que deveria, e cada sentimento chega atrasado — ou cedo demais. A gente respira, mas não encaixa. Vive, mas não acompanha. É como estar sempre fora do tom de uma música que todos, menos nós, parecem conhecer de cor.


Esse som canta esse lugar com uma honestidade que dói: aquele ponto onde o coração continua tentando, mesmo quando já não sabe muito bem por quê. Não é fraqueza — é humanidade. É esse esforço silencioso, quase teimoso, de continuar existindo apesar da angústia, que Camus reconheceria como o cerne do Absurdo.


Porque o mundo não explica nada.
O mundo não traduz nada.
O mundo não afina por nós.


E, ainda assim, continuamos tentando compor algum tipo de melodia, mesmo que improvisada, mesmo que trêmula.


A lucidez é uma lâmina fina.
Ela corta quando percebemos que nada do que buscamos garante paz.
Que amar não garante ser amado.
Que tentar não garante ser visto.
Que dizer “estou aqui” não garante que alguém responda.


É uma compreensão cruel: o universo não devolve na mesma intensidade que sentimos.
Esse é o Absurdo.
E é exatamente aí que algo profundamente humano acontece.


“Fora do Tom” fala dessa luta: tentar se ajustar sem perder a própria verdade, reparar as próprias rachaduras enquanto ainda se está quebrado, caminhar sabendo que a estrada não promete nada. E, no entanto, existe uma força estranha nisso: um tipo de resistência silenciosa que Camus chamaria de revolta.


A revolta não é grito — é persistência.
É acordar mesmo cansado.
É respirar mesmo doendo.
É segurar o coração com as duas mãos, mesmo que ele pulse torto, e dizer:
“eu ainda estou aqui.”


Ser “fora do tom” não é falhar — é existir com honestidade num mundo que insiste em ignorar nossas melodias internas.
É continuar tocando, mesmo quando ninguém escuta.
É não desistir da própria frequência, mesmo quando ela não combina com o que esperam de nós.


No final, talvez a afinação não esteja no mundo — esteja dentro.
E talvez viver seja isso:
uma tentativa imperfeita,
uma busca sem garantias,
uma música que a gente aprende enquanto toca.


Camus diria que a beleza está justamente aí:
no fato de que a vida não faz sentido,
mas a gente insiste em cantar.


E, às vezes,
é nesse descompasso
que finalmente encontramos
nossa própria voz.

Y.C