“Num se apaixone por mim, visse” Num... Nilton H. F. Neves

“Num se apaixone por mim, visse”


Num se apaixone por mim, visse,
me trate que nem ventania,
daquelas que passam ligeiro,
derrubam flor e poesia.


Sou tropeço de estrada seca,
sou poeira, sou catinga,
sou promessa que o tempo leva,
sou tristeza que nem se finda.


Sou canto de galo cansado,
sou vaqueiro sem curral,
sou alma de chão rachado,
sou sombra de um bem e um mal.


Num me olhe com doçura,
que eu só trago amargura,
sou ferida aberta no sereno,
sou abraço que vira veneno.


Tu tem amor só pra tu,
guarda ele, num joga no breu,
meu peito é cacimba vazia,
meu riso é só canga e aridez.


Se for pra me ver, veja de longe,
feito quem vê o sertão à tarde,
sou cachorro sem dono na rua,
sou saudade que nunca arde.


E se eu sumir na poeira,
num chore, nem venha atrás,
deixa eu ir feito boi na invernada,
sem rumo, mas em paz.


Me trate como fim de feira,
como resto de forró,
como alguém que já foi embora,
e só deixou o pó.