PROVAVELMENTE NÓS Talvez já tenhamos... Marco A Moreira Cardoso...

PROVAVELMENTE NÓS

Talvez já tenhamos querido demais.
Talvez tenhamos acreditado que o mundo ia se curvar aos nossos planos, e que bastava querer para merecer.
Corremos, nos perdemos, acumulamos, e quando finalmente paramos, descobrimos que o que pesava não era o que faltava, era o que sobrou.
Nada brilha tanto quanto a paz de poder respirar sem culpa, o resto, com o tempo, enferruja.

A vida nunca pediu que fôssemos perfeitos, ela só queria que estivéssemos presentes.
Mas a gente inventa metas, disfarces, pressas.
Esconde o que sente, finge que entende, sorri quando a alma está cansada.
E mesmo assim, a vida insiste, puxa pela mão, devolve o olhar e diz: fica aqui, só por hoje, só por agora.

A gente erra, e como erra.
E dói, dói fundo, dói na carne, dói onde a gente achava que já tinha cicatrizado.
Mas é no erro que o orgulho quebra, e quando o orgulho quebra, entra luz.
O chão é um bom professor, a queda ensina o que o sucesso disfarça, a dor, por mais muda que pareça, ainda fala a língua de Deus.

Nem sempre dá pra achar beleza em tudo.
Tem dia que a vida parece um corredor estreito, sem janelas.
Mas às vezes basta um gesto pequeno, alguém que escuta, um sorriso que atravessa a distância, um copo d’água oferecido sem pressa, e pronto, a luz volta.
Não porque o mundo mudou, mas porque o coração amoleceu um pouco.
A beleza é teimosa, aparece mesmo nos lugares em que a esperança já desistiu.

A vida é um caderno meio amassado, cheio de páginas rasuradas, frases inacabadas e marcas de café.
A gente tenta escrever direito, mas o tempo tem o péssimo hábito de virar a página antes da hora.
Mesmo assim, escrevemos.
Erramos as palavras, corrigimos depois e seguimos.
Um dia, talvez, a gente entenda por que certas linhas só fizeram sentido lá no fim.

O que importa mesmo não é o que deixamos no mundo, mas o que deixamos nas pessoas.
Um olhar, um cuidado, um gesto qualquer que acendeu um dia bom na vida de alguém.
O resto se apaga.
A vida não guarda diplomas nem moedas, guarda afetos.
O que nasceu do amor não conhece esquecimento.

Ser simples é o que sobra quando o barulho acaba, quando as exigências diminuem e o peito aprende a respirar em paz.
Ser simples é andar leve, ouvir mais do que falar, parar de querer vencer o tempo.
Não é desistir, é finalmente entender.
Talvez seja isso que a vida esperava da gente desde o começo, que deixássemos de procurar grandeza e voltássemos a ser inteiros.


M.Arawak