Do Reconhecimento e do Esquecimento. A... André toledo

Do Reconhecimento e do Esquecimento.


A graça, amado, é como o lírio que se ergue no vale ao primeiro raio:
Todos apontam para sua brancura,
Inclinam-se ante seu perfume,
E nomeiam sua beleza em todas as línguas.
Ela é a água clara na taça do sedento,
O abraço que aquece os ossos do inverno,
A palavra que germina no deserto da alma.
Reconheceis a graça porque ela é espelho...
Reflete o que há de divino em vós.


Mas o mal, filho da terra, não se apresenta com trombetas.
Ele é a raiz oculta que mina a árvore frondosa,
A sombra que se confunde com a penumbra da noite,
O veneno que escorre no mel do descuido.
Não o vedes porque não quereis ver?
Ou porque ele veste as roupas do hábito,
E caminha nas ruas com o passo do comum?


Dizei-me: como podeis reconhecer o fogo se negais a fumaça?
Como podeis nomear a serpente se venerais sua pele?
O mal se desconhece não por ausência de olhos,
Mas por ausência de coragem.
Os homens fecham as janelas da alma
E depois estranham a escuridão.


A graça é reconhecida porque é dádiva que humilha o orgulho;
O mal é ignorado porque é espinho que adorna a coroa do poder.
Um exige reverência,
O outro — cumplicidade.


Oh, buscador da verdade!
Não basta celebrar a luz no alto da montanha;
É preciso descer ao vale e enfrentar a névoa que corrói as raízes.
Pois só quando nomeais a sombra dentro de vós,
A graça deixará de ser visita
E se tornará morada.