Senhor poeta li em um noticiário que o... Wilton Lazarotto

Senhor poeta li em um noticiário que o senhor destrói suas poesias assim que as concluí, pois as considera ruins e em torno de cada 20, uma o senhor mantém a salvo. E, por razão disso, formulo está carta em um pedido, um urgente pedido.
Antes de mais nada, devo dizer ao senhor que não sou, jamais, contra a destruição de suas poesias ou qualquer coisa que escreva. Afinal, é uma produção sua, eu sou apenas um admirador de vossas palavras.
Mas, por favor, reserve para mim uma poesia, uma única poesia que o senhor iria destruir. Que trate de amor ou algo lindo que conquistaria o coração de uma mulher, por favor, reserve uma para esse homem que vos escreve. Este pedido é motivado por duas razões: em primeiro lugar, sou um grande admirador da sua forma de escrever, mesmo não sabendo ler, pois minha irmã lê para mim. Aliás, ela esteve lendo outros escritores e são muito ruins, creio que suas poesias mesmo não passando pelo seu aval serão muito melhores que as deles.
Em segundo lugar, e isto é o mais importante, sou pobre, pobre e ignorante. Quem está escrevendo esta carta é minha irmã. Ela inclusive vai colocar a carta no correio, pois não teria dinheiro para o selo. Ou seria para o selo ou para o cartão, como comprei o cartão para presentear alguém muito especial não poderia mandar a carta, sou pobre, tão pobre quanto um rato. O senhor não tem ideia como seria importante receber uma poesia sua, poderia mandar a pior de todas, ficaria imensamente feliz e a admiração por você não minuirá, jamais.
É claro que diria que foi um presente, naturalmente, pois nem escrever sei. Preciso de sua poesia para escrever no cartão, é um cartão simples de dois lados que se dobram ao meio, tem linhas no seu interior em azul e seu entorno é vermelho com um coração ao meio. Vou destiná-lo a “Maria” meu grande amor, a mulher mais linda, que eu detenho um imenso apreso e quero surpreendê-la. Aqui no bairro onde morro nenhuma mulher recebeu uma poesia, seria o primeiro, assim teria grandes chances de conquistá-la.
Hoje já tenho trinta e cinco anos, falo isso quase chorando, pois pela primeira vez aprendi o que é amar. Vivi sempre sozinho, coração de pedra, diziam meus amigos. Queria poder amar como vocês poetas, mas nunca soube, pois minha vida não é nada fácil. Morro em um barraco, não o chamo de casa, pois não o é, no entanto, o faço ser por não ter outra opção. Um homem assim nem deveria amar, nada a ela serei capaz de dar. Era assim que eu pensava, mas mudei meu pensar, claro que eu posso dar muitas coisas a ela como: um amor, beijos e tocar seu rosto toda manhã dizendo que eu amo ela.
Mande-me, por favor, uma poesia. Pode ser grande, embora meu conhecimento seja pequeno e limitado, mas não desagradaria nada escrever algo grande no cartão. Dá à pessoa uma certa importância. E depois, quanto maior o texto, mais visível ele se torna. É, como diz minha irmã aqui, hoje visibilidade é tudo na vida e com sua poesia, finalmente, teria visibilidade com Maria.